Folha de S. Paulo
Chineses devem crescer menos e americanos
precisam frear, o que vai afetar o Brasil
A economia americana encolheu no primeiro
trimestre de 2022. Mas continua superaquecida, com investimento produtivo e
consumo privado em alta forte.
Como é possível? Mais sobre isso mais
adiante. Mais relevante é saber se será possível conter a inflação
nos EUA sem uma desaceleração forte, que pode dar
até em recessão a partir de 2023.
A economia chinesa cresceu mais do que o
previsto no primeiro trimestre de 2022. Mas março e abril foram meses mais
fracos. Há indícios de que o PIB chinês vai crescer menos do que se imaginava
neste ano.
PIB é assunto tedioso, sim. Mas o que
acontece nos EUA e na China terá influência
sobre o ritmo da economia e dos preços por aqui também, para começo de
conversa.
Em um relatório do final da semana passada,
os economistas do bancão Goldman Sachs discutiram o risco de o controle da
inflação levar os EUA à recessão.
Quanto mais as expectativas de inflação ficarem descontroladas, maior o risco. Se a falta global de materiais para a indústria e a guerra continuarem a provocar aumentos de preços, maior o risco de "desancoragem" das expectativas.
Quanto mais continuar o aperto relativo do
mercado de trabalho (a falta de trabalhadores dispostos a trabalhar por certo
salário), maior o risco de "espiral salário-preços". Ou seja, mais
inflação leva a mais aumentos salariais além dos ganhos de produtividade, o que
provoca nova rodada de reajustes de preços etc.
É incerto se tais pressões, expectativas e
salários, vão continuar, por quanto tempo e em que tamanho, diz o pessoal do
Goldman Sachs. Mesmo com projeções de que a carestia causada por peste e guerra
tende a diminuir, seria preciso também diminuir a pressão altista vinda dos
salários. Para tanto, seria necessária uma desaceleração do crescimento do PIB
para algo entre 1% e 1,5% ao ano. Nos 16 anos de 2004 a 2019 (com a Grande
Recessão pelo meio), a economia dos EUA cresceu 1,2% ao ano.
Não é, pois, um desastre, mas o ritmo
cairia muito em relação a 2021 e a menos da metade do crescimento previsto para
2022 pelo FMI (3%). De resto, nem sempre é possível reduzir o ritmo de modo
controlado.
Uma queda coordenada, comedida e controlada
de PIB e inflação, mais a desaceleração chinesa, derrubaria crescimento e
também preços pelo mundo.
Por ora, é o cenário mais tranquilo para a
saída dessas crises agudas, peste e guerra. Muito melhor do que uma recessão
ou, mais ainda, do que uma crise também financeira causada por um choque de
juros nos EUA. Mas o Brasil teria mais uma dificuldade para sair da
depressão.
O PIB americano encolheu 0,4% em relação ao
trimestre final de 2021. Além de inesperado, foi um número definido por alguns
acontecimentos inusuais.
Um modo de calcular o PIB é considerar o
que se passa com grandes grupos de despesa: consumo privado, consumo do
governo, investimento em aumento de capacidade produtiva (casas, máquinas
etc.), e a diferença entre importações e exportações, afora um ajuste de
estoques (o que foi produzido e "guardado").
O PIB americano caiu porque as importações
(compras de bens e serviços de outros países) foram muito maiores do que as
exportações. Pode ser sinal de economia superaquecida ou com dificuldade
temporária de abastecimento no exterior (por causa dos problemas causados pela
epidemia). Pelo que dizem analistas americanos, calhou também de muita
importação atrasada chegar no primeiro trimestre. As empresas também viram
esvaziar seus estoques (talvez também por falta de insumos).
Ainda não é sinal de recessão, nem de
longe. Mas desaceleração haverá. Resta saber se a mudança de ritmo vai dar em
tombo feio ou não.
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