O Globo
Próximas décadas revelarão o desconhecido
A partir do século XVI, o termo “terra
incógnita” (terra desconhecida) passa a indicar nos mapas as regiões ainda não
mapeadas ou documentadas. No século XIX, com os continentes explorados, o termo
desaparece da cartografia. Hoje, reaparece quando cientistas querem abordar
assuntos ou campos de pesquisa ainda inexplorados. Inúmeras pesquisas indicam
que as próximas décadas serão marcadas pela entrada em novas terras
desconhecidas, dada a convergência de profundas transformações sociais,
econômicas, políticas e ambientais.
Conduzir o Brasil por tais transformações,
reduzindo impactos e aproveitando oportunidades, só será viável com a retomada
de planejamento e investimentos consequentes em ciência e educação. A ciência
nos auxilia a compreender o mundo e suas dinâmicas; nos fornece esclarecimentos
sobre a natureza, a humanidade, a sociedade, nossas construções físicas e de
pensamento.
Os avanços científicos, no entanto, emergem de bases de conhecimento fundamental que resultam da contribuição de muitos ao longo de anos. Tais bases só podem ser construídas a partir de esforços continuados na preparação de profissionais capazes de se apoiar no conhecimento acumulado para ver mais longe. Sobre os ombros de gigantes, como na frase atribuída a Isaac Newton.
Aqui, ciência e educação, dois setores tão
fragilizados nos últimos anos, se mostram intrinsecamente ligados. Crianças e
jovens costumam ver a ciência como inspiradora e interessante; ela fomenta
fascinação e curiosidade, que devem ser estimuladas nas escolas. Compartilhar
com os jovens conhecimentos, habilidades e ferramentas para pensar e avaliar
criticamente o mundo é parte do desenvolvimento de competências para a vida, a
cidadania responsável e o cuidado com nossos direitos.
No Brasil, a ciência está fortemente
ancorada na atuação das universidades públicas, que concentram boa parte de
nossa produção científica e formam novos professores. As universidades são
motores de transformação da sociedade e ajudam a moldar novos caminhos ao
educar cidadãos e ao entregar conhecimento e inovação à sociedade. Permitir e
estimular que elas sigam exercendo seu relevante papel social deve ser parte
integrante da construção da soberania do país e das estratégias para navegar as
“terras desconhecidas” que nos esperam.
Ao construir esse futuro, devemos
considerar o alerta do físico Carl Sagan:
— A história está repleta de pessoas que,
como resultado do medo, ou por ignorância ou por cobiça de poder, destruíram
conhecimentos de imensurável valor que, em verdade, pertenciam a todos nós. Não
devemos deixar isso acontecer de novo.
Não há mais espaço ou tempo para entregar
ao amadorismo e à negligência as agendas prioritárias para ciência e educação.
*Mercedes Bustamante é professora da UnB, membro da Coalizão Ciência e Sociedade e escreveu este texto como parte da iniciativa #ciêncianaseleições, do Instituto Serrapilheira
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