Folha de S. Paulo
Política monetária ainda freará a atividade
econômica por alguns meses
O Banco Central iniciou
na quarta-feira (2) um ciclo de redução da taxa de juros.
O corte da Selic era
totalmente esperado. Havia dúvida quanto à magnitude. Poderia ser de 0,25 ponto
percentual (pp) ou de 0,5 pp. O corte foi
de 0,5 pp, levando a Selic a 13,25%.
O placar da votação do Comitê de Política
Monetária (Copom)
foi de 5 a 4. O presidente Roberto
Campos Neto deu o voto de minerva se alinhando com os dois
novos diretores indicados por Lula e
na direção contrária à Diretoria de Política Econômica e à Diretoria de
Assuntos Internacionais.
A informação mais importante do comunicado divulgado logo após a reunião foi que "em se confirmando o cenário esperado, os membros do Comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário".
Apesar da divisão do Comitê quanto ao passo
inicial, todos concordam que, se nada de diferente ocorrer, haverá até o final
do ano mais três quedas de 0,5 pp, com a Selic fechando 2023 a 11,75%. Não
muito diferente do que o apontado pelo Focus (expectativas de mercado) da
semana passada, que marcava 12%. A simulação do Copom com esses parâmetros
gera inflação a
4,9% em 2023, 3,4% em 2024, e 3,0% para 2025. A meta é de 3% ao ano. Logo, a
inflação, segundo a simulação do BC, fechará 2024 0,4 pp acima da meta, e na
meta em 2025.
Rigorosamente, o Copom deveria esperar uma
reunião a mais para iniciar o ciclo de queda de juros. O juro seria um pouco
mais elevado do que as pessoas esperariam, haveria uma revisão de toda a
trajetória dos juros para 2024, o que seria suficiente para que a simulação do
Copom para 2024 na próxima reunião se aproximasse mais de 3%.
No entanto, o Copom resolveu empregar o
objetivo subsidiário de suavização do ciclo econômico, e iniciar o ciclo de
queda agora. Como explicou no comunicado, "sem prejuízo de seu objetivo
fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica
suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno
emprego".
Considero que o grande risco é o fato de o
ciclo de queda da taxa de juros ter começado sem que o núcleo de serviços,
conhecido por serviços subjacentes, tenha iniciado uma trajetória consistente
de queda. Em 12 meses, o indicador acumula 6% e, no último trimestre, também
rodou a 6% (na taxa anualizada).
É normal serviços girarem um pouco acima do
IPCA, mas 6% é um pouco alto demais para uma meta de 3%; 4,5% seria compatível
com a meta. A preocupação deve-se ao fato de o mercado de trabalho estar bem
apertado. Segundo a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
Contínua), o desemprego no
segundo trimestre do ano fechou a 7,9%, um nível muito baixo. Os serviços
subjacentes acompanham de perto o ciclo econômico.
De qualquer forma, e exatamente pelos
serviços subjacentes ainda não terem iniciado uma trajetória consistente de
queda, o Copom reforça no comunicado "a necessidade de perseverar com uma
política monetária contracionista até que se consolide não apenas o processo de
desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas
metas". Ou seja, a política monetária ainda freará a atividade econômica
por alguns meses.
Penso que a decisão foi normal e o que
preocupa mesmo é o retorno da prática de controle do preço da gasolina
pela Petrobras.
Cheiro de nova matriz econômica no ar. Mas isso já é tema para outra coluna
*Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.
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