domingo, 6 de agosto de 2023

Elio Gaspari - Tarcísio no estilo de Witzel

O Globo

Truculência policial é coisa velha, mas pedagógica é novidade

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, despontou como uma alternativa política, dando um toque de civilização à polaridade que envenena a vida nacional. Em poucos dias, com guinadas surpreendentes, ele entrou num caminho que se parece com o rumo paleolítico do ex-governador do Rio, Wilson Witzel.

A Polícia Militar barbarizou no Guarujá e, numa medida da confusão, na segunda-feira, enquanto a Ouvidoria falava em dez mortos, o governador falava em oito, defendendo a operação. Passados os dias, a conta chegou a 16, com as habituais denúncias de execuções.

A truculência policial é coisa velha. Tarcísio já foi contra as câmeras individuais para os PMs, mudou de opinião, mas não consegue que elas funcionem em operações como a do Guarujá.

Enquanto o governo de São Paulo oferecia uma chacina em nome da segurança pública, o secretário de Educação, Renato Feder, trouxe uma novidade, a truculência pedagógica, na embalagem de luxo das ferramentas digitais.

Com uma canetada, o governo de São Paulo recusou 10 milhões de volumes impressos que receberia do Ministério da Educação por intermédio do Programa Nacional do Livro Didático, o PNLD. Feder anuncia que esse acessório secular será substituído por ferramentas digitais.

Em tese, é o progresso que chega. Na prática, virá a balbúrdia. O governo federal é o maior comprador de livros do Brasil. O PNLD distribui mais de 200 milhões de exemplares, num negócio perto de R$ 2 bilhões.

Livros impressos são um tipo de negócio. Livros digitais têm custos e preços diversos. Pelo mundo afora, as editoras não gostam dos digitais, que são mais baratos e muito mais versáteis, sobretudo para estudantes. Assim, Feder está com um pé no progresso.

Eis que o doutor rebarba os livros do PNLD e diz que “a secretaria avaliou que perderam conteúdo, profundidade, estão superficiais.” Cadê a avaliação? Quem a assina? Com que justificativas? Truculência.

Nenhum país foi para a pedagogia digital com uma canetada. Mesmo a Estônia, exemplo mundial de modernidade nesse campo, avançou aos poucos, com muita conversa. A Estônia tem cerca de 170 mil estudantes. São Paulo tem 3,5 milhões.

Com a internet e livros didáticos eletrônicos, o mundo da educação será outro. Mas, fica a pergunta: e a criança que não tem acesso à rede ou a um computador na escola e/ou em casa? Segundo Feder, as escolas podem imprimir o material para quem não tiver equipamentos em casa. Conta outra, doutor. Onde estão as impressoras de qualidade e a disponibilidade dos equipamentos?

Se o governo pensa num investimento para suprir essa lacuna, chega-se a um absurdo. Dispensam-se livros impressos para gastar dinheiro com equipamentos eletrônicos. Fecha-se um cartório e abre-se outro. Feder promete distribuir 20 mil celulares que foram apreendidos pela Receita Federal. A ver, com a palavra a Receita, que os leiloava.

Já houve um tempo em que o PNLD abrigava espertalhões. Mais recentemente, viu-se que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, o FNDE, tentou fazer uma compra de 30 mil laptops para uma escola de 255 alunos. O poeta Cacaso já ensinou que no Brasil fica moderno o milagre, a água já não vira vinho, vira direto vinagre.

Três tesouros em bibliotecas eletrônicas

Os livros eletrônicos são mais baratos, não ocupam espaço, têm mecanismos de busca e permitem o armazenamento de anotações. Ficando na História do Brasil, aqui vão três exemplos de tesouros grátis, à disposição de todos.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro digitalizou 437 livros da memorável coleção Brasiliana, do século passado. Ali há de tudo, da “História Militar do Brasil”, do fascista Gustavo Barroso, aos três volumes da “História de D. Pedro II”, de Heitor Lyra. Isso para não se falar das obras do historiador inglês Charles Boxer sobre a ocupação holandesa do século XVII, à “A Idade de Ouro do Brasil”, do XVIII.

A Biblioteca Digital do Senado oferece mais de cem livros, desde clássicos como as biografias dos “Fundadores do Império”, de Otávio Tarquínio de Souza, a trabalhos recentes que adquiriram atualidade, como “Amapá, a Terra onde o Brasil Começa”, de José Sarney e Pedro Costa. Aquele pedaço de Pindorama foi mantido pelo povo da terra, apesar das pressões francesas.

A Fundação Alexandre de Gusmão, do Itamaraty, oferece mais de uma centena de livros. Além das “Efemérides Brasileiras”, do Barão do Rio Branco, lá está “Navegantes, Bandeirantes e Diplomatas - Um estudo sobre a Formação das Fronteiras do Brasil”, do embaixador Synesio Sampaio Goes Filho . Ali aprende-se como Portugal ficou com a Amazônia.

(O Barão do Rio Branco, sem internet, catalogava o que aconteceu por aqui a cada dia, desde 1500.)

Trapaça da vida

Valter Delgatti Netto, o hacker que detonou a turma da Lava-Jato de Curitiba, está preso porque se meteu em outras malfeitorias.

Ao mesmo tempo, os vistosos procuradores da Lava-Jato precisam de bons advogados, pelo desembaraço com que se moviam durante seus meses de fama.

Americanas com mais brigas

Azedou o clima entre os ex-diretores da rede varejista Americanas.

Pudera, acumularam bônus milionários, produziram um buraco de R$ 50 bilhões, enfrentam uma CPI, uma investigação da Comissão de Valores Mobiliários e vários inquéritos criminais.

Foram solidários no sucesso, mas a ruína destruiu o encanto.

Boa notícia

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, planeja isentar os imóveis da Cracolândia do pagamento de IPTU.

A ideia é boa e devia ser seguida por todos os prefeitos do país que cobram esse imposto a donos de imóveis que foram degradados por sucessivas administrações que perderam a autoridade em áreas de suas cidades.

O dinheiro do agro

Houve um tempo em que empresários rurais pediam conselhos para a compra de apartamentos em São Paulo.

Há poucos anos a pergunta tornou-se outra:

“Você não arruma um edifício para eu comprar?”

Recordar é viver

Com a decisão do Supremo Tribunal Federal esfarelando a teoria da legítima defesa da honra para safar assassinos, vale lembrar o julgamento que celebrizou essa maluquice.

Na noite de 31 de março de 1964, o advogado Pedro Aleixo usou-a e conseguiu a absolvição das irmãs Ethel e Edina Poni. Dois anos antes, Ethel havia derrubado Lourdes Calmon, que vivia com o ex-marido de Edina. Ela, campeã de tiro, matou Lourdes com dois tiros na cabeça.

O destino mandou a conta a Pedro Aleixo cinco anos depois. Ele era o vice-presidente da República, o marechal Costa e Silva estava incapacitado por uma isquemia cerebral, e os três ministros militares (mais alguns generais palacianos) impediram que assumisse. Ele, com sua honra, resignou-se em silêncio.

4 comentários:

hisayo nanami disse...

RECADO PARA TARCÍSIO:
VAI DAR PAVÃO, GOVERNADOR!

SERÃO RESPONSABILIZADOS, GOVERNADOR E SECRETÁRIO BOLSOZO MATADORES, POR 19, E NÃO POR 16 MORTOS NO GUARUJÁ; DEMORA NADA NÃO...

sim disse...


os vistosos procuradores da Lava-Jato precisam de bons advogados, pelo desembaraço com que se moviam durante seus meses de fama.
Palavras do Professor Gaspari, uma inteligencia privilegiada que teima em ter bandidos de estimação.
Vida que segue.

ADEMAR AMANCIO disse...

Gaspari não 'estima' ninguém,critica todo mundo.

marcos disse...

Educação uma ova; é negócio da pesada e tem nome: Multilaser.

MAM