sexta-feira, 28 de novembro de 2025

Bolsonaro vai preso, e Tarcísio abre o jogo, por Andrea Jubé

Valor Econômico

O momento é mesmo de incertezas

O início da execução da sentença de 27 anos e 3 meses de prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, em uma cela da Polícia Federal (PF), deu uma chacoalhada na oposição, que reagiu.

Na mesma data escolhida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para rufar os tambores com a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil mensais, a direita providenciou um palco para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), mandar recados.

Compartilhando os holofotes de quarta-feira (26) com Lula, que comemorou o trunfo eleitoral para 2026, Tarcísio tentou acalmar apoiadores, atordoados com a notícia da prisão e o futuro incerto, diante de uma direita acéfala e fragmentada. “Não tenham ansiedade”, recomendou, durante o fórum UBS WM Latin America Summit, observando que a candidatura da direita poderá ser anunciada até março.

A novidade é que Tarcísio foi transparente como nunca a respeito de sua possível candidatura à Presidência da República, ao sugerir que poderá atuar na sucessão como cabo eleitoral. “Quero cumprir bem a missão, não importa em que papel”, declarou. “Não preciso ser protagonista”, ressaltou.

Aliados que orbitam o entorno mais próximo do governador insistem que ele continua empenhado na reeleição para o Palácio dos Bandeirantes, embora sinta-se confortável no papel de candidato favorito da direita.

“Tarcísio é cartesiano”, diz um político experiente, que conhece o governador de longa data. A percepção desta fonte é de que o mandatário paulista é racional demais para trocar o certo pelo duvidoso. Contudo, se Lula perder fôlego nas pesquisas e o cavalo arriado passar na frente, ele não hesitará em saltar à sela, ajustar a embocadura e redirecionar as rédeas rumo ao Palácio do Planalto.

Tarcísio ainda alertou, no mesmo evento, que a unidade da direita implica o respeito à liderança de Bolsonaro, que ainda concentra o capital político da oposição. “Essa liderança será importante para pacificar algumas arestas, e não tenho dúvida de que ele vai ter um papel importante”.

Em resumo, Tarcísio deu as coordenadas da direita a partir da reclusão de Bolsonaro na Polícia Federal, onde o acesso ao ex-presidente não será interditado, mas, ficará mais difícil. Em primeiro lugar, o governador destacou que março não será tarde demais para anunciar o adversário do PT, se possível, unificando o campo da direita. Esse “deadline” coincide com o prazo de desincompatibilização, se o titular vai concorrer a um cargo diferente do atual.

Em segundo, confirmou que terá um papel na sucessão presidencial, que poderá não ser o de candidato a presidente. E reafirmou que a escolha do candidato dependerá, sim, da concordância de Bolsonaro.

Um político do núcleo próximo de Tarcísio ponderou à coluna que enxerga a liderança de Bolsonaro fragilizada, após a tentativa de fuga e o constrangedor episódio da tornozeleira. Essa avaliação é contestada por outros quadros da direita. Mas na conjuntura atual, esta fonte acredita que ficou para trás o audaz fundador do bolsonarismo, e que em tal circunstância, o caminho prudente para Tarcísio seria disputar a reeleição, a fim de consolidar uma liderança nacional, com autonomia em relação ao clã Bolsonaro.

Em outra frente, lideranças do PT não temem eventual candidatura de Tarcísio à Presidência, mesmo ante o imponderável, ou seja, o impacto ainda nebuloso de se ter uma novidade como antagonista de Lula.

A coluna já ouviu de um petista influente que o “melhor adversário” para Lula seria Tarcísio porque “ele erra demais”. Para embasar a provocação, citou dois episódios em que o mandatário teve de fazer ajustes de rumo.

Em julho, quando o presidente Donald Trump anunciou a tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras aos Estados Unidos, a primeira reação de Tarcísio foi alinhada com o bolsonarismo. Escreveu nas redes sociais que a responsabilidade pelo tarifaço era “de quem governa” e que “Lula colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado”. Dois dias depois, após um bombardeio de críticas, mudou o tom. Afirmou que o tarifaço era “complicado” para o Brasil, para a indústria e para o agronegócio, e fez um apelo à “união de esforços”. “A gente precisa estar de mãos dadas agora, deixar a questão política de lado”, exortou.

Em um segundo episódio, em outubro, o governador deu uma declaração infeliz sobre os casos de intoxicação da população por bebidas adulteradas com metanol, principalmente, destilados. “No dia que começarem a falsificar Coca-Cola, eu vou me preocupar”, afirmou. Horas depois, foi a público se desculpar. Em vídeo, admitiu que a piada era inapropriada. “Peço perdão às famílias que sofrem por terem perdido entes queridos, aos comerciantes que estão vendo seus negócios sofrerem e ao público que quer uma ação firme do Estado”, justificou-se.

A se confirmar a avaliação deste aliado de Tarcísio, para quem o capital político de Bolsonaro esvaziou-se, uma liderança de centro diz que o capital de Lula também já não seria o mesmo. Cita pesquisa Quaest de 13 de novembro, segundo a qual 59% da população acredita que o petista não deveria tentar a reeleição. Esse percentual chegou a 66% em maio, caiu para 56% em outubro, e voltou a subir neste mês. O momento é mesmo de incertezas.

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