Ontem, na Academia Brasileira de
Letras, a editora Ciranda Cultural lançou, sob um novo selo, Principis, meus três
romances: O Dono do Mar, Saraminda e A Duquesa vale uma missa. Ao mesmo tempo,
a Academia me fez uma homenagem que muito me tocou, ao me dedicar uma sessão
especial, com meus confrades Domício Proença e Antônio Carlos Secchin
analisando minha obra de prosador e de poeta.
Comecei a escrever muito moço. Com meu pai, aprendi a amar os livros, amor que me acompanha por toda a vida. Sem eles não sei viver: vivo com eles. Primeiro aprendi a ler alguns clássicos, na pequena biblioteca que tínhamos em São Bento, no interior do Maranhão. Depois comecei a fazer, à mão, pequenos livros, com folhas datilografadas, A Canção Inicial e Poemas Decadentes. Participei, mais tarde, de um pequeno grupo que sonhava recuperar o Maranhão: éramos escritores e pintores. Ali, tive grandes companheiros, como o grande poeta Bandeira Tribuzzi, que fora estudar em Coimbra, e nos trouxera a descoberta da poesia portuguesa, sobretudo Fernando Pessoa.
Com o meu primeiro livro de poesia, que,
afinal, chamei de A Canção Inicial, entrei para a Academia Maranhense de
Letras. Mas a política me chamou, era meu destino. Minha vocação era a
literatura. Com ela noivei todas as noites.
Quando o destino me levou ao governo do
Maranhão, entre as solicitações permanentes da tarefa de romper com os vícios
que atrasavam o Estado naquela época, encontrei tempo para escrever um livro de
contos, Norte das Águas, que teve uma excelente acolhida da crítica.
Habituei-me a afastar as demandas da política — que me cobrava os textos de
discursos, pareceres, projetos de lei etc. — para escrever literatura.
Publiquei mais dois livros de poesia, Os Marimbondos de Fogo e Saudades Mortas,
outros contos, os três romances, ensaios, conferências.
Um dia reuniram a fortuna crítica de minha
obra literária — não só o que se escreveu no Brasil, mas em todo o mundo — e me
assustei: em 2018, tinha 119 títulos, com 168 edições; e de lá para cá já
saíram vários livros e novas edições.
A política, além do tempo que me tomou, muito
prejudicou a acolhida de minha obra literária. Não que não tenha tido aqui
grandes elogios de grandes escritores, como Rachel de Queiroz, Jorge Amado,
Darcy Ribeiro e tantos outros, mas muitos confundiram o político com o
escritor, e passaram a este a hostilidade àquele, enquanto no exterior fui
analisado apenas como escritor, tendo tido uma excepcional acolhida da crítica e
de personalidades como Lévi-Strauss ou Maurice Druon — e tido, além das edições
padrão, a acolhida para um público maior, em coleções de bolso como Le Petit
Vermillion e a Folio, da Gallimard. Eu também fui responsável, pois fui um mau
autor, não pude dedicar à minha obra a atenção que todas precisam de seu autor.
Foi em parte na busca de alcançar as novas
gerações que combinei estas novas edições, que receberam da editora um
tratamento moderno, com excelentes capas e a possibilidade de serem compradas
num estojo que reúne os três romances. Para temas diferentes, fiz abordagens
diferentes, e não sei se quem tiver lido um terá ideia do que são os outros. O
Dono do Mar é uma história de pescadores, lendas e tempos do Maranhão;
Saraminda se passa em torno do ouro do Amapá e de uma mulher que com ele se identifica;
e A Duquesa vale uma missa é a visão íntima de uma paixão diferente.
Foi sobretudo Norte das Águas que me
conduziu, pelas mãos de grandes escritores da Casa, que já eram meus amigos, à
Academia Brasileira de Letras. Ali entrei com 50 anos, estou, portanto, há 45 e
há cerca de 20 anos sou seu decano — coisa meio triste, pois significa que
todos que lá estavam quando fui acolhido já se foram. Fiquem tranquilos, eu nem
sonhava em ser presidente da República, e meu lugar na Casa é do escritor, não
do político.
É assim, me sentindo rejuvenescido com o
lançamento destes livros, que estou emocionado e grato com a homenagem que a
Academia me presta. Não foi uma homenagem ao meu destino, que cumpri como pude,
mas à minha vocação, a literatura.
*Ex-presidente da República, escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras

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