Terminou em confusão o encontro de dois atos no Rio - um para comemorar o golpe de 64, no Clube Militar, e um protesto cobrando punição para crimes da ditadura. Os manifestantes jogaram tinta vermelha na calçada do Clube Militar e chamaram os militares de torturadores. A PM usou spray de pimenta e bombas de efeito moral para conter o protesto. A OEA abriu investigação para apurar omissão do Brasil no assassinato de Vladimir Herzog, em 1975.
Tumulto no encontro de atos pró e contra golpe
Manifestantes cobram punição para crimes da ditadura e entram em conflito com militares que comemoravam data
Cássio Bruno
Terminou em confusão, corre-corre e pancadaria na tarde de ontem o encontro de dois atos no centro do Rio: um para comemorar os 48 anos do golpe militar de 1964, no Clube Militar, e um protesto que pedia punição para os crimes da ditadura. Enquanto cerca de 300 militares da reserva participavam do evento no clube, chamado de "1964 - A Verdade", na sede do Clube Militar, em frente à Cinelândia, pelo menos 350 pessoas, entre elas representantes de PT, PCB, PCdoB, PSOL, PDT e outros movimentos sociais de esquerda, fizeram a manifestação na frente das duas entradas do prédio, na esquina da Avenida Rio Branco com a Rua Santa Luzia. Um dos manifestantes foi detido pela polícia e liberado após prestar depoimento. Outros dois ficaram feridos ao serem atingidos estilhaços de bombas de efeito moral.
O grupo que participou do protesto, organizado pelas redes sociais na internet, levou bandeiras, faixas e cartazes com frases como "Ditadura não é revolução" e "Onde estão nossos mortos e desaparecidos do Araguaia?", além de fotografias de vítimas durante os anos de chumbo. Parentes de desaparecidos também compareceram ao local. Do lado de dentro, no auditório do clube, militares criticaram a criação da Comissão da Verdade, que investigará, sem punição, casos de violações de direitos humanos na ditadura militar, e defendiam as ações do período, entre 1964 e 1985.
- A comissão vem 30 anos após os fatos, quando ex-militantes da luta armada estão hoje em posição importante no cenário internacional - criticou o general Luiz Eduardo Rocha Paiva durante o discurso.
Rocha Paiva já tinha dado declarações sugerindo que a presidente Dilma Rousseff fosse convocada a depor sobre atos da organização política de esquerda VAR-Palmares, da qual a presidente fazia parte na época da ditadura. Ontem, durante o encontro, Rocha Paiva afirmou que "todos devem ser expostos à nação". Desde o ano passado, a presidente determinou o fim da comemoração do golpe militar por representantes de Exército, Marinha e Aeronáutica.
Na rua, os manifestantes gritavam palavras de ordem, chamando os militares de "torturadores", "porcos", "assassinos" e "covardes". Cada militar que chegava ou saía do local era cercado e xingado; eles precisaram ser escoltados pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar e pela Guarda Municipal. Houve enfrentamento entre policiais e manifestantes em diversos momentos e duas pessoas foram atingidas por tiro de descarga elétrica de uma pistola Taser. A confusão aconteceu entre 14h e 18h.
Os manifestantes também derramaram um balde de tinta vermelha nas escadarias do Clube Militar, representando o sangue das vítimas da ditadura, e atingiram um segurança do local com ovos. Durante o tumulto, o Batalhão de Choque da PM usou spray de pimenta e bombas de efeito moral. A Avenida Rio Branco foi interrompida ao trânsito por 10 minutos. A cena chamou a atenção dos militares da reserva. Parte deles observou a movimentação pela janela do quinto andar da sede do Clube Militar.
- Eu tenho pena desse pessoal. São ignorantes. Não conhecem a verdade - atacou o coronel do Exército Délio Mascarenhas.
No fim do evento, os militares ficaram acuados dentro do prédio e foram saindo aos poucos. O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, ex-ministro da Justiça, passou em frente à sede por causa de um outro evento. Ele considerou a comemoração dos militares uma provocação. Já o general Nilton Cerqueira, que comandou a operação que acabou na morte do ex-capitão Carlos Lamarca, em 1971, enfrentou os manifestantes.
Em São Paulo, o engenheiro Roberto Médici - filho do general Emílio Garrastazu Médici, que presidiu o país entre os anos de 1969 e 1974 - autografou o livro "Médici - A Verdadeira História" em comemoração ao golpe do dia 31 de março de 1964 .
FONTE: O GLOBO
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