A presidente Dilma Rousseff resistiu e descartou, por ora, qualquer mudança na meta de superávit primário das contas públicas para aumentar os investimentos. O diagnóstico do Palácio do Planalto, neste momento, é outro: não faltam recursos. O dinheiro existe e está parado no Tesouro Nacional. O que falta é competência para gastar, asseguram fontes da presidência. Reduzir a meta de superávit primário, nesse caso, seria ocioso e temerário, já que é o esforço fiscal que dá sustentação à política de corte dos juros básicos da economia, a taxa Selic.
O debate sobre um eventual afrouxamento fiscal - mediante o abatimento de R$ 25 bilhões em gastos com investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - esquentou no governo a partir de três constatações preocupantes: o investimento público está em queda contínua desde o ano passado; o setor privado também não investe; e a atividade econômica está praticamente de estagnada. Portanto, cabe ao governo acelerar seus investimentos para estimular o setor privado a fazer o mesmo.
No primeiro trimestre deste ano o crescimento foi de apenas 0,2% sobre o último trimestre de 2011 e a economia está reagindo muito lentamente aos estímulos já concedidos. Mesmo contando com uma aceleração da atividade no segundo semestre, as expectativas dos agentes econômicos convergem para uma expansão muito modesta do PIB este ano, de 2%. Nos dois primeiros anos da gestão Dilma, portanto, a performance do crescimento pode ser comparável ao padrão do governo Fernando Henrique Cardoso.
Compras do governo terão margem de preferência
O superávit primário acumulado no primeiro quadrimestre - de R$ 45,02 bilhões - correspondeu a 3,31% do PIB e representou 46,5% da meta de superávit consolidado do ano. Foi um desempenho acima do necessário justamente num ano de eleições, quando os gastos públicos se concentram no primeiro semestre, salientam fontes oficiais.
As metas fiscais, no entanto, estão sendo cumpridas da pior maneira possível: as despesas de custeio crescem acima do PIB e caem os investimentos. Esta, porém, não é uma peculiaridade do atual governo. Tem sido assim desde sempre, com raras exceções.
Quando assumiu, em janeiro de 2011, o governo Dilma encontrou R$ 32,15 bilhões em investimentos públicos acumulados em 12 meses (dados que incluem as inversões financeiras). Essas cifras foram crescentes até janeiro de 2011, quando atingiram R$ 45,9 bilhões. De lá para cá, inverteram o sinal e passaram a cair sistematicamente.
Em meados do segundo semestre de 2010, o Tesouro Nacional inaugurou uma nova contabilidade, passando a incluir os gastos com subsídios ao programa Minha Casa Minha Vida como investimento público. Ao somar a despesa com subsídios aos investimentos, mascarou-se a queda do investimento stricto sensu, tal como era definido na Lei 4.320, alterada este ano para acolher a mudança.
Assim, para investimento total de R$ 41,3 bilhões acumulado em 12 meses até abril, quase R$ 13 bilhões foram de subsídios ao programa habitacional. Os demais investimentos, as obras de melhoria da infraestrutura e logística, caíram para R$ 28,5 bilhões, cifra bem inferior aos R$ 45,9 bilhões de janeiro de 2011.
O quadro de precária execução das obras públicas associado à percepção de que o crescimento este ano será baixo levou a presidente, na segunda-feira, a convocar uma reunião de emergência com nove ministros, tanto os responsáveis pelo caixa da União quanto os gestores e os encarregados das obras. Foi uma reprimenda só.
O problema, porém, é mais complexo. O Estado brasileiro há muitos anos perdeu a capacidade de investir. Ao contrário do período em que havia órgãos de planejamento setorial, como a Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes (Geipot), extinta no início dos anos 90, o Estado hoje não tem projetos nem técnicos aptos a elaborá-los. Os que aparecem das licitações são de baixa qualidade, feitos por mão-de-obra terceirizada e sem especialização contratada pelas empresas de engenharia. A isso se misturam irregularidades, superfaturamento, corrupção e as obras vão parar nos escaninhos do Tribunal de Contas da União. Foi isso que ocorreu, por exemplo, com os projetos de recuperação de 30 mil quilômetros de rodovias licitados pelo DNIT.
A saída para a paralisia no investimento público é recorrer às concessões, admitem fontes oficiais. Fala-se, no governo, em ampliar o regime de concessão inclusive para a área de saneamento básico. O difícil é trocar a visão doutrinária pelo pragmatismo.
Para estimular o investimento privado, o governo decidiu começar a agir. Vai ampliar e acelerar as compras governamentais, com margens de preferência para empresas brasileiras (independentemente da origem do capital) de até 25%. Atualmente as compras governamentais com margem de preferência para os preços das mercadorias estão sendo usadas de forma bastante restrita, como é o caso da aquisição de uniformes para os oficiais da Defesa. A comissão interministerial criada para cuidar das compras públicas está finalizando as propostas e em breve sairão decretos com essa finalidade.
Serão cerca de R$ 10 bilhões em compras governamentais com margem de preferência nas áreas de tecnologia da informação e comunicação, de equipamentos médico-hospitalares, de tecnologia mais complexa para o Ministério da Defesa e para as grandes de compra do PAC.
Só com a compra de 400 motoniveladoras e de duas mil retroescavadeiras o governo gasta cerca de R$ 1 bilhão por ano, o que corresponde a 20% desse mercado em encomendas. Com a aplicação da margem de preferência nos pregões de compras públicas, o valor do lance será menor do que o do último pregão e haverá estímulo à concorrência, garantem técnicos do governo.
Discute-se, também, um possível adiamento do recolhimento de impostos para nutrir o caixa das empresas por até 60 dias, liberando recursos para novos investimentos.
O governo quer salvar o PIB de 2012. Quem sabe, chegar a uma expansão próxima a 3% no ano. Mas essa é uma tarefa muito difícil, praticamente impossível.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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