Depois de planejar a CPI do Cachoeira como um instrumento para provar que o "mensalão" foi uma farsa, o PT teme perder o controle da Comissão e vê-la transformada na "CPI do PAC" (Programa de Aceleração do Crescimento). O partido teve uma derrota tripla nos últimos dias: não conseguiu aprovar a quebra do sigilo bancário do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB); não segurou os aliados na quebra do sigilo da Delta, principal empreiteira do PAC e pivô do escândalo; e ainda viu o governador do Distrito Federal, o petista Agnelo Queiroz, ser convocado para depor. O PT sofre também com divisões internas. Três grupos diferentes do partido disputam interesses distintos na CPI.
Quebra de sigilo da Delta acende sinal de alerta no PT
Caio Junqueira
BRASÍLIA - O PT teme perder o controle da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Cachoeira e que seu foco saia de "desvendar a farsa do mensalão", a que se propôs, para outro, maior e mais perigoso para o partido: uma "CPI do PAC", o Programa de Aceleração do Crescimento, que seria possível a partir a quebra de sigilo da empreiteira Delta.
O sinal amarelo acendeu a partir dos resultados da comissão nesta semana. A legenda tinha o objetivo principal de quebrar os sigilos do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), e evitar que qualquer governador fosse convocado agora. Acabou com uma tripla derrota. Desistiu de colocar em votação a quebra de sigilo do tucano, não segurou os aliados na quebra de sigilo da Delta e ainda viu o governador correligionário, Agnelo Queiroz, do Distrito Federal, ser convocado para depor, assim como Perillo.
Ontem, petistas estavam preocupados com a situação, mas a preocupação maior era com as próximas semanas. A eles chegou a informação de que, a depender do caminhar das apurações, os partidos de oposição podem vir a apresentar requerimentos para convocar a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, e a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra.
Ambas, em momentos diferentes, coordenaram o PAC no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Belchior se manteve na Esplanada com a eleição de Dilma. Mas para Erenice isso não possível. Em setembro de 2010, denúncias de tráfico de influência a afastaram do cargo. Até mesmo o ex-ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, é citado entre petistas como possível alvo.
Com a possibilidade de a investigação ser ampliada, o PT avalia formas de se rearticular politicamente e consolidar a maioria que sempre teve na CPI. A estratégia é mostrar aos aliados o risco de uma apuração maior do que a prevista no objeto da comissão. O Rio de Janeiro do governador Sérgio Cabral (PMDB), por exemplo, é o maior contratante estadual da Delta no país. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a principal pagadora da construtora no governo federal, ficou oito anos tendo a cúpula do PR à frente. O mesmo argumento serve ao PP e ao Ministério das Cidades com suas obras de saneamento. Ou seja, para petistas, se o foco ampliar, o PT muito provavelmente não estará sozinho em eventuais delitos que aparecerão.
Além disso, o Palácio do Planalto tem em construção um discurso preventivo para atenuar sua participação em irregularidades que vierem a ser descobertas na Delta.. A referência é ao pedido à Controladoria-Geral da União que abrisse processo administrativo para que a empresa seja declarada inidônea. Com isso, a União não mais a contratará. Nos contratos vigentes, avaliará caso a caso se a mantém nas obras ou se chama a segunda colocada nas licitações para finalizá-las.
O problema é que essa estratégia pode falhar se a quebra do sigilo demonstrar um PAC muito corrompido, conluios entre construtoras, bem como obras estaduais afetadas, qualquer que seja o governador. Caso atinja essa dimensão, o maior prejudicado pode ser o PT, tendo em vista ser o governo federal o maior pagador de obras civis no país.
Por outro lado, os partidos, ao perceberem que pode sobrar para todos, tendem a buscar um acordo e limitar a apuração. Ainda assim, pode haver prejuízo, uma vez que as investigações poderão ser continuadas pelos Ministério Público. Essa linha inclusive tem sido defendida por petistas da CPI: de fazer um relatório ligado ao objeto inicial da comissão, independentemente do rumo que ela tomar.
O PMDB, contudo, gostou do acerto com o PSDB nesta semana e acredita que é o PT quem mais depende dele na CPI do que o contrário. Rejeita também alinhamento automático com o aliado nas sessões, sob argumentos diversos, compartilhados por outros aliados.
Primeiro, que a coalizão não se estende à CPI, apenas ao processo legislativo. Ainda mais em uma CPI armada, inicialmente, para abater os inimigos petistas. Segundo, que os petistas buscam a hegemonia nas eleições municipais e têm deixado os parceiros nacionais à míngua, tanto em recursos da União quanto na disposição a apoio nas cidades. Cita-se o caso do irmão do presidente da CPI, senador Vital do Rego Filho (PMDB-PB), prefeito em Campina Grande (PB), que pena para o PT desistir da candidatura própria e apoiar sua candidata em outubro. Algo que não deve ocorrer.
Terceiro, que os petistas não cumprem acordos. Os dois partidos tinham acertado na segunda-feira que a quebra do sigilo nacional da Delta seria restrita às contas ligadas ao esquema da empresa do Centro-Oeste. No início da votação, os petistas do Senado foram os primeiros a votar pela quebra do sigilo nacional. O PMDB percebeu que não teria votos suficientes e acompanhou. Sem falar no constantemente ameaçado acordo para apoiar Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) na eleição para presidência da Câmara em 2013.
Esse, aliás, é outro problema para o PT resolver. As bancadas da Câmara e do Senado ainda não acertaram o passo. O que os separa é a divisão na avaliação inicial do rumo que o partido deveria dar à CPI. Os deputados sempre foram mais favoráveis a limitá-la ao Centro-Oeste e a não convocar os governadores, enquanto os senadores não tinham a convicção de restringir a apuração.
Há ainda os desacertos pessoais. Os senadores acabaram aceitando o plano de trabalho da CPI, mas foram surpreendidos quando o relator Odair Cunha (PT-MG) se disse favorável à quebra do sigilo da Delta. Também não gostaram das declarações do líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP), de que "esse é o PMDB", após a aliança da sigla com tucanos na blindagem a Sérgio Cabral e convocação de Agnelo Queiroz.
Os deputados, por sua vez, não gostaram das manifestações do líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), sobre o episódio em que o deputado Cândido Vaccarezza (SP) foi surpreendido prometendo proteção a Cabral. Pinheiro disse que cabia ao deputado analisar se deveria sair da CPI. Outra declaração considerada desastrada por deputados foi a do senador Humberto Costa (PE) sobre Cabral. Ao tentar defender o governador, disse que tudo que havia contra Cabral eram imagens dele com guardanapos na cabeça. O que é falso. Em nenhum momento o pemedebista aparece nas fotos nessas circunstâncias.
O PMDB tem arrolada todas essas situações e avalia que, a partir de agora, a CPI será tomada por articulações e acordos instantâneos e pontuais, com PT, PSDB ou quaisquer outros. A única exceção para essa linha, na visão da sigla, seria o governo intervir na CPI, mostrar posição e compor maioria. Seria, assim, o único elemento aglutinador da base que poderia reorganizar a condução da comissão. Algo, por ora, improvável.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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