Já está em circulação a coletânea de textos de Armênio Guedes,
publicada pela Fundação A. Pereira em parceria com a editora CONTRAPONTO. Mais
informações: 061 – 32184104 e 61-32242269.
*** Apresentação de Luiz Sergio
Henriques
Com este livro, organizado por Raimundo Santos, começa a se
delinear em sua inteireza o perfil do veterano dirigente comunista Armênio
Guedes, uma das referências político-intelectuais decisivas de décadas da história
do velho PCB, o Partidão, muito
especialmente a partir dos duros anos de clandestinidade, ainda no Estado Novo,
e em seguida do segundo pós-guerra.
De fato, a trajetória de Armênio está ligada a aspectos cruciais
da trajetória daquele partido, como, por exemplo, aqueles que marcaram a grande
crise do movimento no “inesquecível 1956”. Como se sabe, naquele já distante
ano teve início o tímido, mas irreversível, processo de desestalinização na
“pátria do socialismo”, com a denúncia dos crimes cometidos por Stalin durante
a coletivização forçada e em outros momentos da construção do socialismo “num
só país”. E, simultaneamente, no Brasil, a conjuntura política parecia se mover
em sentido progressista, com o acelerado desenvolvimento econômico nos quadros
da Constituição liberal de 1946.
Dinamizada por este duplo impulso, a política dos comunistas –
mesmo na ilegalidade ou, no máximo, discretamente tolerados a partir do final
da década de 1950 – buscava novo fôlego e novos horizontes: aí então
encontramos, já definida, a figura de Armênio, um dos redatores da célebre
“Declaração de Março de 1958” e um dos intelectuais que trabalharam com este
singular Astrojildo Pereira em inúmeras iniciativas, como, entre outras, a
revista Estudos sociais, expressão de
um sopro de renovação da cultura da nossa esquerda.
Derrotada em 1964 a hipótese de reforma do capitalismo, segundo um
padrão que deslocasse para o próprio país as decisões fundamentais (a questão
nacional) e implicasse a incorporação da massa rural ao sistema econômico e
social (a questão democrática, entendida “substantivamente”), eis que deparamos
novamente com Armênio, explorando em profundidade, ao lado de outros grandes
dirigentes, como Luiz Inácio Maranhão e Marco Antônio Coelho, as razões da dura
derrota e os meios mais produtivos de chegar novamente à democracia.
Estas foram questões candentes no seu tempo: questões que levaram
a maior parte do PCB, importantes dissidências à parte, a valorizar a política
de frente democrática, bem como a apontar o rumo da resistência propriamente
política ao regime ditatorial, tendo como referência a luta pela anistia, pela
legalidade de todas as forças partidárias e, finalmente, pela convocação de uma
Assembleia Nacional Constituinte.
Aquele tempo projeta sonhos, conquistas e, naturalmente, promessas
ainda não cumpridas sobre o Brasil dos nossos dias. Restaurado o regime de
liberdades, o velho Armênio mais uma vez inova radicalmente: nele, a expressão
“comunismo democrático” perde o caráter de oximoro de difícil entendimento. Com
Armênio, penetramos numa ordem nova de possibilidades de mudança social,
enraizada no respeito à legalidade constitucional e no método do reformismo,
palavra antes maldita no repertório clássico da esquerda de matriz bolchevique.
Na sua introdução ao volume, Raimundo Santos mergulha no passado
da experiência comunista e, ao singularizar a personalidade de Armênio,
mostra-nos que, em meio a um século dramático, como foi o século XX, inclusive
no Brasil, é possível buscar um fio condutor para as lutas sociais nas
condições muitas vezes inéditas em que vivemos.
A aposta do organizador deste livro – a nossa aposta – é que a
figura de Armênio e tudo o que ela representa estão destinadas a se tornarem
bem maiores com o aprofundamento da vida num regime de liberdades. Uma aposta a
ser feita, coletivamente, por uma esquerda democrática e reformista ainda em
construção, que trate, com atenção, o legado de Armênio.
***Luiz Sérgio Henriques É ensaísta e editor de Gramsci e o Brasil
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