Há muita gente entusiasmada com as mobilizações populares desta última semana. Só na capital de São Paulo, em plena segunda-feira sem feriadão, estimou-se mais de 65.000 pessoas nas ruas. Tem uns mais exaltados que falam até em revolução, em insurreição.
Muito bom! Muito bem! Mas 65.000 manifestantes, sendo todos eles eleitores e imaginado que votassem em um só candidato, não elegeriam um único deputado federal pelo estado.
Essa observação revela a distância existente entre os mecanismos de institucionalização de parte importante do poder político e o que acontece na vida real e no dia a dia dos cidadãos.
O mesmo pode se dizer das lideranças do movimento que, embora com um discurso que tenta galvanizar a "vontade" popular, também mostra que a mesma distância permanece.
Ou alguém acha que alguns jovens muito bem articulados, audazes, corajosos e com uma linguagem altamente politizada e até mesmo com refinamentos teóricos e intelectuais representam, de fato, a sociedade ou mesmo a massa que supostamente lideram?
Ao contrário, tem grande dificuldade de controlar os grupos, organizados ou desorganizados, que se movem nas franjas das manifestações e que levantam outras bandeiras, ou bandeira nenhuma, e acabam por descambar para a violência. Mas isso não diminui o valor dessas lideranças pois, em sua maioria, sinceramente, tentam inibir e combater essas "distorçöes", embora não consigam fazê-lo.
Na construção de seu discurso hoje estão tentando se manter numa zona de conforto com a seguinte posição: o movimento é justo, tentamos mantê-lo pacífico, é também apartidário e sem definições prévias de roteiros para passeatas. Se há excessos, vandalismo e uso eleitoral é somente por culpa dos outros, dos grupos de vândalos, dos grupos e partidos "infiltrados", da polícia e dos governos que não atendem às reivindicações.
É difícil essa lógica subsistir por muito tempo, logo se precisará assumir um novo patamar de organização, pois ainda não há nas tramas do poder e da negociação com ele a horizontalidade que tentam manter no movimento. Se isso não ocorrer as possibilidade de que o movimento se esvazie, se perca em radicalismo ou seja absorvido pela política tradicional é grande.
Seja como for, toda essa movimentação é extremamente saudável para dar maior consistência à democracia brasileira deixando expostas algumas das entranhas da insatisfação social, dando possibilidade para o surgimento de novas formas de tratamento de conflitos e demandas, ensinando os governos a responderem melhor a suas atribuições, inclusive no exercício do poder de polícia, e forjando novas lideranças que virão a ser dirigentes das instituições políticas em todos os níveis - queiram elas ou não.
A democracia precisa disso para se revigorar e sair da pasmaceira de hoje, quando vemos possibilidades até mesmo de retrocessos significativos, como por exemplo: a PEC 37 que retira do Ministério Público a possibilidade de investigar crimes; a postergação do final do julgamento do mensalão e a punição concreta dos criminosos condenados; a restrição do direito de manifestação das minorias com o tolhimento ao nascimento de novos partidos e a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados aprovando a "cura gay" contrariando a ciência, o bom senso e o direito à diversidade e ao livre arbítrio.
Urbano Patto é Arquiteto-Urbanista, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional, dirigente do partido Mobilização Democrática - MD (PPS) de Taubaté e do Estado de São Paulo. Comentários, sugestões e críticas para urbanopatto@hotmail.com.
Nenhum comentário:
Postar um comentário