Na terça-feira, 23 deputados federais do PMDB foram chamados pelo vice-presidente da República, Michel Temer. Cada um foi recebido separadamente. Após uma conversa com Temer sobre a relação do governo federal com o partido no seu Estado, o parlamentar era submetido a questionário aplicado pelo presidente da Fundação Ulysses Guimarães, centro de estudos do partido, Eliseu Padilha.
São 24 perguntas, que devem ser respondidas pelos 80 deputados federais e 20 senadores da sigla. A cúpula nacional quer uma média da posição de todo o partido sobre três questões: situação eleitoral em cada Estado, tratamento dado pelo governo federal aos aliados locais e as recentes manifestações de rua.
Temer disse ao Valor estar fazendo um "balanço de final de semestre sobre a situação da base aliada", em especial do PMDB, para levar à presidente Dilma Rousseff, provavelmente no segundo semestre, depois que os diretórios estaduais também forem consultados. "Tem sido útil ouvir os parlamentares. Quando falamos de alternativas para o futuro, as pessoas querem manter a aliança nacional, mas querem melhorar a relação com o governo", afirma.
Para buscar o povo, PMDB tem que limpar seu quintal
Para o vice, os protestos forçam mudança de postura de todo mundo. O governo "tem que estar atento à voz das ruas e ver o que pode fazer" e prestar atenção às queixas dos aliados. "O nome diz: é a base de sustentação parlamentar. E haverá votações importantes no segundo semestre, como a proposta de reduzir a jornada de trabalho [de 44] para 40 horas semanais. "Consegui segurar [quando presidente da Câmara], mas a proposta está voltando com vigor."
As insatisfações do PMDB são conhecidas e anteriores à queda de popularidade de Dilma, mostrada pelas pesquisas de intenção de voto: não ocupar ministério com potencial de ação política, ser excluído do núcleo central de decisão do governo e tratamento diferenciado do governo a parlamentares do PT e do PT, entre outras coisas.
O momento de fragilidade da presidente favorece a tentativa de valorização do peso do partido na aliança. Mas não é só isso. O partido está preocupado com a própria pele e quer montar uma estratégia de ação partidária para o novo momento.
"As manifestações vieram para ficar. Pode haver três meses sem protesto, mas, daqui a pouco, o povo volta às ruas. É uma conquista da cidadania", diz o presidente da Fundação Ulysses Guimarães. Segundo Padilha, a Executiva quer fazer um retrato da posição partidária, saber "se a linguagem de Brasília é a mesma do restante do país" e buscar reaproximação com o povo.
A consulta a parlamentares mostra que os partidos mais criticados nos protestos são PT, PMDB e PSDB, nessa ordem. "Queremos reconquistar a franquia política que tivemos historicamente. Se tem um partido com história de interação e representação com a sociedade é o PMDB", afirma Padilha.
No questionário, o comando do PMDB pergunta se o partido terá candidato a governador e a senador no Estado (e, se sim, quem serão), quais as alianças locais, se ocupa cargo federal no Estado ou na região e qual é a posição sobre a aliança nacional. Pergunta se, em viagens da presidente da República ao Estado para inaugurar obras ou entregar equipamentos, parlamentar da sigla é convidado a participar.
O comando do PMDB pede duas sugestões a ser dadas a Dilma para aprimorar a relação com a base. Sobre as manifestações, a cúpula pergunta, por meio do questionário, se a população do Estado as apoia, quais as duas principais reivindicações presentes nos protestos, quais os três partidos mais criticados e, por fim, como melhorar o diálogo com a sociedade.
Na semana passada, a Fundação Ulysses Guimarães realizou o seminário "Para onde a cidadania quer levar o Brasil?". Deputados e senadores ouviram três especialistas sobre a onda de protestos: Paulo Baía, professor de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Thiago de Aragão, coordenador do Grupo de Assuntos Estratégicos da Arko Advice, e Renato Meirelles, presidente do instituto Data Popular, especializado nas classes "C" e "D".
Meirelles apresentou análise das manifestações, com base em pesquisas divulgadas pelos institutos Ibope e Datafolha, realizadas durante as manifestações, e uma do próprio Data Popular, feita em final de maio, antes dos protestos, com 1.500 jovens.
"Os jovens são os novos formadores de opinião das famílias brasileiras, porque estudaram mais que os pais e estão qualificados. Ao ter acesso à internet, eles viram fonte de informação para os mais velhos. São 42 milhões de eleitores jovens [um terço do eleitorado], de 18 a 30 anos. Pelo tamanho e poder de influência, têm muita força."
Esses jovens lideram o processo de insatisfação na população, são mais rigorosos que os pais na avaliação da qualidade dos serviços públicos prestados, não têm sentimento de gratidão aos governos do PT pela ascensão econômica e se sentem protagonistas do próprio destino.
O presidente do Datafolha chama a atenção para outro dado, que contribui para engrossar o caldo de insatisfações: o aumento do emprego formal -e o consequente recolhimento do imposto na fonte- trouxe consciência dos tributos pagos e maior cobrança por serviço público de qualidade.
"A régua mudou. O que antes estava bom, agora não está mais. O nível de exigência e satisfação mudou", afirma. Para o comunicólogo, a discussão de legado do PT e do PSDB está superada e o que vai pautar a eleição presidencial é a discussão de futuro.
Segundo ele, Dilma perdeu parte do capital político dela - baseado na imagem de boa gestora e de não transigir com a corrupção-, mas os adversários ganharam pouco. "A Marina Silva "mito" cresce com as passeatas, mas a Marina "real" não resolve os problemas. E a oposição não conseguiu capitalizar os protestos porque é a face da mesma moeda do sistema político criticado."
Se PMDB quer mesmo aproximar-se do povo, tem que começar pelo próprio quintal, barrando práticas como o uso de aviões das Forças Aéreas Brasileiras (FAB) para viagens particulares.
Fonte: Valor Econômico
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