Dimmi Amora, Natuza Nery – Folha de S. Paulo
• Divididos e sob pressão, ministros costuraram acordo para adiar julgamento
• Ideia é conceder à presidente até 45 dias para que responda às irregularidades que o tribunal apontou
BRASÍLIA - Os ministros do Tribunal de Contas da União fecharam na noite desta terça-feira (16) um acordo para dar à presidente Dilma Rousseff tempo para explicar pessoalmente manobras contábeis feitas para fechar as contas do seu governo em 2014, cujo julgamento está marcado para esta quarta (17).
Com isso, a votação deve ser adiada, dando à presidente prazo de 45 dias para apresentar sua defesa. Só depois disso o tribunal tomaria uma decisão sobre o assunto.
Pelo acordo, o TCU indicará haver elementos para rejeição das contas do governo, mas abrirá espaço para o "contraditório". O receio da corte é de que o Palácio do Planalto recorra à justiça.
Embora considerada remota, ainda há chance de o tribunal mudar de opinião até o início do julgamento, na manhã desta quarta.
Técnicos do TCU apontaram várias irregularidades nas contas, incluindo as chamadas "pedaladas" fiscais, que permitiram ao governo segurar despesas com ajuda dos bancos públicos que pagam, por meio de transferências, benefícios do Bolsa Família e de outros programas oficiais.
Os ministros estão divididos sobre o assunto e sofreram fortes pressões nas últimas horas. Emissários de Dilma tentaram convencer o tribunal a aprovar as contas. Integrantes da oposição como o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que perdeu para Dilma a última eleição presidencial, defenderam sua reprovação.
A rejeição das contas de Dilma pode prejudicar a imagem externa do país, aumentando a desconfiança dos investidores sobre os números do governo, e criar dificuldades políticas, oferecendo nova justificativa para líderes da oposição que defendem o impeachment da presidente.
Em seu parecer, o representante do Ministério Público Federal no TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, recomendou a reprovação das contas. "O que a nação assistiu perplexa foi uma verdadeira política de irresponsabilidade fiscal, marcada pela deformação de regras para favorecer os interesses da chefe do Executivo em ano eleitoral".
Ministros do TCU acham que há justificativas técnicas para a rejeição das contas, mas alguns temem que isso prejudique a economia. Cabe ao Congresso votar a recomendação do TCU e dar a palavra final sobre o assunto.
Nos últimos dias, agências internacionais de classificação de risco, cujas análises são consultadas pelos investidores na hora de decidir onde aplicar seu dinheiro, buscaram informações no TCU.
Embora seja majoritário o entendimento de que o governo errou, nem todos os ministros acham que a presidente deve ser responsabilizada por esses erros. O relator do processo, ministro Augusto Nardes, tem indicado que não recomendará a aprovação.
De acordo com o relatório que será analisado pelo TCU, o governo não só permitiu que bancos estatais custeassem o pagamento de benefícios sociais de maneira irregular, como manteve despesas no orçamento sabendo que não teria como pagá-las.
Além disso, três decretos assinados pela presidente da República permitiram ao Tesouro Nacional obter empréstimos sem autorização do Congresso, segundo o TCU. O relatório afirma que o governo escondeu dívidas estimadas em R$ 256 bilhões.
Os nove ministros do TCU participarão do julgamento. Se Dilma tiver as contas rejeitadas pelo Congresso, corre o risco de ficar inelegível e, em último caso, ser afastada do cargo e enfrentar processo por crime de responsabilidade.
Colaboraram Marina Dias e Andréia Sadi, de Brasília
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