Fábio Fabrini, João Villaverde e André Borges - O Estado de S. Paulo
• Governo teria que explicar irregularidades apontadas em relatório
Ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) costuravam na terça-feira um acordo para adiar o julgamento das contas da presidente Dilma Rousseff em 2014, marcado para esta quarta-feira, e abrir prazo para que o governo dê mais explicações sobre irregularidades apontadas em relatório técnico da corte. A tendência se confirmou na noite de terça, diante da falta de consenso, entre os integrantes do tribunal, sobre qual decisão tomar a respeito do balanço que descreve a situação contábil, financeira, patrimonial e orçamentária da União.
O tribunal apontou uma série de "distorções" nas contas do governo Dilma em 2014, entre elas as chamadas "pedaladas fiscais" - prática de atrasar propositalmente o repasse de recursos para bancos públicos honrarem compromissos de programas sociais.
Pelo acordo em discussão, o tribunal indicaria nesta quarta-feira que há elementos para a reprovação das contas, mas daria ao menos 30 dias para que o governo, numa nova fase processual, apresente mais elementos de defesa. Só depois disso, os ministros aprovariam um parecer definitivo sobre o balanço da União.
A decisão sobre o adiamento ou não será tomada na sessão, marcada para às 10h. Alguns integrantes do TCU defenderam que um eventual pedido de explicações seja endereçado diretamente à presidente Dilma, o que também terá de ser definido em plenário.
Conforme ministros ouvidos pelo Estado, prorrogar o julgamento é a solução possível, de imediato, diante do racha entre os integrantes da corte sobre o que fazer com as contas. Até a noite de terça-feira, o relator do processo, ministro Augusto Nardes, no entanto, ainda resistia a encampar, em seu voto, a proposta de abrir mais prazo para o julgamento.
Antes de reunião a portas fechadas para tentar um acordo com outros ministros, Nardes afirmou ao Estado que não votará conforme a tradição do tribunal. "Não farei como se faz todos os anos aqui no TCU. Não aprovarei (as contas) com ressalvas", declarou ao Estado.
Em conversas reservadas com outras autoridades da corte, o relator explicou que sua posição será por considerar as contas irregulares. Porém, o documento oficial, com a posição a ser lida por ele em plenário, não havia sido distribuído aos demais integrantes do plenário do TCU até o fim da noite.
A proposta de adiamento, inicialmente aventada pelo ministro Raimundo Carreiro, ganhou força após um dia de intensa pressão política sobre o tribunal, cuja maioria dos integrantes é indicada pelo Congresso e pelo Palácio do Planalto, após negociações entre os partidos.
Durante o dia, o Palácio do Planalto escalou os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Nelson Barbosa (Planejamento), além do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, para demover as autoridades do TCU a votar pela rejeição. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) arrastou uma comitiva de oposição para argumentar em contrário.
Os partidos contrários ao governo pretendem usar um eventual parecer adverso a Dilma para abrir um processo de impeachment contra a presidente.
A corte de contas foi alertada por sua própria área técnica sobre a necessidade de abrir espaço para o contraditório. O alerta dos auditores remete a uma decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal, que no passado já deu parecer favorável ao então governador de Pernambuco, Miguel Arraes (morto em 2005), após a emissão de um parecer prévio do Tribunal de Contas do Estado que rejeitava suas contas.
O TCU avalia anualmente se o balanço financeiro, contábil, patrimonial e orçamentário corresponde à realidade. A corte pode dar parecer pela aprovação (com ou sem ressalvas), a rejeição ou mesmo se abster de uma opinião sobre ele. A recomendação serve de referência para que o Congresso julgue, sem prazo definido, se o balanço é regular ou não.
O relatório técnico dos auditores do tribunal, revelado pelo 'Estado' no sábado, aponta "distorções" de R$ 281 bilhões no Balanço Geral da União (BGU) de 2014 entregue pelo governo Dilma Rousseff ao TCU em abril. Entre essas distorções estão R$ 37,1 bilhões referentes às chamadas "pedaladas fiscais", que são atrasos propositais no repasse de recursos públicos para bancos e autarquias.
Em um parecer prévio, o Ministério Público de Contas, que atua junto ao TCU, sugeriu aos ministros do TCU rejeitar as contas federais. "Perplexa, a nação assistiu a uma verdadeira política de irresponsabilidade fiscal, marcada pela deformação das regras para favorecer os interesses da chefe do poder em ano eleitoral e não o interesse da coletividade no equilíbrio das contas públicas", criticou o procurador Júlio Marcelo de Oliveira.
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