• Lula recolheu-se à espera de clareza para definir o futuro
- Valor Econômico
Aqui mesmo, especialistas em interpretação de pesquisas eleitorais decretaram há poucos dias a impossibilidade de o ex-presidente Lula ter uma candidatura a presidente bem sucedida, em 2018, nas condições que tem hoje, com o governo Dilma Rousseff no andamento cadenciado de um paquiderme. Sem contar outros percalços que o têm incomodado, como citações de seu nome em denúncias da Operação Lava-Jato e, principalmente, o choque de ver sua imagem reproduzida em bonecos vestidos de presidiários, como ocorreu na última manifestação popular de 16 de agosto. Essas situações mais do que fragilizam e tornam vulnerável o ex-presidente, o tem deixado perplexo.
O vaticínio muda, porém, se Lula for um político de oposição. Aí terá fôlego, e é por isso que torcem seus amigos. Para que seja criado o cenário em que o ex-presidente seja o candidato que vá fazer o ataque ao descalabro do governo; ter um adversário em quem jogar a responsabilidade pela crise econômica, política e moral que assolou o país, agora agravada, finalmente, como sempre foi alegação recorrente, pela crise mundial. Realismo pragmático.
Lula, na oposição, voltaria a ser muito forte, avaliam seus críticos e seus amigos, sem exceção. A campanha apresentaria uma dose elevada de vitimização, já sem o peso do fracasso do governo, com a vantagem de que, sendo a situação do país tão grave, é certo que ninguém resolveria os problemas em dois anos. Não há mágico, de qualquer partido, que o faça, saia a presidente Dilma Rousseff por impeachment ou por renúncia.
Com esse diagnóstico em mãos, Lula aguarda, observa, mas decidiu não jogar a toalha ainda com relação ao governo Dilma. Segundo seus próximos, ainda tem tempo para esperar melhor desfecho das tentativas de ressurreição que a presidente ensaia, algumas por conselho dele, ainda aos trancos, com uma equipe cuja atuação o ex-presidente e o país decididamente não compreendem, pela arrogância, equívocos e fracassos sucessivos. Enquanto Dilma reagir, porém, Lula manterá na gaveta o projeto futuro-garantido.
À presidente foi dado oxigênio intenso no início de agosto, quando os banqueiros Roberto Setubal e Luiz Trabuco lideraram empresários da comunicação e da indústria, senadores, judiciário, economistas de elite de todas as tendências e se uniram em concertação de apoio, contra o impeachment. Com as manifestações populares, Dilma engasgou. Mais uma vez, não soube responder às ruas. Veio em seu socorro a Agenda Brasil, peça de força marqueteira a impulsionar a votação da última medida do ajuste fiscal no Congresso. Na semana seguinte, sucumbiu à crise da articulação política do vice-presidente Michel Temer, sabotado pelos conselheiros presidenciais, que desejavam seu afastamento desde sempre mas participavam da cena teatral de tripulantes do mesmo barco.
Novamente os banqueiros retomaram a mão, Roberto Setúbal reergueu numa entrevista a liderança da já desgastada concertação na proximidade do perigo. Dilma começou de novo a se mexer. Assistiu a sucessivas tentativas de desestabilização do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, entrando na onda dos alquimistas palacianos, sem saber, ou querer, debelar boatos. Quando o fez, foi, como é sempre, um gesto tardio. Dilma cumpre o script das salas contíguas: entregou cargos que não entregava nos acordos do vice-presidente e liberou uma dinheirama de emendas que relutava pagar, recuou no pagamento do décimo-terceiro de aposentados, avalizando assim as rasteiras a Temer e Levy, decidindo ampliar espaços dos ministros que forçam ajuste pelo aumento de impostos e não corte de gastos.
Mas a presidente não deixa isso claro. Ninguém poderá dizer que ela tem finalmente uma política. Dá a entender a Lula que mudou, mas não mudou. Parece acolher as teses de um, mas toca as do outro. É o governo quem sabota o governo.
Para manter o moral, na hipótese de persistência da crise política, Dilma levantou a cabeça e foi à luta na armação de uma ofensiva. Michel Temer havia deixado claro que sua retirada visava romper o cansaço com a humilhação que lhe impingiram ministros petistas do Palácio, que o desautorizavam e executavam acordos diferentes dos por ele firmados. Na roda de conselheiros, porém, prevaleceu e ainda vigora o registro, para o partido, para o público e para o governo, de tentativa de golpe do vice, que queria o impeachment para assumir a presidência. Dilma disse não ter acreditado na versão, mas fez uma frase que denunciou seu conselheiro: "Temer não falou aquilo (o vice chamara por "alguém" para unir o país) com a intenção que lhe atribuíram". Só faltou dar o nome de quem atribuiu. Puro pretexto.
Na operação mais recente Dilma lançou a ideia de fazer estudos sobre uma reforma administrativa com a extinção de dez ministérios, o contrário do que pregou há menos de um ano, na campanha eleitoral. Uma reforma no momento tão fantasiosa quanto a Agenda Brasil do Senado Federal. Seria acompanhada da demissão de mil titulares de cargos comissionados. Reações imediatas, recuos imediatos: Dilma disse que não sabe quem será morto, ou mesmo se "alguém" será morto. A reforma é manobra diversionista. Pacote acompanhado, no mesmo dia, de um também tardio mea culpa por não ter sabido avaliar a crise econômica.
Dilma não está fazendo nada que o ex-presidente Lula não lhe tenha sugerido quando saiu horrorizado de um encontro com o ex-presidente José Sarney e os senadores Renan Calheiros, Eunicio Oliveira, Romero Jucá, Eduardo Braga e Jader Barbalho. Lula lhe contou as queixas que ouvira sobre a atuação do serpentário petista do Palácio do Planalto. Indicou atitudes e ela prometeu mudar. Depois disso, e das manifestações, Lula se afastou.
Com o veredito de que seu futuro é garantido mas na oposição, Lula está olhando o governo de longe. Decidiu permanecer recolhido por um tempo, à espera de clareza e resultados. Nem que seja, como definiu um colaborador, "o empate". Não precisa haver a goleada que ele próprio acredita ter dado no governo. Mas não precisa também degradar-se. Buscar apoio na dissidência da Força Sindical, como o fez o ministro Miguel Rossetto, em rapapé a Juruna, em São Paulo, foi considerado um marco do fim de linha do governo Dilma por amigos do ex-presidente Lula.
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