• PT frágil, revisão do PSDB e vitória de Picciani abrem rota
- Valor Econômico
Depois de marcar um dos maiores cismas do PT no início da gestão Luiz Inácio Lula da Silva, a reforma da Previdência sinaliza que o governo de sua sucessora pode se valer de um momento de fragilidade do partido e de seu principal mentor para escrever mais um capítulo.
Em 2003, a cobrança dos inativos foi a certidão de nascimento do PSOL. Treze anos depois, o Palácio do Planalto aposta que a fixação de uma idade mínima para a aposentadoria pode postergar a certidão de óbito do governo Dilma Rousseff porque estaria alicerçada no consenso que dará as cartas na sucessão de 2018.
Sinal disso é a inflexão do PSDB. A disposição do partido de colaborar com a pauta fiscal converge com a percepção do quanto pior, pior. Sem corda à vista, parece não haver saída senão escalar as paredes do poço. Qualquer tentativa de forçar o alçapão é vista com desconfiança.
Diz-se que a reforma pouco afeta o (des)equilíbrio fiscal da gestão dilmista mas contribui com as expectativas. Ao abraçar a reforma da Previdência, Dilma mostra que, para permanecer no cargo, precisou dar início a um governo de transição que ainda não tem partido, mas já esboça uma pauta.
A presidente move-se por um traçado distinto daquele que, no pós-mensalão, levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a enfiar o pé no acelerador. Primeiro porque o cofre está quase vazio. Depois porque quem está organizado não tem se mostrado capaz de se movimentar. E quem se movimenta parece não seguir comandos organizados.
Lula só pôde se valer de seus exércitos sindicais para falar grosso com a oposição porque o mensalão aconteceu oito anos antes de junho de 2013. Dilma se vale do refluxo sindical, mas só vai conseguir emplacar essa reforma se conseguir formatar um discurso para as muitas planilhas apresentadas ontem no fórum da Previdência.
Tentará responder à acusação de que afronta direitos adquiridos com o discurso de que pretende 'alongar a expectativa de direito'. Não há grandes expectativas em relação à aprovação das mesmas regras para homens e mulheres, mas se cultiva a esperança de que medidas para combater a 'indústria da viuvez' tenham receptividade.
Para passar o coração da reforma, a fixação de uma idade mínima, tenta se cativar o jovem que entra - ou quer entrar - no mercado de trabalho e arcará, sem reforma, uma fatura maior.
É quase tão difícil acertar no tom desse discurso quanto andar no meio das fileiras que se postaram ontem em lados opostos no fórum criminal da Barra Funda sem ser atingido, mas a presidente parece não ter muitas alternativas.
Não poderá ser acusada de ir contra seu antecessor. Além de ter conduzido a mais radical reforma da Previdência desde a redemocratização, Lula avisou ao seu exército de blogueiros em janeiro que se a expectativa de vida passou de 50 para 75 anos desde que a Previdência foi instituída, cabe ao país reformá-la de vez em quando.
Sem poder acusar a presidente de trair a herança lulista, o PT tampouco poderá apelar a sua principal liderança para se confrontar à investida governista por uma reforma danosa àquilo que, um dia, se chamou de 'bases petistas'.
Passada a encenação do fórum instalado hoje, o partido terminará enquadrado pelo governo. Em 2003, Lula dobrou o PT com o discurso de que a capitalização da previdência complementar financiaria uma nova etapa do desenvolvimento nacional. Muitos deles seriam convencidos da justeza de seu voto ao ver instalados correligionários em postos chave dos fundos de pensão. O novo capítulo da reforma é apresentado num momento em o mercado de previdência complementar emperrou, mas parte da nomenclatura petista dos fundos de pensão se transformou em personagem de inquéritos policiais.
Mais difícil do que enquadrar o PT será dobrar um Congresso que não entregou reformas de bandeja nem para governos mais encorpados como os de Lula e de Fernando Henrique Cardoso. A missão deve ser facilitada pela vitória do deputado Leonardo Picciani (RJ) na disputa pela liderança do PMDB, mas terá ponteiros a acertar no Senado se o presidente daquela Casa, Renan Calheiros, se tornar réu no Supremo.
Olho nos cartórios
À esteira do ceticismo em torno das chances de aprovação da CPMF brotam as mais improváveis fábricas de dinheiro. A última delas teve como porta-voz o vice líder do PSD, Paulo Magalhães (BA), na reunião de parlamentares com a presidente. A proposta de emenda constitucional, da qual o deputado é relator na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, submete a remuneração nos cartórios ao teto dos servidores públicos.
A proposta é fundamentada em levantamento do Conselho Nacional de Justiça junto a 13.233 cartórios (95,7% do total) do país que apurou uma receita semestral de R$ 6 bilhões. Anualizada, a arrecadação corresponde a meia CPMF. A proposta não adianta como, uma vez fixada a remuneração dos notariais, a receita dos cartórios iria parar nos cofres da União. Um terço desta receita, em média, vai parar no custeio dos tribunais de justiça e na fazenda dos Estados.
Obrigados, desde a Constituição de 1988, a se submeter a concurso público, os donos de cartório são patrocinadores de outra PEC, que recebeu guarida na gestão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para isentar do concurso aqueles que já detinham a concessão do cartório quando a Carta foi promulgada.
A proposta que mede forças com a tropa de Cunha para limitar os ganhos dos donos dos cartórios é relatada pelo filho de um irmão mais velho do falecido senador Antonio Carlos Magalhães. Paulo Magalhães tem orbitado em torno do PT baiano desde que rompeu com o sobrinho Antonio Carlos Magalhães Neto, atual prefeito de Salvador, e deixou o DEM na companhia de seu filho, que hoje está na linha de frente da oposição na Câmara dos Vereadores da capital baiana.
Foi o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, quem, além de emplacar como líder do PT o ex-ministro Afonso Florence (BA), reforçou as bases do governo Dilma Rousseff com uma costela do carlismo.
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