• STF concordou com tese, defendida também pelo juiz Sérgio Moro, que conduz ações da Lava Jato, segundo a qual não é preciso aguardar julgamento de todos os recursos para mandar condenados cumprirem pena
Beatriz Bulla - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) alterou a jurisprudência adotada até hoje no País para permitir a execução de pena a partir de uma decisão judicial de 2ª instância, portanto antes de esgotados todos os recursos propostos pela defesa. Por 7 votos a 4, um réu condenado a prisão pode ser encaminhado à penitenciária depois da confirmação da sentença do juiz de primeiro grau por um Tribunal de Justiça. Antes da decisão da Corte, a pena só começaria a ser cumprida pelo condenado após o chamado trânsito em julgado da condenação, podendo chegar aos Tribunais Superiores.
A decisão foi tomada durante discussão de um habeas corpus impetrado pela defesa de um condenado a 5 anos e 4 meses de prisão por roubo qualificado. A sentença de primeiro grau foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que determinou a prisão do réu. Os advogados entraram com habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça e, posteriormente, no Supremo pelo direito do condenado recorrer em liberdade.
Em 2009, o próprio STF fixou a tese de que condenados pela Justiça possuíam o direito de recorrer da sentença em liberdade até que não haja possibilidade de novo recurso. A nova composição da Corte, contudo, possibilitou a reversão no entendimento da Corte. A decisão se aplica ao caso concreto discutido no habeas corpus, mas ficou firmada como jurisprudência da Suprema Corte.
O relator do caso, ministro Teori Zavascki, destacou que o cumprimento da pena após a decisão em segundo grau é uma forma de “harmonizar” o princípio da presunção de inocência com a efetividade da justiça. “Não se mostra arbitrária, mas inteiramente justificável, a possibilidade de o julgador determinar o imediato início do cumprimento da pena, inclusive com restrição da liberdade do condenado, após firmada a responsabilidade criminal pelas instâncias ordinárias”, votou Zavascki.
Seguiram Teori Zavascki os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Edson Fachin, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Para os magistrados, o duplo grau de jurisdição, com a confirmação da sentença pelo Tribunal de Justiça, “inverte” o princípio da presunção de inocência.
Morosidade. No julgamento, os ministros destacaram ainda que a medida é uma forma de combater a morosidade da justiça. Fachin avaliou que o trânsito em julgado dos processos, ou seja, a sentença definitiva, depende “em algum momento da inércia” da parte perdedora. “Há sempre um recurso”, afirmou, sobre o sistema recursal penal do País. O ministro Luís Roberto Barroso afirmou que “nenhum país” exige mais do que dois graus de jurisdição para dar efetividade a uma decisão criminal. “Isso restabelece o que perdemos no Brasil que é o prestígio e a autoridade das instancias ordinárias. No Brasil, o primeiro grau e os tribunais de justiça passaram a ser tribunais de passagem”, completou Barroso.
No ano passado, o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela condução da Operação Lava Jato na Justiça Federal em Curitiba, saiu em defesa de projeto de lei para permitir o cumprimento da pena antes do final do processo. Em visita ao Senado para defender a tese, Moro chegou a criticar o que chamou de “sistema de recursos sem fim”.
Foram contra a alteração na jurisprudência os ministros Rosa Weber, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Para Marco Aurélio, a decisão “esvazia o modelo garantista. “Reconheço mais: que a justiça é morosa, que o Estado em termos de persecução criminal é moroso. (...) Reconheço que a época é de crise maior, mas justamente nessa quadra de crise maior é que devem ser guardados parâmetros, princípios, devem ser guardados valores”, defendeu o ministro.
O decano da Corte, ministro Celso de Mello, disse que é “frontalmente incompatível com o direito a ser presumido inocente a execução antecipada da sentença”. Ele afirmou que 25,2% dos recursos extraordinários que chegam ao Tribunal com questionamento a sentença criminal culminam em absolvição. “Se não respeitarmos a presunção de inocência, estaríamos tratando como se culpados fossem aqueles que afinal nesta Suprema Corte resultaram absolvidos”, afirmou o ministro.
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