Por Arícia Martins e Robson Sales | Valor Econômico
SÃO PAULO E RIO- Demanda em queda livre associada ao comportamento atipicamente benigno dos alimentos no fim do ano segurou repasses em dezembro e ajudou a inflação a ficar dentro do teto da meta de inflação do Banco Central em 2016, de 6,5%. Com alta de 0,30% no mês, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrou o ano em 6,29% - menor taxa anual desde 2013, quando o indicador subiu 5,91%. Foi a taxa mais baixa para dezembro desde 2008.
O dado, divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, veio também abaixo da projeção média esperada pelos analistas de mercado, que era de 6,34%, e foi visto como o vetor final para que o Banco Central acelerasse o corte na taxa básica de juro para 0,75 ponto na reunião encerrada ontem à noite.
No começo do ano passado, o consenso do mercado esperava um IPCA no ano acima de 7%. Segundo economistas, a conjuntura formada por desemprego elevado e renda em queda levou à descompressão mais rápida que o esperado dos serviços nos últimos meses. O conjunto que reúne preços como aluguel, cabeleireira e empregada doméstica desacelerou para 6,47% em 2016, vindo de 8,19% em 2015. Foi a alta mais modesta para o grupo em seis anos. O recuo deve continuar em 2017.
Não menos importante do que o efeito da atividade fraca sobre a inflação, a parte de alimentação não pressionou o IPCA em dezembro, ao subir apenas 0,08% no mês. Com a sazonalidade mais elevada, esses preços devem acelerar mais o início deste ano, mas não a ponto de atrapalhar o movimento de desinflação.
Como em janeiro de 2016 o IPCA havia aumentado 1,27%, e neste ano as projeções estão por volta de 0,50%, o acumulado em 12 meses pode ficar abaixo de 6% já no primeiro mês de 2017. Para este mês, a LCA projeta alta de 0,50% no IPCA, o que levaria o indicador acumulado em 12 meses a recuar para 5,48%. O índice não sobe menos do que 6% em 12 meses desde fevereiro de 2014.
"O cenário mudou bastante do começo do ano para agora", diz Rodrigo Alves de Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda, referindo-se ao impacto da atividade fraca sobre a inflação de serviços, que demorou para aparecer, mas também à trajetória mais tranquila do câmbio e à moderação na inflação dos alimentos. Para Melo, o IPCA tem "grandes chances" de terminar 2017 no centro da meta, de 4,5%.
Na passagem mensal, os serviços avançaram de 0,42% para 0,65%, aumento sazonal e bastante influenciado pelo salto de 26,3% das passagens aéreas, avalia Melo. Já a inflação subjacente dos serviços - núcleo criado pelo Banco Central que exclui turismo, serviços domésticos, cursos e comunicação - desacelerou no período, de 0,43% para 0,35%, fechando o ano em 6,27% nos cálculos do economista.
Para Angelo Polydoro, do banco Brasil Plural, outros preços foram influenciados pela menor demanda em dezembro. Os artigos de vestuário subiram apenas 0,32% no mês, ante 1,15% há um ano. Dentro do grupo de artigos de residência, que recuou 0,31% na medição atual do IPCA, ele menciona as deflações nos preços de TV, som e informática e de consertos e manutenção, de 2,15% e 0,12%, respectivamente. "Com o desemprego elevado, quem oferece serviços de conserto não vê espaço para reajustar seus preços", observa Polydoro. Além disso, a oferta no setor aumentou, porque há mais pessoas fazendo bicos, diz.
Segundo David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch (BofA), o IPCA subiu menos do que o previsto pelo quinto mês consecutivo. "A inflação continua desacelerando, dando tranquilidade para o BC intensificar o processo de corte de juros adiante", diz Beker, para quem o IPCA vai desacelerar a 4,7% em 2017.
Fabio Romão, da LCA Consultores, afirma que o carro-chefe da descompressão inflacionária é a variação mais baixa dos alimentos, que foram afetados no fim de 2015 e início de 2016 por problemas climáticos associados ao El Niño. Agora, com a transição para o La Niña moderado, as condições melhoraram, diz, o que anuncia também alta dos alimentos mais fraca do que a sazonalidade para janeiro, de 0,51%.
Alimentos e bebidas subiram, em média, 8,62% no ano e responderam por quase 35% da alta do IPCA em 2016, maior impacto do período. A variação foi menor que a registrada em 2015, quando o grupo subiu 12,03%. Para 2017, a expectativa é que a safra cresça 16%, o que deve diminuir a pressão dos alimentos no custo de vida, apontou Eulina Nunes dos Santos, coordenadora dos índices de preços do IBGE.
Mesmo com alívio na parte de alimentos e dos serviços, Romão avalia que o IPCA encerrá 2017 com alta de 5,3%, ainda acima do centro da meta. Os preços administrados por contrato, que devem avançar de 5,5% para 6,4%, impedem que o indicador fique mais perto do alvo, embora o cenário inflacionário continue bastante favorável, pondera.
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