- O Estado de S.Paulo
O atual Congresso Nacional é incapaz até do cálculo eleitoral mais comezinho
O adiamento da votação da reforma da Previdência não mostra só a impossibilidade de o atual Congresso desempenhar um papel minimamente responsável. Isso já se sabia. O mais assustador é a completa falta de cálculo político por parte dos congressistas, incapazes da aritmética eleitoral mais comezinha.
Deveria ser óbvio para parlamentares da chamada base aliada que é melhor pedir votos para a sua reeleição num país com crescimento mais acelerado, uma retomada mais consistente do emprego e confiança interna e externa restabelecida.
Mais: parece óbvio que eles deveriam querer se livrar desse pepino o quanto antes, para não avançar com uma pauta desgastante pelo ano eleitoral adentro, ou até correr o risco de adiar a discussão para a próxima legislatura.
Partidos de oposição aproveitaram a covardia dos “aliados” do governo Michel Temer para coalhar Brasília de faixas com dizeres do tipo “reforma da Previdência: quem vota não volta”.
Acoelhados, deputados governistas não devem nem ter se dado ao trabalho de checar se essa afirmação é verdadeira ou só um trocadilho fraco.
Se tivessem ido pesquisar, veriam que não é assim. Estudo do economista e consultor legislativo do Senado Pedro Nery, disponível no site da Casa, analisa o desempenho eleitoral de deputados federais que se candidataram à reeleição em 1998, meses depois da aprovação da primeira reforma da Previdência, no governo Fernando Henrique Cardoso.
O texto foi aprovado com 345 votos favoráveis, 152 contrários e 3 abstenções. Dos 500 votantes, 434 foram candidatos a novo mandato. A proporção de reeleitos foi maior entre os que votaram a favor da reforma (69%) do que entre quem votou contra (50%).
Não é possível dizer que os parlamentares foram reeleitos graças ao seu posicionamento frente ao tema, e o próprio estudo deixa isso bem claro. Outras variáveis como execução de emendas, ser de partidos próximos ao governo (FHC foi reeleito) e o tempo de TV e dinheiro de campanha certamente influíram mais no sucesso dos reeleitos.
Mas é possível aferir dessa estatística que o posicionamento a favor da mudança nas regras previdenciárias não foi, como quer fazer crer o lobby contrário à reforma hoje, um fator de repulsa do eleitor. Em suma: que quem vota pode, sim, voltar. Por isso fica ainda mais patética a posição de parlamentares de partidos como o PSDB – cujo DNA reformista era um dos poucos traços distintivos dentro da geleia geral partidária brasileira – frente a um tema tão crucial para o País e para seu próprio candidato à Presidência.
Geraldo Alckmin assumiu o comando do partido e conseguiu, ao menos, que a Executiva Nacional aprovasse um fechamento de questão a favor da reforma. Isso lhe garante um discurso na campanha e aumenta a percepção de que sua eleição contribuiu para ao menos reduzir a divisão interna, já que unir o ninho tucano é missão impossível.
Mas um fechamento de questão em que já se diz de antemão que não haverá sanções a quem votar contra, e decidido tão tardiamente, acabou não tendo efeito nenhum.
Ao se deixarem sequestrar por uma pauta que é sobretudo da elite do funcionalismo público, partidos da base governista cometem ainda a ingenuidade de achar que podem disputar espaço eleitoral nesse nicho com o PT, que tem laços históricos com essas corporações.
Tantos erros políticos mostram que, além de ser de longe o mais desaparelhado em termos de “cabeças” – pouco importa se pretas ou brancas, desde que não sejam ocas –, o atual Congresso é também o mais covarde da história. Essa covardia vai custar muito ao País. E pode lhes custar bastante em termos de êxito eleitoral. Seria o único ponto positivo, vamos torcer.
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