- O Globo
Quando Michel Temer anunciou a intervenção federal na segurança do Rio,
em fevereiro de 2018, o então deputado Jair Bolsonaro cutucou: “Temer já roubou
muita coisa, mas o meu discurso ele não vai roubar”. Quando o ex-presidente foi
preso pela primeira vez, em março de 2019, o capitão sorriu: “Cada um tá fazendo
por merecer”.
Nas palavras de Bolsonaro, a prisão de Temer era a consequência de um
modelo que ele prometia não repetir. “O que levou a isso é aquela velha
história de Executivo muito afinado com o Legislativo, onde a governabilidade
vem em troca de cargos. São ministérios, são estatais, são bancos oficiais”,
condenou.
Um ano depois, o presidente deixou para trás a pregação contra a “velha
política”. Loteou a máquina em troca de apoio, barganhou com os suspeitos de
sempre e fez a dança do acasalamento com o centrão. Agora um dos padrinhos da
união será premiado com uma viagem oficial ao Líbano.
Bolsonaro convidou Temer a chefiar a comitiva brasileira em Beirute. O
ex-presidente deve embarcar amanhã cedo em avião da FAB. Antes da viagem, um
constrangimento: para deixar o país, ele precisou pedir autorização ao juiz
Marcelo Bretas, que o mandou duas vezes para a cadeia.
Em 2017, o capitão votou duas vezes pelo afastamento do antecessor.
“Pelo fim da corrupção”, discursou, ao apoiar a segunda denúncia do procurador
Rodrigo Janot. Em 2020, ele busca conselhos com quem chamava de ladrão. “Meu
enviado especial”, cortejou, em videoconferência no domingo.
Temer é mestre na arte da sobrevivência política. Delatado e gravado no
subsolo do palácio, conseguiu resistir no cargo. Nem a imagem de um assessor
correndo com uma mala recheada foi capaz de derrubá-lo. Agora ele dá lições a
Bolsonaro, enrolado com cheques para o primeiro-filho e a primeira-dama.
A viagem ajuda o ex-presidente a lustrar a biografia, mas não resolve seus problemas com a Justiça. Absolvido num processo em Brasília, ele ainda é réu em cinco ações por corrupção, peculato e lavagem de dinheiro.
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