Dadas certas condições, Selic fica zerada em termos reais até meados de 2022
A taxa básica de juros da economia, a Selic, vai ficar abaixo de
zero ou perto disso até meados de 2022, na perspectiva de quem olha o futuro
neste agosto de 2020 (isto é, em termos reais, descontada a inflação). É o que
se depreende da exposição de motivos do Banco Central para sua decisão da
semana passada, documento chamado de Ata do Copom (Comitê de Política Monetária
do BC). Na quarta passada, o Copom baixou a
Selic de 2,25% para 2% ao ano.
Como todo mundo deve estar farto de saber, o rendimento daquela
aplicação de renda fixa comum e da caderneta de poupança ficarão também perto
ou abaixo de zero. É um problema para os pelo menos remediados, que têm a boa
sorte de ter algum dinheirinho de sobra.
É uma questão maior também: para onde vai o dinheiro nesta
situação, inédita no Brasil, de inflação baixa e juro real zero (ou inédita
pelo menos desde quando o país tem um mercado financeiro)?
Taxas de juros baixas não levam
necessariamente empresas ou empreendedores em geral a levantar dinheiro para
criar ou expandir negócios, como se sabe. É ainda menos provável que tenham tal
efeito em uma economia que, de uma recessão profunda, passou a uma quase
estagnação e ainda tinha enorme capacidade ociosa quando caiu nesta recessão
pandêmica. Pior, a gente não tem muita certeza do que será a política econômica
em, digamos, seis meses, isso em um país sujeito a choques políticos
praticamente anuais desde 2013, de resto.
Por exemplo, no mesmo dia em que o BC
tratava de tantas incertezas e de quais seriam as condições de estabilidade da
taxa de juros, alguns assessores econômicos de Paulo Guedes debandavam,
como se confirmava no começo da noite desta terça-feira (11), quando eram
escritas estas linhas. Estavam aparentemente insatisfeitos com o ritmo de
“reformas”.
No caso de a política econômica não desmoronar, a retomada de
investimentos (de um crescimento razoável do PIB) ofereceria também, claro,
possibilidades de aplicações financeiras mais animadoras (embora de risco
maior), além de uma perspectiva mais fundamentada para os voos da Bolsa. Mas
não dá para dizer, por ora, que alta do preço das ações seja bolha.
Simplesmente não sabemos no que vai dar este ambiente de juro real zero. O que
farão os fundos de pensão, de previdência privada e seguradoras, que precisam
de retornos regulares e estáveis?
Além do mais, pessoas ou empresas podem também “guardar o dinheiro no
colchão” (naquele fundo de renda fixa ou em títulos no Selic, que perdem um
pouco da inflação, mas têm risco muito baixo): nem gastam nem investem. Podem
procurar “ativos reais”, como imóveis.
Podem ainda achar que o teto de
gastos e esse arranjo todo mal-ajambrado de política econômica vai para o
vinagre e, assim, investir em ativos denominados em dólar. No entanto, em tese,
dados os “fundamentos” macroeconômicos e na ausência de sacolejos maiores no
Brasil e no mundo, a perspectiva agora seria de ligeira valorização do real. Em
tese. Seria.
Em uma atitude também inédita, o BC
deu uma orientação do que pretende fazer no futuro (“forward guidance”) caso
certas condições mínimas sejam satisfeitas (o teto de gastos não cai, continuam
as “reformas”, a inflação não se aproxima rapidamente da meta em 2021 ou 2022):
a taxa básica fica onde está ou até cai um tico.
Apenas agora vai se aprender o que se
faz com dinheiro a juro zero e/ou estável no Brasil. “Zero” e “estável” se a
política econômica não desmoronar, claro.
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