Seus
seguidores estão ficando impacientes
Para
o gosto do presidente Jair Bolsonaro, a quinta-feira 17 de dezembro até que
começara bem. Em cerimônia no Palácio do Planalto, ele deu posse ao novo
ministro do Turismo, Gilson Machado, líder de uma banda de forró em Pernambuco,
e sanfoneiro que costuma tocar o instrumento nas lives semanais do presidente
no Facebook. Uma vez até cantou a Ave-Maria.
O
que disse Machado no seu discurso soou como música aos ouvidos de Bolsonaro e o
deixou feliz a poucas horas de ter que voar para inauguração de obras em Minas
Gerais e na Bahia. Refratário, como seu chefe, a medidas de isolamento social,
Machado defendeu que festas de fim de ano reúnam ao menos 300
pessoas. Assim as aglomerações seriam evitadas.
“A gente tem que viver a vida, não morrer por antecipação”, argumentou o ministro, e recebeu aplausos. Em seguida, derramou-se em elogios a Bolsonaro: “O senhor está recuperando a autoestima do povo” (mais aplausos). “Aonde o senhor vai, o povo o aclama” (nesse momento, Bolsonaro sorriu). A cerimônia foi curta. O dia seria estafante para o presidente, e de fato foi.
Ele ainda estava em Jacinto, município de Minas Gerais, para o lançamento da pedra fundamental da implantação e pavimentação da BR-367, quando começou a receber notícias que o indignaram. O Supremo Tribunal Federal decidira que a vacinação contra a Covid-19 seria obrigatória. E também que governadores e prefeitos poderão impor restrições a quem não se vacinar.
Em
Porto Seguro, na Bahia, segunda escala da viagem, Bolsonaro ficou sabendo que
uma liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski autorizara Estados e
municípios a comprar vacinas registradas por agências sanitárias de outros
países. Foi em Porto Seguro que Bolsonaro resolveu passar recibo do seu
desconforto. Sem referir-se às notícias, discursou:
–
Se o cara não quer ser tratado, que não seja. Eu não quero fazer uma
quimioterapia e vou morrer, o problema é meu, porra.
Ao
desembarcar de volta a Brasília, seu humor só fez piorar. Foi quando conheceu
trechos dos votos dos ministros do Supremo no julgamento das ações sobre a
vacinação. Todos, à exceção do único ministro indicado por ele para o tribunal,
Kássio Nunes Marques, bateram de frente com o que Bolsonaro pensa, fala e
repete à exaustão país afora, dia sim e o outro também.
“A
preservação da vida, da saúde individual ou pública, em país como Brasil com
quase 200 mil mortos pela Covid-19, não permite demagogia, hipocrisia,
ideologias, obscurantismo, disputas eleitoreiras e ignorância” (Alexandre de
Moraes). “O egoísmo não é compatível com a democracia. A Constituição não
garante liberdade a uma pessoa para ela ser egoísta” (Cármen Lúcia).
Para
amargar ainda mais o dia de Bolsonaro, a Câmara endossou decisão do
Senado e rejeitou ampliar o repasse de recursos do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica para escolas ligadas a igrejas. E, nas redes
sociais, seguidores dele ocuparam-se em criticá-lo a pretexto de qualquer coisa
– uma delas, o não pagamento este ano da 13ª parcela do Bolsa Família.
Bolsonaro
jogou a culpa no deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara. Que
retrucou chamando-o de “mentiroso”. O presidente só foi dormir depois de
responder pessoalmente aos ataques dos que antigamente se limitavam a lhe dar
razão em tudo ou em quase tudo:
–
Impressionante, os caras descem a lenha em mim. Lógico que a esquerda bate
palma para essa direita burra, direita idiota. Bateram palmas para vocês. Vocês
não sabem, não interpretam, não conseguem saber o que foi votado e descem o
cacete. Não fica agindo como papagaio, repetindo o que um idiota escreve.
A
certa altura, cairá a ficha da maior parte dos brasileiros e eles descobrirão
que o presidente acidentalmente eleito lhes fez muito mal. O risco é de que tal
momento de iluminação só se dê depois de ele ser reeleito daqui a dois anos.
Seriam mais quatro anos perdidos – e a que preço? Preservar o meio ambiente não
lhe interessa como já demonstrado. Tampouco educação e cultura.
Reforma do Estado foi promessa para atrair o voto dos liberais. A combater a corrupção, prefere aliar-se a políticos corruptos. Segurança pública resume-se a facilitar o acesso a armas – e os milicianos agradecem. Enfrentar a pandemia é deixar o vírus livre para infectar o maior número de pessoas. Vidas não importam porque todos haverão de morrer um dia, e ele não é coveiro.
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