Uma
história que pare em pé é o que o mercado quer ouvir
As
eleições de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco desviaram os olhos dos protagonistas
do mercado para o lado direito da Praça dos Três Poderes: é sobre o presidente
Jair Bolsonaro que recaem todas as atenções e é dele que se espera palavras e
atitudes que mantenham o país dentro da canaleta cavada pela praça financeira.
Ou
o ímpeto de agradar o mercado partirá de Bolsonaro, ou não haverá nada. É dura
a vida: fica agora uma missão difícil para o Bolsonaro e o mercado. O primeiro
terá a tarefa de ser um guardião da racionalidade econômica e o segundo
precisará acreditar nisso.
Para
gente que opera forte na Faria Lima, Lira e Pacheco só representam ganho em
relação a Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre por serem menos conflitivos em relação
ao presidente. Deixam, portanto, a pista livre para que Bolsonaro demonstre se
tem algum compromisso com a agenda liberal e de reformas ou não. No tempo de
Maia era admissível pensar em uma pauta reformista com o presidente jogando
contra ou até atrapalhando, e a votação da emenda da Previdência mostrou isso.
Com Lira essa hipótese é inconcebível.
O
presidente ganhou pontos com a banca no fim do ano passado, quando deixou o
auxílio morrer. Outros eram os tempos, porém. A popularidade de Bolsonaro
estava em alta, a segunda onda da covid-19 ainda não tinha começado e a eleição
das Mesas não estava definida.
É com o dedo no gatilho, portanto, que operadores assistem a discussão sobre a recriação do auxílio emergencial. A depender da condução do tema, pode ser desencadeada uma queda de confiança, com retirada de capitais, depreciação da moeda, baixa na Bolsa etc.
Aceita-se
como um fato consumado a necessidade de se estabelecer uma ajuda temporária de
R$ 200. É quase certo, contudo, que este valor vai subir quando chegar ao
Parlamento. Ontem o presidente confirmou que a nova injeção de óleo canforado
começa em março, dura “três ou quatro meses”, mas nada falou sobre o montante.
Aguarda-se
com ansiedade que Bolsonaro compre a tese de negociar com o Congresso o
estabelecimento de contrapartidas, que necessariamente serão impopulares. A PEC
do Orçamento de guerra, com dispositivos de corte de gastos, pode entrar na
estratégia em que o governo entrega à vista a despesa social, pagando o auxílio
já, em troca de controle de gastos à prazo, com a aprovação de medidas legislativas.
Não
é propriamente um ajuste, é uma sinalização, mas bastaria isso para segurar em
um primeiro momento o descontrole das expectativas frustradas. Como disse um
gestor de fundos, seria “uma historinha que para em pé”. O problema é não ter
nem isso, e não se sente no Congresso Nacional garantia de que isso haverá. Aí
agentes do mercado financeiro podem chegar à desagradável conclusão que Rodrigo
Maia podia se estapear com os bolsonaristas, mas entregava mais para a banca.
Lira é mais silencioso, porém pode ser menos efetivo.
Sergio
Moro
O
triste fim da Lava-Jato prenuncia a provável suspeição de Sergio Moro no STF e
o restabelecimento da elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Petista de longa data e ator privilegiado de toda voragem política que
convulsionou o Brasil por uns anos, o ex-ministro da Justiça José Eduardo
Martins Cardozo assiste de camarote.
“A
estrutura de combate à corrupção não nasceu com a Lava-Jato e nem terminou com
ela. Assim como seria ingenuidade achar que o abuso ao estado de direito
começou e terminou ali”, comentou.
Cardozo
foi ministro da Justiça entre 2011 e 2016. À frente da pasta, viu a Lava-Jato
nascer e não interferiu em seu funcionamento. Dá a entender que não havia
condições políticas para tal. “Se tivéssemos interferido na Polícia Federal
como Bolsonaro fez no ano passado, teríamos apressado o processo de
impeachment. Ficaria configurado o crime de responsabilidade”, afirmou. Naquele
tempo, na visão de Cardozo, “ as abusividades tinham grande apelo popular”.
O
avanço de Bolsonaro sobre a Polícia Federal foi possível, segundo o petista,
porque se deu em uma circunstância de perda de expressão do Moro.
“A
ida de Moro para o Ministério da Justiça foi o ponto inicial para se enxergar a
politização da operação. Até então a presença dele na magistratura bloqueava
essa percepção. O escândalo do vazamento das mensagens com os procuradores fez
o desgaste avançar”. Ou seja, Moro já estava em plano inclinado quando entrou
em colisão com o presidente. O artífice do vendaval que sacudiu o país teria
plantado, assim, a semente da própria destruição.
Como
a estrutura de combate à corrupção no Brasil não foi desarmada, na visão de
Cardozo, Bolsonaro corre riscos em sua aliança com o Centrão. Não agora, mas em
um futuro ainda remoto. “A história pode mostrar que há certas vitórias que são
derrotas. Michel Temer se blindou no Congresso, mas não se livrou de problemas
ao sair do cargo. Dilma Rousseff poderia ter problemas semelhantes se fizesse o
mesmo. Há preços que não se podem pagar”, comentou.
Ele
se refere, claramente, à barganha que o então presidente da Câmara, Eduardo
Cunha, buscou estabelecer em dezembro de 2015. Se Dilma e o PT o apoiassem no
Conselho de Ética, onde enfrentava um processo de cassação do mandato
decorrente das revelações da Lava-Jato, Cunha engavetaria o pedido de
impeachment. “O governo teria sido preservado, mas a que custo? A um custo que
cobraria sua fatura mais adiante”.
Cardozo hoje se dedica apenas à advocacia, mas opina sobre 2022. Afirma que nunca esteve tão afastado da vida partidária como agora, desde que se tornou secretário municipal de governo, na gestão Erundina, aos 27 anos. “O que o PT quer é a candidatura do Lula, isso é o ideal. Porque representa um resgate histórico. Não há como fugir dele”.
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