A
maior parte dos países tem um ‘partidão’ à esquerda e um à direita. Brasil é
caso peculiar
Partidos
políticos não surgem do nada. Na Europa, as principais siglas se formaram a
partir de núcleos já estabelecidos na sociedade civil. Os grandes partidos de
centro-esquerda – como o trabalhista inglês, o social-democrata alemão e o
socialista francês – vieram de sindicatos. Os da centro-direita nasceram de
associações religiosas ou assistenciais. Alguns deles compartilham o nome
“democrata cristão”.
Conservadores
e liberais de um lado, social-democratas e socialistas do outro. Os quatro
campos defendem valores legítimos, criando o debate que alimenta as
democracias. A maior parte dos países tem um “partidão” à esquerda e outro à
direita. Tais siglas majoritárias protegem contra os extremistas – os quais,
nos tempos da Guerra Fria, costumavam vir das esquerdas, e hoje se concentram à
direita.
O Brasil é um caso peculiar, retratado no excelente livro Partisans, anti-partisans and non-partisans, dos cientistas políticos Cesar Zucco e David Samuels. O trabalho, um dos mais citados em conferências e artigos sobre o Brasil, mostra que nossa democracia não desenvolveu uma identidade partidária forte à direita. Os autores demonstram que a disputa no Brasil é entre petismo e antipetismo. Cada uma dessas forças mobiliza entre 20% e 30% do eleitorado. Segundo Cesar Zucco, personagem do minipodcast da semana, a direita brasileira não se define por uma adesão, mas por uma rejeição. É uma direita sem partido.
Durante
a vigência da polarização entre PT e PSDB, os tucanos estiveram
perto de se tornar os “democratas cristãos” nacionais. Faltou o enraizamento
nas associações civis (o PT, como um partido europeu, viera dos sindicatos).
Além disso, o PSDB era uma sigla com origens na esquerda cultural – Chico
Buarque compôs os primeiros jingles de campanha de Fernando Henrique. Por
fim, escândalos de corrupção afastaram parte do eleitorado dos tucanos.
As
direitas se dividiram. “Cesar Maia achava que havia espaço para um partido
liberal no Brasil, e seu filho Rodrigo tentou consolidar a tarefa”, diz Zucco.
Esbarrou, no entanto, no fisiologismo atávico do DEM. O Novo tenta
ser o PSOL das
direitas, mas não consegue decidir se é situação ou oposição em relação ao
atual governo. O presidente Jair Bolsonaro,
em quem a maior parte dos eleitores à direita votou em 2018, acaba sendo o
maior fator de divisão em seu próprio campo político.
Os
liberais sabiam desde a campanha que Bolsonaro não era um deles – o que é
reafirmado a cada troca intempestiva no comando de estatais, ou a cada soluço
autocrático. Muitos se arrependeram do voto e até fazem campanha pelo
impeachment.
Os
verdadeiros conservadores, que defendem a moderação política e o respeito às
instituições, incomodam-se com o conflito permanente que o presidente mantém
com o Legislativo e o Judiciário – e também com o hábito de criar crises do
nada, como acaba de ocorrer na troca de
comando nas Forças Armadas.
Para
Zucco, partidos com peso e convicções claras dão estabilidade ao processo
político. Uma sigla com história e um nome a zelar não se sente à vontade para
tentar aventuras. Ao contrário dos caudilhos de ocasião, que são sempre
imprevisíveis.
A direita brasileira precisa de um partido para chamar de seu. Caso contrário, como torcedor de time que caiu de divisão, ficará condenada a secar o adversário. Ou, pior, tentada a votar no primeiro que aparecer – para se arrepender depois.
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