A
demissão do ministro Fernando Azevedo e dos três comandantes militares mostrou
que a ascendência do presidente sobre as Forças Armadas é menor do que
Bolsonaro fazia crer.
O
número de militares ocupando cargos no governo sugeria um grande engajamento no
projeto bolsonarista. Um terço dos ministros de Estado é militar e, além deles,
há pelo menos 6 mil militares com cargos civis no governo, metade deles na
ativa. Sessenta e um por cento das estatais direta ou indiretamente ligadas à
União são controladas por militares.
Apesar
disso, as demissões sinalizaram um inequívoco distanciamento de Bolsonaro,
senão do meio militar como um todo, pelo menos do alto escalão.
Permanece
indefinida, porém, a extensão da influência de Bolsonaro sobre as polícias,
sobretudo sobre as polícias militares.
Desde que entrou na política, Bolsonaro tem dispensado especial atenção às demandas corporativas das polícias militares e, uma vez no governo, tem oferecido tratamento diferenciado ao setor, como se viu na reforma da Previdência e nas mudanças na PEC Emergencial. Bolsonaro tem também prestigiado formaturas e cerimônias das PMs, o que é visto como grande deferência.
Mais
preocupante é a ligação de Bolsonaro com líderes dos motins de policiais, como
os que aconteceram no Espírito Santo em 2017 e no Ceará em 2020. No começo
desta semana, não foram poucos os que quiseram que algo semelhante acontecesse
na Bahia.
Na
manhã da segunda-feira (29), antes do anúncio da demissão de Azevedo,
influenciadores bolsonaristas tentaram transformar um policial militar
amotinado em herói e mártir da campanha contra o distanciamento social.
O
cabo Wesley Góes, da PM da Bahia, teve um surto psíquico enquanto estava armado
e terminou abatido por colegas. Eduardo Bolsonaro, Roberto Jefferson, Bia Kicis
e outros bolsonaristas estiveram muito perto de insuflar um motim contra os
governadores, enaltecendo o gesto alucinado do policial, como se tivesse sido
politicamente motivado pela recusa a reprimir trabalhadores que violavam o
distanciamento social.
Nos
últimos meses, ganhou novo impulso, com apoio do governo, um projeto de lei que
dá autonomia administrativa às polícias militares, reduzindo o controle dos
governadores sobre elas. Se aprovado, o projeto de lei retiraria dos
governadores o poder de indicar os comandantes das polícias militares, que
teriam de ser escolhidos com base numa lista tríplice e contariam com mandato
fixo. Os governadores só poderiam exonerar os comandantes em circunstâncias
excepcionais, com justificativa.
A
cooptação política dos policiais militares, combinada com a diminuição do poder
dos governadores, pode oferecer a Bolsonaro a sustentação armada para o projeto
de ruptura institucional que o alto escalão das Forças Armadas não está
disposto a conceder.
Na crise política na Bolívia, que levou à queda de Evo Morales, a ação das forças policiais foi mais decisiva que a ação dos militares. É um alerta para o que pode acontecer no Brasil.
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