sexta-feira, 21 de maio de 2021

- Dora Kramer - O mal-amado

- Revista Veja

Chama atenção, e até surpreende, a rejeição ao nome de João Doria nas internas dos partidos envolvidos nas articulações do chamado centro

As forças políticas que procuram se posicionar como alternativa às candidaturas de Luiz Inácio da Silva e Jair Bolsonaro não se impressionam com o retrato das pesquisas em que os dois aparecem como os preferidos do público.

Seguem na construção de um projeto unitário. Embora ainda falte o candidato que querem, surge entre eles um consenso ainda não exposto de público sobre o nome que não querem: o do governador João Doria. Antes de entrar no relato sobre a reprovação ao mais vistoso oponente do presidente da República, vamos à atualização do contexto de atuação do grupo.

O chamado centro considera que a predileção nas pesquisas reflete grau de conhecimento, não necessariamente faz um retrato fiel do quadro eleitoral para 2022. Portanto, os cerca de 50% que dizem preferir não votar em Lula nem em Bolsonaro sinalizam a existência de espaço para opções a essa dicotomia. Diante disso, o dito polo democrático prossegue no esforço e já delineia as próximas etapas.

São duas, de imediato. Manifestações públicas de diversas lideranças em prol da viabilidade eleitoral do projeto alternativo são um passo. O outro, a produção de fatos políticos para estimular a ideia de que um caminho do meio é possível e atrair o contingente de eleitores que não se enquadram nem entre os adeptos do petismo nem entre os do bolsonarismo.

A ansiedade geral é para a apresentação de um nome que materialize, vocalize e capitalize esse sentimento existente, mas ainda claramente difuso. Isso não existe no momento nem deverá existir antes da entrada das eleições na cena da vida real dos brasileiros. Vale dizer, no início de 2022. A despeito dessa indefinição, dirigentes, parlamentares, governantes e pretendentes de partidos como PSDB, DEM, Cidadania, Podemos, MDB e PSD já conversam em torno de um cenário de candidaturas.

Consideram que Luciano Huck e Sergio Moro já pularam fora desse barco. O apresentador e o ex-juiz, segundo essas análises, não concorrerão, mas podem ter papel importante como apoiadores devido à popularidade de ambos. João Amoêdo, na interpretação deles, não tem viabilidade eleitoral.

“O centro se move para isolar Doria, vê Huck e Moro fora do jogo e acha que Ciro seguirá em faixa própria”

Não contam mais com Ciro Gomes, pois é candidato consolidado no PDT, corre em faixa própria na montagem interna e na apresentação externa da campanha. Contratou marqueteiro e iniciou a divulgação de vídeos em que aparece com a imagem suavizada, num sinal claro de que não desiste. Isso fere um dos pré-requisitos da articulação do centro, que é a disposição individual de se curvar à decisão coletiva.

O governador de São Paulo é um capítulo à parte. Não só por não ter conseguido ainda transformar em ativo eleitoral o êxito no fornecimento da vacina que atende a maioria dos brasileiros. Chama atenção, e até surpreende, a rejeição ao nome de João Doria nas internas dos partidos envolvidos nas articulações.

Ao menos três altos dirigentes dessas legendas afirmam com clareza que a ideia é isolar Doria de maneira que ele, se insistir na candidatura, tenha de caminhar sem apoio do grupo. Um deles diz o seguinte: “Ninguém quer o Doria, só ele não vê isso”. Outro o chama de “Bolsonaro envernizado”.

A conferir se a objeção resiste a um eventual crescimento do governador na preferência do eleitorado quando a campanha realmente começar, mas o quadro de hoje é adverso. A razão é resumida numa palavra (“estilo”) e detalhada em alguns adjetivos: desleal, obstinado em excesso, impositivo e açodado.

A resistência começa em casa. No PSDB, Doria não é tido como candidato natural, justamente para conter o ímpeto dele é que foram postos à mesa os nomes de Tasso Jereissati, Eduardo Leite e Arthur Virgílio Neto. Note-se, com a anuência da bancada federal e da maioria dos diretórios. Mesmo em São Paulo, não há unanimidade no apoio ao governador.

João Doria quer a realização de prévias para escolher o candidato em outubro próximo, abertas ao 1,1 milhão de filiados, sendo mais da metade de São Paulo. Seus adversários querem adiar e restringir o colégio com proporcionalidade e peso nos votos.

Isso será decidido nos próximos dez dias, mais exatamente em 31 de maio, quando, então, ficará exposta a força ou a fragilidade de Doria dentro do PSDB, com repercussão sobre o plano dos partidos empenhados na busca de um denominador comum para enfrentar Bolsonaro e quem vier do PT em 2022.

Publicado em VEJA de 26 de maio de 2021, edição nº 2739

Um comentário:

Unknown disse...

Apoio o programa da Rede da Marina Silva e admiro o conhecimento e pó governo de Flávio Dino.