- O Globo
De onde vem a animação do mercado
financeiro? Pandemia, número de mortos crescendo, vacinas para poucos, quase 15
milhões de desempregados — e a Bolsa bate recordes quase todo dia.
Antes de examinar as explicações do próprio
mercado, convém descartar algumas respostas mais amplas, políticas por assim
dizer.
Primeiro, a euforia não vem de Bolsonaro e
seu negacionismo. Gente educada, a turma do mercado torce o nariz para o
presidente e suas insanidades. Além do mais, os índices de popularidade de
Bolsonaro estão muito baixos, enquanto sobem os de Lula.
Aliás, aí está uma segunda resposta. O
mercado não manifesta a menor inquietação com a subida de Lula. Muitos até
acham que a situação pode melhorar. E se for o Lulinha paz e amor? Muitos
analistas acham que Lula terá que tomar esse caminho em direção ao centro,
justamente para impedir o surgimento de uma verdadeira candidatura de centro.
Se esta não aparecer, não demora muito para que Lula entre nos cenários
otimistas do mercado.
Vamos lembrar: o governo Lula foi a farra
das grandes empresas, dos campeões nacionais, dos negócios do capitalismo de
amigos. Entregou a esse pessoal muito mais que Guedes.
Eis, por sinal, uma terceira resposta: a
animação não vem de Guedes, alvo de frequentes piadas nas mesas de operação.
Do ponto de vista econômico, há uma boa
explicação para a valorização das ações: quais empresas estão na Bolsa? As
grandes, as boas, aquelas com maior capacidade de resistir à crise e de
aproveitar oportunidades. Exemplo evidente: Magalu. A varejista de lojas
físicas tornou-se uma gigante do comércio eletrônico.
E quem investe? Obviamente as pessoas que
têm dinheiro — recursos retirados, por exemplo, da renda fixa. Ou profissionais
que puderam manter seus empregos trabalhando em casa, com menos despesas e mais
poupança.
Nossa Bolsa é modesta em tamanho,
suscetível, portanto, a pequenos movimentos.
Tem outra história. O pessoal do mercado entende que o Congresso está funcionando melhor com a dupla Rodrigo Pacheco no Senado e Arthur Lira na Câmara. Entende que muitos avanços já foram feitos na agenda de reformas e privatizações, com a votação da independência do Banco Central e o avanço na tramitação da reforma tributária.
Está longe de ser a reforma dos sonhos, mas
melhor que nada.
Somando-se a isso o bom momento externo,
com a forte recuperação dos Estados Unidos e a marcha constante da China, entra
a nova explosão de commodities brasileiras. A agropecuária, mineração, papel e
celulose puxam atividades paralelas. Finalmente, os juros baixos deram um bom
avanço à construção civil.
Ponha tudo isso nas contas e dá um
crescimento superior a 5% neste ano, como já se vê nos relatórios de bancos e
consultorias. Esse crescimento, depois de uma recessão forte, antecedida por
anos de expansão medíocre de 1% ao ano, é muito pouco.
Mas, de novo, é o que se tem.
E quem quiser um pouco mais de otimismo
nisso tudo, basta acrescentar a possibilidade de que toda a população esteja
vacinada até o fim deste ano.
Tem muito “se” nessa história e algumas
coisas deixadas de lado. Há uma inflação aparecendo no mundo desenvolvido, o
que pode levar a uma alta de juros nos EUA. Muitos economistas de lá já dizem
que se colocou muita água na bacia, que os estímulos monetários passaram do
ponto. Se os juros subirem nos EUA, as coisas complicam por aqui, com mais
desvalorização do real, mais inflação e, pois, mais juros.
Finalmente, ninguém do mercado está
considerando a possibilidade de uma crise política grave, provocada por
Bolsonaro quando se sentir ameaçado. E ele próprio como que anuncia a crise ao
dizer que não aceitará outro resultado em 2022 que não seja sua vitória, cada
vez mais difícil.
Ulysses Guimarães dizia que, de se em se, a
gente constrói uma Paris. Logo, ao mercado!
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