O Globo
O jogo mudou. Com a notícia-crime
protocolada por três senadores, o presidente terá que dar as respostas que tem
se negado a apresentar desde que o assunto veio à tona. A resposta “eu não
tenho como saber o que acontece nos ministérios” não melhora a vida de
Bolsonaro. Ele foi informado por um deputado da base sobre o que estava
acontecendo. O presidente já começou a ser abandonado e é assim que acontece
nesses casos. Ele vai usar toda a sua agressividade e capacidade de gerar
crises, mas não será suficiente se ele não tiver boas respostas para as
questões levantadas na CPI da Covid.
Tudo isso acontece num momento ruim na
economia. O aumento da bandeira vermelha 2 pode superar 70%, o que vai impactar
novamente a conta de luz e a inflação. Os preços já estão altos e isso piora a
qualidade da vida. O fanatismo alimentado com as exibições de motos pelas
cidades do Brasil não é o suficiente. O país tem quase 15 milhões de
desempregados, a inflação está alta, a energia sobe e há risco de racionamento.
E a resposta do governo é baixar uma MP dando mais poderes ao ministro de Minas
e Energia, Bento Albuquerque.
Todas as linhas de investigação da CPI vão direto ao presidente. A estratégia da imunidade de rebanho que elevou o número de mortes, os atrasos e descasos na compra de vacinas, a disseminação dos remédios ineficazes. E agora, a corrupção. Esta também vai direto para o colo do presidente, porque ele soube pelo deputado Luis Miranda (DEM-DF) e pelo servidor Luis Ricardo Miranda de cada uma das suspeitas, e nada fez.
A longa sessão da CPI na sexta-feira trouxe
por fim o nome sabido do deputado Ricardo Barros (PP-PR), outro fio que liga
diretamente ao palácio, afinal é o líder do governo na Câmara. As denúncias de
corrupção ocorrem em área sensível. O que o país mais queria era vacina.
Bolsonaro tripudiou sobre esse nosso desejo. Deixou de comprar e tentou minar a
confiança nos imunizantes. Disse numa entrevista ao filho Eduardo, em 19 de
dezembro, que a pandemia estava acabando e não havia pressa da vacina. Mas
houve pressa, três meses depois, a ponto de pressionar um funcionário público a
assinar um documento inaceitável. Tudo o que Bolsonaro fez contra as vacinas e
a proteção da vida humana só aumenta a gravidade do que houve no Ministério da
Saúde. Um esquema tentou tirar proveito na compra de uma vacina duvidosa e
superfaturada. Informado dos fatos, o presidente demonstrou que suspeitava de
Ricardo Barros.
Os dois se conhecem de muitas décadas. Numa
votação de medida de ajuste fiscal, no segundo mandato de Fernando Henrique, a
dupla se desentendeu e Bolsonaro acusou Barros de tentar chantageá-lo. Esse
conflito foi contado na coluna de política do Globo, no dia 20 de Janeiro de
1999. O presidente, portanto, conhece de velha data o seu líder.
Bolsonaro criou para esta campanha uma
imagem falsa de si mesmo. A de pessoa anticorrupção, um militar de valores
cristãos e contra os políticos. Tudo falso. Sua vida militar foi um fiasco. Ele
ficou 30 anos no Congresso e apenas 11 anos no Exército. Passou pelos partidos
envolvidos em inúmeros casos de corrupção. Seu governo já teve vários
escândalos. Rachadinha e compra de imóveis com dinheiro vivo pelos filhos,
cheque na conta da mulher de Bolsonaro, um ministro cercado de laranjas, outro
ministro acusado de contrabando de madeira e defesa de infratores ambientais,
compra inexplicável de uma mansão por Flávio, um foragido da Justiça escondido
na casa do advogado de Flávio. Bolsonaro é o estelionato ambulante.
Os políticos que sustentam Bolsonaro
começam agora a se perguntar quanto pode custar estar nessa companhia. O ciclo
de fuga do presidencialismo de coalizão produz o afastamento de um governante
quando ele se torna impopular. O presidente da Câmara, Arthur Lira, é inimigo
de Renan Calheiros em Alagoas, portanto ele vai tentar remar no sentido
contrário ao da CPI que tanto protagonismo dá a Calheiros. Mas até quanto ele
pode apostar do seu capital político defendendo um governo tóxico? Lira
acredita no que ouve do mercado financeiro de que a economia vai bem, mas o
mercado ganha na alta e na baixa, e faz apostas de curto prazo, um político
precisa ter um olhar longo. A economia que interessa às pessoas está com várias
más notícias.
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