O Globo
Seria Arthur Lira o homem mais poderoso da
República hoje? Dada a forma como operou para garantir, além da presidência da
Câmara, o controle direto de R$ 11 bilhões em recursos do Orçamento da União e
o destino de Jair Bolsonaro, sim.
Entender as motivações e a forma como esse
personagem opera hoje é fulcral para calcular a fidelidade que os demais
agrupamentos sobre os quais ele tem ascendência --- seu partido, o PP, e o
Centrão, que hoje é a base do governo na Câmara -- vão se comportar.
Este texto é uma segunda parte da análise
que publiquei mais cedo aqui no blog sobre como o caso Covaxin aumentou
exponencialmente o custo Bolsonaro para o Centrão e para o PP, que você pode
ler abaixo.
A pergunta ali é chave para entender o personagem Arthur Lira: quando o custo passa a ser maior que o ganho de apoiar o governo e segurar Bolsonaro? No caso do presidente da Câmara, ainda há muita lenha a queimar antes de ele pensar em jogar Bolsonaro ao mar.
Numa Câmara operando em modelo híbrido, com
a grande maioria dos deputados operando remotamente de seus Estados, o poder
que Lira adquiriu de destinar R$ 11 bilhões diretamente a essa massa por meio
da chamada RP9, a emenda do relator ao Orçamento, é inigualável.
Deputados de diferentes partidos, do
governo e da oposição, são unânimes: a destinação desses recursos é 100%
determinada por Lira. A ministra Flávia Arruda, colocada por ele na articulação
política, não tem voz sobre um centavo desses recursos.
E por que a dispersão dos deputados nos
Estados joga a favor de Lira? Porque ela reduz a ascendência dos líderes sobre
suas bancadas, e favorece a linha direta do presidente da Câmara com cada um
dos "contemplados". Além disso, ainda que sintam em sua base a
insatisfação do eleitorado com Bolsonaro e o governo, os deputados não vão a Brasília
para sentir a crise política agravada refletiva na "temperatura" do
plenário, que sempre foi fator decisivo nas guinadas de maiorias como Centrão
para abandonar o navio de presidentes que passam a ser alvo de pressão das ruas
pelo impeachment, como Fernando Collor e Dilma Rousseff.
Nesse aspecto, o distanciamento social
contra o qual Bolsonaro tanto vociferou acaba jogando a seu favor,
ironicamente.
Com essa dispersão geográfica dos deputados, Lira concentra poderes não só de ministro encarregado do Orçamento como de líder do governo, definindo a pauta e cabalando ele próprio os votos. "Hoje o Ricardo Barros não é o líder do governo, não tem participação em um voto sequer para o governo. O verdadeiro líder é o Lira", analisa um deputado da cúpula da Câmara.
Outro dado da equação não linear da
política neste momento: Lira não vai mover uma palha para salvar a pele do
correligionário Ricardo Barros, apostam os observadores mais bem posicionados
da Câmara. Eles têm uma rixa histórica, que seria a razão pela qual, consultado
pelo deputado Luis Miranda, Lira não o desencorajou a "explodir" o
deputado paranaense.
"Não acredito que o Arthur mandou o
Luis Miranda explodir o Barros, mas também não o desencorajou", explica um
observador privilegiado das relações desse grupo.
Por tudo isso, o grau de resiliência de
Arthur Lira ao lado de Bolsonaro é superior ao do restante do Centrão. Mas não
é impermeável ao agravamento da crise, ainda mais se outros expoentes do grupo,
além de Barros, começarem a se queimar. Por isso, a pressão das ruas no recesso
e a volta da Câmara mais nervosa em agosto podem começar a operar mudanças no
"fechamento" do presidente da Câmara com o presidente.
Até lá, dizem os observadores, ele espera ter acelerado a destinação das emendas. Acompanhar esse fluxo será vital para entender como vai se movimentar o homem mais poderoso da República hoje.
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