O Estado de S. Paulo
Sobrepreço de 1.000% na vacina indiana em
que o governo empenhou R$ 1,6 bilhão é só um detalhe em caso de corrupção de
proporções mirabolantes do ‘ilibado’ capitão terrorista e seu anspeçada
Desde a última terça-feira 22 de junho, os
despertadores do Palácio da Alvorada e do condomínio Vivendas da Barra foram
desligados e o estoque de ansiolíticos nas farmácias das proximidades dos
esconderijos da famiglia Bolsonaro, reforçado. Em reportagem que deu
manchete de primeira página (Governo comprou vacina indiana por preço 1.000%
mais cara), Júlia Affonso relatou: “Telegrama sigiloso da embaixada brasileira
em Nova Délhi de agosto do ano passado, ao qual o Estadão teve
acesso, informava que o imunizante produzido pela Bharat Biotech tinha o preço
estimado em 100 rúpias (US$ 1,34 a dose). Em dezembro, outro comunicado
diplomático dizia que o produto fabricado na Índia ‘custaria menos do que uma garrafa
de água’. Em fevereiro deste ano, o Ministério da Saúde pagou US$ 15 por
unidade (R$ 80,70, na cotação da época) – a mais cara das seis vacinas
compradas até agora”.
Tudo leva a denúncia espetacular de uma compra escatológica e estapafúrdia. O sobrepreço da vacina indiana, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) teve enorme dificuldade em aprovar, e com restrições, apesar das pressões sofridas pelo servidor encarregado de importações de insumos e vacinas no Ministério da Saúde, é o fio da meada de um escândalo gravíssimo. O governo Bolsonaro, que tinha levado quase um ano para comprar imunizantes testados no mundo inteiro e oferecidos pela Pfizer, comprou a Covaxin em um quarto desse tempo, graças à interferência pessoal do presidente da República, Jair Bolsonaro, em telefonema ao primeiro-ministro da Índia, Narenda Modri. Para isso empenhou R$ 1,6 bilhão, o equivalente aproximado ao custo de 20 mil Fiats Elba, cuja compra serviu de prova para fundamentar o impeachment de Fernando Collor, em 1992.
A cada dia, sua agonia, diria dona Benta.
Desde então até hoje já se sabe que, ao contrário do que dizia Bolsonaro —
aliado de Collor, quem diria –, não ficamos esperando o vendedor de mezinhas
oferecer o produto. Ao contrário das compras feitas de Coronavac, AstraZeneca e
Pfizer, houve um atravessador, a Precisa Medicamentos, de propriedade do
queridinho da vez, Francisco Maximiano. O pagamento da partida seria pago à
Madison, com sede em Singapura e não foi porque a compra não foi entregue.
Desdobramentos diários do furo do Estadão levaram
à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, um bolsonarista
de quatro costados, não como suspeito, mas como delator. O deputado Luís
Cláudio Miranda procurou a cúpula dela para informar que acompanhou o irmão, o
servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda, em visita ao chefe do
governo no Palácio da Alvorada para denunciar a falcatrua. No depoimento duplo,
ele detalhou, pressionado pelos senadores Alessandro Vieira e Simone Tebet, um
claríssimo flagrante de prevaricação.
O próprio parlamentar da base governista
deu detalhes em entrevista, publicada domingo na Folha de S.Paulo: “Com 10
minutos de conversa ele (Bolsonaro) já soltou. Quando a gente começa a mostrar
os papéis acontece essa conversa, ele dá uma desabafada, fala dos
combustíveis, que era aquilo que estava irritando. Ele falou assim: ‘Vocês têm
informações se o Ricardo Barros estava influenciando ou fazendo?’. Eu digo:
‘Presidente, a gente não sabe o nome de ninguém, trouxemos informações
técnicas’. Aí ele disse: ‘Esse pessoal, meu irmão, tá foda. Não consigo
resolver esse negócio. Mais uma desse cara, não aguento mais’”.“Ou o presidente
da República desmente cabalmente ter citado o líder de seu
governo aos irmãos Miranda ou o presidente passa a ser, pelo
silêncio, o maior acusador do deputado Ricardo Barros”, resumiu o relator
da CPI, senador Renan Calheiros, no Twitter.
“Fica evidente que não há dados
concretos ou mesmo acusações objetivas, inclusive pelas entrevistas
dadas no fim de semana pelos próprios irmãos Miranda”, disse Barros, que,
exemplo de seus aliados do governo, nada esclareceu, até porque não se submeteu
a uma entrevista coletiva, com perguntas de repórteres. A temporada do
terrorista fardado dos anos 80 não é favorável. Os norte-americanos
interceptaram uma carga de madeira contrabandeada do Brasil com evidências de
participação do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Este foi
exonerado, derrubando, na queda, o diretor da Polícia Federal (PF), Alexandre
Saraiva, e outro delegado federal, Franco Perazzoni, que chefiou busca e
apreensão ordenada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de
Moraes, relator do inquérito contra o até então o mais querido do chefão.
Bolsonaro mandou o secretário-geral da
Presidência, Onyx Lorenzoni, e o ex-secretário-geral do Ministério da Saúde
coronel Elcio Franco ameaçarem o servidor que levou a informação com inquéritos
da Advocacia-Geral da União, da Coordenadoria-Geral da União e da própria PF.
Ou seja, em vez de investigar o delito gravíssimo, como dizem os irmãos que ele
faria, no encontro, inventou a delação punida. Aparentemente, lançou mão de
éditos de um Estado policialesco. Na prática, contudo, adotou método das
milícias, que matam ou infernizam quem se dispõe a narrar os podres dos chefões
das quadrilhas.
O líder do governo no Senado, Fernando
Bezerra Coelho, passou o recibo da aposta na ingenuidade do pagador de impostos
ao alinhavar argumentos vazios para tentar defender o indefensável. Em discurso
na sessão histórica da CPI na sexta-feira 25, equiparou o atravessador ao
Instituto Butantan, fabricante da Coronavac, e à Fiocruz, parceira da
AstraZeneca.
Papelão maior fez Flávio Bolsonaro ao
confessar que levou Francisco Maximiano ao presidente do BNDES, Gustavo
Montezano, para vender uma “boa ideia” do apadrinhado. “Não era vacina”, disse
ele. Mas não teve imaginação sequer para dizer qual teria sido e defendê-la
perante os senadores e os cidadãos em geral.
*Jornalista, poeta e escritor
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