Folha de S. Paulo
Mudança
incompetente era um atoleiro para Guedes; agora, abre um buraco para o governo
A reforma
do Imposto de Renda tinha se tornado um atoleiro para Paulo Guedes.
Agora, transformou-se um buraco, pois vai reduzir a receita do governo geral em
pelo menos R$ 30 bilhões, além de tirar mais dinheiro de estados e municípios,
o que pode dar em algum problema político. Mas o governo não está nem aí, e
Jair Bolsonaro, menos ainda.
A
satisfação se deve ao fato de que tiraram um bode político da sala superpovoada
de bovídeos e de vacas no brejo. A revolta
dos empresários deve amainar, até porque a reforma perde o caráter
progressivo que tinha, apesar de toda torta.
A mudança era quase em geral criticada ou detestada por aumentar a carga de impostos de muita empresa (nem todas), manter privilégios tributários de certas firmas (da pejotização), por ser tecnicamente ruim e por nada mudar a vida de 85% da população, pelo menos, indiferente à mudança do IR por mal ter renda.
De
quebra, revelara outra vez que salseiro inepto é o Ministério da Economia
diante das críticas, ninguém quis assumir a responsabilidade pelo pacote feio.
Poucos dias depois de apresentada, uma reforma grave, com impactos econômicos
sérios, Paulo Guedes já dizia que poderia
mudar alíquotas como se apostasse feijões em uma mesa de pôquer do
vovô, o que mostra a seriedade técnica e política com que a coisa foi
planejada.
Com
a nova versão da reforma, que talvez nem deva mesmo ser a última, muita empresa
e, no fim das contas, seus acionistas, vão pagar até menos imposto, mesmo com a
indevidamente famosa tributação
de 20% dos dividendos. A alíquota do IR das empresas vai cair de 25%, na
prática, para
12,5%.
Até
por causa disso, estados e municípios vão perder mais receita (pois o bolo dos
impostos recolhidos pela União é dividido). Na arrecadação do governo geral,
apareceu um buraco de pelo menos R$ 30 bilhões por ano, segundo a conta dos
autores do projeto a ressalva é necessária, pois raramente é possível acreditar
que virá todo o dinheiro previsto nas fontes de receita alternativa.
É
fácil cortar imposto e perder receita; inventar métodos de recuperar o tutu
perdido é difícil, a conta é chutada para cima e, além do mais, quem vai em
tese ou em princípio pagar mais ainda vai espernear. A nova versão do projeto
prevê, como compensação maior, o corte de benefícios tributários para a
indústria de cosméticos e perfumaria, de remédios, de produtos químicos, de
barcos e aeronaves.
O
que o governo vai fazer em relação à perda de receita? Por ora, não está nem um
pouco preocupado. Primeiro, porque a arrecadação aumentou muito além da conta
imaginada por causa da despiora
mais veloz da economia e da contribuição
gorda da inflação. Segundo, porque a perda de receita não altera em nada o
que o governo pode gastar no ano que vem, o que depende do teto de gastos (a
receita dá para o gasto no teto).
Na
verdade, havia previsões de que o déficit fiscal diminuiria mais do que o
previsto, dada a arrecadação extra inesperada. Terceiro, gente do governo diz
que, por causa da redução da carga tributária e dos impostos sobre empresas, o
crescimento econômico seria ainda maior, compensando a perda.
No
mais, para famílias que administram suas fortunas por meio de holdings
familiares, o projeto novo é risonho e franco. Os incentivos à pejotização
aumentaram, em uma primeira leitura de um projeto sempre tão enrolado,
detalhado e com impactos tão variados (mesmo sobre contribuintes aparentemente
iguais) como os de reforma tributária.
No
caso dos assalariados, a reforma continua na mesma.
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