O Estado de S. Paulo
Há algo mais do que tem sido dito e escrito
que precisa ser entendido como causa dessa inflação renitente
que vai minando a saúde econômica do Brasil.
Os números de julho levantam graves indagações. Foram de avanço do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 0,96% no mês, que acumulou 4,76% nesses primeiros sete meses de 2021, ano em que a meta oficial é de 3,75% (com 1,5% de margem de tolerância). E foram de nada menos que 8,99% em 12 meses.
É verdade que
agora temos a bandeira vermelha patamar 2 nas tarifas de energia
elétrica, que contribuiu para o avanço de 7,9% da conta de luz em
julho. É mais uma pancada que pressiona o custo de vida e o
orçamento familiar do brasileiro médio neste ano.
Os outros fatores que concorreram para a
esticada da inflação são mais ou menos conhecidos: foi a alta dos alimentos
puxada, ao mesmo tempo, pela disparada das cotações das commodities, pela seca que
assola o Centro-Sul do Brasil e, a partir de julho, pelo
frio intenso que prejudicou pastagens e plantações.
Não foi desprezível o avanço dos preços dos derivados de petróleo (alta de 27,5% na gasolina e 25,7% no óleo diesel em 2021); o avanço de 20,8% no preço do gás de cozinha de janeiro a julho; a escassez de insumos e de matérias-primas da indústria, provocada pela retomada da atividade econômica; e o aumento da demanda que se seguiu ao avanço da vacinação contra a covid-19.
Pode-se acrescentar que a abundância de um
volume nunca visto de recursos despejados pelos Tesouros nacionais (recursos
fiscais) e pelos bancos centrais lubrificou o crédito nos mercados e empurrou
às compras o consumidor que antes andava retraído.
Mas a maioria desses fatores altistas não
atingiu apenas o Brasil. Praticamente todas as economias vêm pagando o preço do
retorno praticamente simultâneo do isolamento social. E, no entanto, a inflação
por aqui vem atingindo proporções elevadas, mesmo enfrentando forte quebra de
renda e um desemprego
de 14,6% da força de trabalho, circunstância que deveria manter a
demanda contraída. A tabela abaixo mostra como vem se comportando a inflação em
outras economias.
Quem contava com a queda estrutural da
inflação no Brasil a partir desta década está surpreendido agora com essa
recaída. Velhos mecanismos inerciais (a cultura de reajustes mais ou menos
automáticos, por exemplo) voltaram a atuar.
Esse não é o único fator que surpreende
nessa volta. Também surpreendeu a passividade do Banco Central diante
da virulência da alta, pelo menos até a última reunião do Copom.
O Banco Central errou no diagnóstico por
ter entendido que a maioria dos causadores da inflação era temporária e que,
pelo encolhimento do mercado consumidor, logo seria revertida. Errou por
ter subestimado o impacto do avanço dos preços no atacado sobre o custo de
vida, o mesmo que atirou a variação do IGP-M para os
33,8% em 12 meses. Errou, também, por não ter dado a devida
importância à deterioração das contas públicas e ao choque provocado nos níveis
de confiança. E errou por ter perdido capacidade de ancorar as expectativas dos
fazedores de preços. Por isso, foi obrigado a correr atrás e a redobrar a dose
do aperto monetário (política de juros) que agora foi
para uma Selic de 5,25% ao ano, que, no entanto, deverá chegar em
dezembro à altura dos 7%.
Enfim, a grama não nasce do mesmo jeito nos carreiros do gado em direção ao bebedouro e velhos hábitos continuam minando o equilíbrio. O mais prejudicado desse processo de perda de valor da moeda é o trabalhador de poder aquisitivo mais baixo, que não consegue se defender contra a corrosão de sua renda.
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