O Globo
Os juros subiram em um ponto percentual, vão continuar subindo, chegando ao fim do ano em 7%. E mesmo assim a inflação vai estourar o teto da meta este ano. Por isso, no ano que vem as taxas permanecerão altas. Esse foi o recado do Banco Central. Há vários complicadores no cenário. A inflação persistente, a variante Delta ameaçando as economias e as contas públicas. Para a situação fiscal o Banco Central recomenda o de sempre: as reformas. O que há são projetos muito discutíveis. A reforma do IR vai ser votada em regime de urgência. É um erro fazer uma reforma dessas de afogadilho. Isso não garante ajuste fiscal, nem aumento da eficiência econômica.
A questão fiscal é mais complexa. Há alguns
números positivos iludindo os analistas no meio de uma verdadeira escalada de
medidas prejudiciais. O governo quer adiar despesa para gastar mais, e aumenta
o número de itens dependurados em cima do teto de gastos. O projeto de
populismo autoritário necessariamente significa mais gasto. O espaço que o
governo pensou que teria no teto de gastos tem ficado menor. A inflação de 8,4%
até junho reajustou o teto de gastos, e isso significa R$ 124 bilhões a mais.
Com a inflação prevista tempos atrás, para o ano fechado, haveria um valor
extra de R$ 30 bi a R$ 40 bi. Agora os cálculos são de que ele ficará abaixo de
R$ 20 bi. O governo ainda trabalha com um INPC de 6,2%. E ele deve superar 7%.
Quanto menor for a diferença entre a inflação em 12 meses de junho e o índice
fechado do ano menor é o espaço para gastar.
—O que a área política do governo quer não
é ter R$ 20 bilhões a mais para gastar, mais sim R$ 60 bi. A queda de braço da
área econômica contra a área política, para não quebrar o teto, vai continuar
—prevê um especialista em contas públicas.
Os juros subindo elevam o gasto nominal com
o serviço da dívida, mas, ao mesmo tempo, as taxas permanecem negativas porque
a inflação está maior do que a Selic, mesmo com o reajuste de hoje.
Há ainda uma melhora em relação ao que
estava previsto no crescimento da dívida pública, mas por razões
circunstanciais. Subiu o PIB nominal, em grande parte por causa da alta forte
das commodities exportadas pelo Brasil. Isso aconteceu uma vez no começo do
governo Lula. Mas naquele tempo o ciclo de commodities foi longo, o de agora
será curto.
— Os números vão melhorar e a gente não
pode desperdiçar isso, mas o incentivo para desperdiçar será grande porque os
políticos vão olhar e pensar: por que eu vou fazer tanto esforço, se eu poderia
gastar mais? Há cinco meses a projeção do governo era déficit primário do setor
público de R$ 285 bilhões, os números da semana passada mostravam um déficit
primário do governo central de R$ 155 bilhões, um superávit dos estados e
municípios de R$ 29 bilhões e um déficit das estatais de R$ 2,5 bilhões. Junta
tudo dá R$ 128,5 bilhões de déficit. A melhora é resultado da recuperação da
arrecadação e do boom de commodities — explica esse especialista.
O projeto de reforma do Imposto de Renda
foi apresentado sem que o assunto estivesse maduro. A proposta foi radicalmente
alterada no Congresso e muda a cada dia, ao sabor das pressões e dos lobbies.
Já era um projeto mal feito e intempestivo. Mexer com a estrutura dos impostos
no meio de uma crise política, com o governo enfraquecido e refém do centrão, é
um risco sem tamanho. E tramitará em regime de urgência.
A cada nova ideia que sai do Ministério da
Economia ou da área política do governo — seja o adiamento do pagamento dos
precatórios ou o Bolsa Família de R$ 400 — os ativos tremem no mercado
financeiro. O que eles mais têm medo é da queda do teto de gastos. Curiosos os
operadores do mercado financeiro: a casa caiu, mas eles estão preocupados é com
o teto.
Quando digo que a casa caiu é porque o
ministro da Economia, Paulo Guedes, está totalmente engajado na campanha eleitoral
do presidente. Muito mais agora com a queda da popularidade. O compromisso não
é com os fundamentos da economia, mas com as ideias políticas extremadas do
presidente.
Quando digo que a casa caiu é porque a
equipe econômica é caudatária de um projeto autoritário, no qual não há espaço
para transparência, órgãos de controle, nem ajuste fiscal. É da natureza do
populismo autoritário gastar muito e gastar mal.
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