O Estado de S. Paulo
Plano é reforçar os gastos porque Bolsa Família não será a bala de prata que sozinha deixará Bolsonaro competitivo em 2022
O governo achou um jeito de transformar a
PEC dos Precatórios numa fórmula para conseguir gastar quase R$ 10 bilhões a
mais em 2022, como revela reportagem de hoje do Estadão. A PEC diminui a
fatura de R$ 89 bilhões apresentada pela Justiça ao governo e de quebra vai
permitir reduzir a conta inicial de R$ 57 bilhões que o Ministério da Economia estava prevendo gastar no
Orçamento com o pagamento de precatórios no ano que vem.
Em outras palavras, é como se uma pessoa
tivesse reservado espaço nas suas finanças para quitar uma dívida de R$ 57 no
ano seguinte, descobrisse depois que a conta era bem mais salgada, de R$ 89, e
para sair do sufoco decidisse por conta própria alongar o pagamento da dívida
em 10 anos.
Com a vantagem de que o desenho desse parcelamento reunisse condições para diminuir a dívida a pagar no ano seguinte dando mais folga nas suas finanças para gastar em outras coisas.
Tudo isso sem furar o teto de gastos que a
pessoa havia se autoimposto para o ano todo.
O efeito imediato para o governo é que a
PEC abre espaço no projeto de lei orçamentária para gastos em outras áreas de
interesse, como medidas eleitoreiras que não encontravam espaço por conta da
promessa de aumento do Bolsa Família,
que passará a se chamar “Auxílio Brasil”.
É nesse cenário que a PEC dos Precatórios
em poucos dias se tornou a proposta mais importante para o governo neste início
da volta do recesso parlamentar. Sem falar que a conta de R$ 89 bilhões
arruinaria o Orçamento do último ano do governo Bolsonaro e
da campanha eleitoral.
É importante ficar atento em outro ponto
central da discussão e moeda de argumento (ou melhor, de troca) que líderes do Centrão contam
para obter apoio do Congresso ao
parcelamento: sem PEC, não tem como aumentar as emendas de relator – aquelas
que são irrigadas para os aliados.
No grupo dos grandes beneficiários dos
precatórios, estão Estados do Nordeste governados
por adversários do presidente Jair
Bolsonaro. Imagina rechear os cofres desses governadores com bilhões
e bilhões de reais justamente em ano de eleição!
Pela lei em vigor, o governo até poderia
negociar hoje o parcelamento, mas dependeria da anuência do credor. Somente o
Estado da Bahia, governado pelo petista Rui Costa,
tem a receber R$ 8,76 bilhões.
No mapa dos precatórios dos Estados para
2022, além da Bahia, estão Pernambuco (R$
3,9 bilhões), Ceará (R$ 2,6 bilhões) e Amazonas (R$
219,4 milhões). Estão na fila Maranhão,
pendente de recurso, e Pará,
que não obteve a expedição de precatório para 2022.
Mesmo com as resistências que a PEC
enfrenta de quem tem a receber precatórios (empresas, pessoas físicas e
governos regionais) e dos que fazem da compra desse crédito a receber, com
grande deságio, um negócio muito rentável, a proposta tem chance de ser
aprovada, embora podada.
O que se observa é que gritaria dos
críticos à PEC, repetida à exaustão nos últimos dias, de que a proposta
representa um calote, não tem funcionado como no ano passado quando o governo
tentou sem sucesso aprovar mudanças nas regras de pagamento dos precatórios.
O governo conta que vai vencer essa parada.
Para isso, Bolsonaro passou os últimos três dias dizendo que vai aumentar o
benefício do Bolsa Família para R$ 400, ao invés dos R$ 300 prometidos por ele.
Cortina de fumaça.
O plano é reforçar gastos em outras medidas
porque se sabe que o programa Bolsa Família não será a bala de prata que
sozinha deixará o presidente Jair Bolsonaro competitivo em 2022.
Todo esse frisson em torno de um fundo para
pagar precatórios e turbinar os benefícios sociais fora do teto de gastos pode
acabar se transformando num caso típico de “entregam-se os anéis para preservar
a mão”. A ideia é antiga e nem estava na versão original da PEC.
Com todo esse enredo da PEC e a tentativa de aprovação de projetos a toque de caixa no Congresso, a conta já apareceu na alta de 1 ponto porcentual dos juros pelo Banco Central. Inflação e juros nas alturas.
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