O Estado de S. Paulo
Bolsonaro seguirá neste rumo até a
imprevisível cena final. Que não será pacífica
Formou-se uma multidão surpreendente para
dois comícios de atração única. Eventos irregulares da campanha eleitoral
permanente de um presidente decidido a manter-se no poder a qualquer custo.
Bandeiras e faixas produzidas na mesma fábrica de fantasias e ilegalidades.
Encontros sem espontaneidade, que passaram por uma linha de montagem cara,
industrial, e de cobertura nacional.
Deu tudo certo. Com seus 58 milhões de
votos de 2018 hoje reduzidos, pela rejeição, a menos de 32 milhões, ele não
pode se queixar do resultado. Não há certeza, porém, que tenha sido uma
renovação de confiança ou voto na reeleição.
Bolsonaro não faria essa mobilização à toa
e não se deve, portanto, descartar nenhuma intenção mais ambiciosa a partir de
agora.
O presidente atribuiu um protagonismo inédito ao ministro Alexandre de Moraes (STF), tentando jogar contra ele até os que, em meio às multidões, não sabiam de quem se tratava. Foi pensando em Moraes que Bolsonaro disse a frase-chave do seu discurso ao garantir que não será preso. O ministro é o condutor dos inquéritos das notícias falsas e dos atos antidemocráticos, crimes em que estão investigados seus filhos e presos amigos, cúmplices e membros do famigerado gabinete do ódio, além de empresários financiadores do esquema. O mesmo Moraes será presidente do Tribunal Superior Eleitoral quando estiver em votação a inelegibilidade. Uma das duas alternativas de desfecho legal do seu drama. A outra é o impeachment.
Diante das multidões, Bolsonaro nunca
pareceu tão isolado do Brasil e do mundo. Em confronto com a maioria dos
brasileiros favorável à democracia, às suas instituições e ao próprio estado de
direito. Como demonstram os manifestos que estão pipocando País afora.
Os bolsoblocks, que já andavam
desaparecidos, não são tantos como se esperava. Deu para perceber que, entre
seus eleitores, há cidadãos normais: vacinados, racionais, que acreditam ser a
Terra redonda e respeitam a ciência. Não são, como Bolsonaro, caricaturas.
Existem, aceitam passagens e hospedagens para uma viagem recreativa no feriado
e topam animados o papel de figurantes que representaram.
À distância, parece incapaz de ter a
inteligência tática que demonstra. Acredita-se que haja alguém a guiá-lo na
concepção e execução das suas insanas ações presidenciais. Será alguma
liderança da direita internacional? Isto explicaria o grande número de faixas
escritas em inglês para dar satisfações a alguém no exterior.
Seja o que for, Bolsonaro seguirá honrando
o método que explora, no seu repertório político, três elementos: a covardia, a
boa-fé do povo e a violência.
A covardia é um dos elementos típicos de
seu discurso. Ele nunca assume a autoria de nada, diz sempre que age por
delegação quando foi ele quem determinou tudo: o que dizer, o que pedir. É dele
a voz do comando e da ordem de execução. Assim conduz tanto a milícia digital
como a claque matinal diária do cercadinho da porta do Alvorada.
Outro elemento de tal método são as falsas
informações que acabam ganhando credibilidade popular. A falsidade é
instrumento poderoso de ação política e arma eleitoral deste grupo. Bolsonaro
decidiu, inclusive, legalizá-la, por medida provisória inconstitucional,
assinada anteontem, tornando-a livre de punição. É esta a liberdade de
expressão por ele reclamada nos comícios. Assim, salva a própria pele e a dos
propagadores de infâmias e mentiras à sua volta. Muitos brasileiros acreditam
que podem virar jacaré, assim como acreditam na fraude eleitoral da urna
eletrônica.
O terceiro elemento do método é a
violência. Bolsonaro não tem recuo possível, seguirá neste rumo até a
imprevisível cena final. Que não será pacífica. Na intenção firme de
instalar-se como ditador, fez das manifestações do 7 de Setembro uma evidência
do golpe que colocou em andamento.
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