O Globo / Folha de S. Paulo
Na quarta-feira deverá comparecer à CPI da
Covid o doutor Paulo Roberto Vanderlei Rebello Filho, diretor-presidente da
Agência Nacional de Saúde (ANS). Ele poderá contar o que fez diante das
denúncias do comportamento da Prevent Senior durante a pandemia. A primeira
suspeita de que havia fogo debaixo daquela fumaça veio do próprio ministro da
Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em abril de 2020, quando ela tinha no acervo 58%
dos mortos de São Paulo. O dono da operadora chamou-o de “irresponsável” e,
pelo que se viu, colocou sua empresa debaixo da asa do Planalto, maquiando
mortes, empurrando cloroquina e ameaçando médicos com retórica de miliciano.
O que a ANS fez? A autossatanização da Prevent tem no seu bojo uma competição empresarial, e a Agência a conhece muito bem. Nesse mercado há de tudo: portas giratórias, capilés e jabutis em medidas provisórias. A Justiça guarda pelo menos duas delações premiadas de uma empresa corretora de planos que concordou em pagar R$ 200 milhões de multa.
Durante os dias da Lava-Jato, chegou-se a
especular que os procuradores voltassem seus olhos para a privataria da saúde.
Quando apareceu a lista de operadoras de planos entre os patrocinadores das
palestras de um deles, viu-se que rendiam pelo menos “R$ 10 mil limpos”. A
Lava-Jato olhou para outros lados.
A Prevent é um caso em si, e seus maganos
estão sofrendo pelo que fizeram, mas a ANS sabe muitos mais. Basta lembrar que
foi ela que obrigou as operadoras de planos a cobrirem os custos dos testes
para o vírus. Até a terceira semana de março do ano passado havia operadoras se
recusando a fazê-lo. Até agosto, quando os mortos passavam de 90 mil, alguns
planos continuavam negando cobertura aos testes sorológicos. Só a ação da ANS
os levou a mudar de conduta.
De Pedro@gov para Fabio.Jatene@edu
Prezado doutor Jatene,
Escrevo-lhe por sugestão de meu médico, o
conde de Motta Maia, do nosso velho amigo Louis Pasteur e de seu pai, o doutor
Adib.
Na noite de 17 de novembro de 1889, quando
uns militares me embarcaram como negro fugido, mandando-me para a morte no
exílio, eu lhes disse: “Os senhores são uns doidos”.
Passou-se o tempo e vejo que, de tempos em
tempos, nossa terra fica nas mãos de doidos. Em março do ano passado, vosmicê
disse que 45 mil moradores de São Paulo seriam atingidos pela epidemia desse
novo vírus. Foi um Deus nos acuda, como se o senhor fosse mais um doido. Na
semana passada, os infectados da sua cidade passaram de 1,5 milhão. Os mortos
foram 30 mil.
O doutor Pasteur horrorizou-se com os
charlatães que empurravam cloroquina nos pacientes e pediu-me que vosmicê
lembrasse aos seus colegas e a esse moço que governa o Brasil o que lhe
aconteceu, lidando comigo, em 1884.
Ele pesquisava uma vacina contra a raiva.
Aplicando-a em cães, havia dado resultado, mas era preciso testá-la em gente.
Foi quando me escreveu, oferecendo-se para testá-la no Brasil. Pedia que eu a
oferecesse a presos condenados à morte, no dia da execução. Tomariam a vacina.
Se morressem, ficaria tudo igual. Se sobrevivessem, estariam livres. Eu lhe
disse que no Brasil não aplicávamos mais a pena de morte, pois eu a comutava.
(Como bom dissimulador, estava
desconversando, reconheço.)
Os doidos daí testaram a tal cloroquina sem
informar aos pacientes, e o moço do governo fez propaganda do remédio até em
reuniões de chefes de Estado.
Mesmo entristecido, sinto-me vingado: os
senhores são uns doidos.
Atenciosamente,
Pedro de Alcântara.
Jango em Moscou e na China
Passados 60 anos, veio à tona o relatório
do embaixador João Augusto de Araújo Castro, narrando a visita de João Goulart
à China, em agosto de 1961. O texto é de 4 de setembro, quando a crise
provocada pela renúncia do presidente Jânio Quadros já havia esfriado, com a
solução do parlamentarismo que permitiria a posse de Jango.
Em 30 páginas, Araújo Castro conta a
passagem da comitiva do então vice-presidente por Moscou e Beijing. No dia 25
de agosto, quando Jango já estava em Singapura, Jânio renunciou. Mais tarde,
Araújo Castro viria a ser o último chanceler de Goulart e morreria em 1975,
como embaixador do governo do general Médici em Washington.
O relatório de Araújo Castro mostra como os
chineses tentaram forçar a transformação de um acordo interbancário num sinal
de reconhecimento do governo de Beijing, com o qual o Brasil não tinha relações
diplomáticas. Jango e Castro habilmente contornaram a manobra e acabou tudo
bem.
Antes de chegar a Beijing, a comitiva de
Goulart passou por Moscou, onde Jango se encontrou com o primeiro-ministro
Nikita Kruschev e ouviu o seguinte: “Eu disse a Kennedy (o presidente dos
Estados Unidos): Fidel Castro não é comunista, mas acabará sendo. Ele não tem
alternativa.”
Kruschev tinha um viés fanfarrão, mas sabia
do que estava falando.
Naqueles dias, os Estados Unidos já haviam
rompido relações com Cuba, e a Casa Branca havia patrocinado uma fracassada
invasão da ilha.
No dia em que Araújo Castro assinou seu
relatório, Fidel mandou uma carta a Kruschev pedindo 388 mísseis de curto
alcance. Era o início de uma negociação que evoluiu para a entrega de ogivas
nucleares capazes de atingir os Estados Unidos e, um ano depois, levou o mundo
para a beira da Terceira Guerra Mundial.
Valentia incompleta
A Universidade de Campinas cassou o título
de doutor honoris causa que
concedeu em 1973 ao então ministro da Educação, Jarbas Passarinho.
Coronel da reserva, Passarinho morreu em
2016. Ele mandou às favas os seus escrúpulos de consciência quando defendeu a
edição do AI-5, em 1968. É direito de qualquer universidade conceder e mesmo
cassar títulos de doutorado honoris
causa, mas fazê-lo depois da morte do homenageado, é coisa meio
girafa. A Federal do Rio de Janeiro cassou o título do presidente Emílio Médici
em 2015, 20 anos depois de sua morte.
Seria o jogo jogado se as congregações das
universidades divulgassem, junto com a cassação da honraria, quase sempre
bajuladora, a lista dos professores doutores que a concederam. Afinal, nem
Médici nem Passarinho pediram coisa alguma.
Sinal do Centrão
Jair Bolsonaro assumiu sabendo que não
tinha base parlamentar além do cacife da Bolsa da Viúva. Fala em “bancadas
temáticas”, uma espécie de cloroquina política.
Aninhando-se no Centrão, conseguiu a proeza
de ver derrubados 12 de seus vetos num só dia.
O Centrão sentiu cheiro de queimado.
O repórter Lauro Jardim informa que Lula
combinou um jantar para quarta-feira. Nele poderão estar, além do ex-presidente
José Sarney:
Eunício de Oliveira, dono da casa, foi
ministro das Comunicações de Lula.
Edison Lobão foi ministro de Minas e
Energia de Lula e de Dilma Rousseff.
Jader Barbalho foi ministro da Previdência
de Sarney.
Renan Calheiros foi ministro da Justiça de FHC.
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