Folha d S. Paulo
Ex-presidente e líder liberal culpam lucro
de acionistas pela carestia dos combustíveis
Lula da Silva (PT) quer tirar dinheiro da
Petrobras para dar a quem consome combustíveis. Henrique Meirelles também.
Meirelles é secretário da
Fazenda de João Doria (PSDB), foi ministro da Fazenda de Michel
Temer e presidente do Banco Central de Lula. Jair Bolsonaro prometeu tirar
dinheiro da Petrobras, mas levou uma tunda no mercado e não fez nada. Desde
então, promete tirar dinheiro dos estados a fim de aliviar o
preço de gás, diesel e gasolina, entre outras patranhas. Meirelles
não gostou.
A base do argumento de Lula e Meirelles é a
mesma.
Lula: “O que a Petrobras está fazendo é
acúmulo de dinheiro para pagar os acionistas... Quem está ganhando com isso são
os investidores
nas ações...” (foi o que disse à rádio Capital FM, de Cuiabá, na
quarta-feira).
Meirelles: “Se queremos controlar o preço da gasolina ou do óleo diesel, é muito simples. É preciso diminuir a margem de lucro da Petrobras. Já está com margem extraordinária e precisa diminuir um pouco a remuneração da Petrobras e dos acionistas”, disse a jornalistas, também na quarta.
Pode ser que Lula e, ainda mais, Meirelles
pensem que a Petrobras é um monopólio safado, que explora os consumidores. Se
é, que o digam. Poderia ser até o início de uma conversa divertida sobre
setores concentrados da economia.
Sim, é possível tirar dinheiro da
Petrobras, mesmo que a empresa não seja um monopólio safado. Pode-se evitar o
reajuste de seus produtos de acordo com os preços do mercado internacional (que
começaram com Temer, em 2016), o que tiraria dinheiro dos acionistas. É ora
ilegal, mas se pode mudar a lei ou, então, se criar um “imposto sobre lucros
extraordinários”.
A Petrobras então perderia valor de mercado
(o preço de suas ações cairia), o que é apenas um aspecto da redução do crédito
da empresa. A petroleira lucraria menos, teria relativamente mais dívida, tudo
mais constante; pagaria, pois, juros mais altos e perderia capacidade de
investir e crescer.
O governo poderia então dar um jeito de
colocar dinheiro na petroleira, para manter ou até aumentar o investimento.
Mas, ainda que houvesse dinheiro, por que usá-lo na Petrobras? Para reflexão.
É verdade que desde o começo da
liberalização dos preços, de Temer-Meirelles, até Bolsonaro-Guedes, o preço dos
combustíveis subiu 72%, muito mais do que a inflação média (25%) ou
do que o preço da comida (33%). Aumentou não porque o governo quisesse. Mas o
governo não meteu o dedo nos preços de combustível ou da energia elétrica. No
governo de Dilma Rousseff 1, foi o contrário. Não deu certo, né.
Para piorar, a renda do país e do povo
miúdo em particular caiu muito desde 2014. O número
de pessoas empregadas em julho deste ano (dado mais recente do
IBGE) é menor do que em 2012. A “massa de rendimentos do trabalho” (a soma do
que todo mundo recebe trabalhando) ainda é uns 6% menor do que em julho de 2019
(em termos reais, descontada a inflação).
A melhor solução emergencial é dar subsídio
para os mais pobres (“mais Bolsa Família”), de preferência com imposto sobre
mais ricos.
Apesar do tom ameno de tédio desencantado
destas linhas, convém notar que esse debate político sobre combustíveis fica
entre a incompetência e o disparate. A dúvida é saber se a demagogia e a
desconversa vão aumentar até a eleição ou se todo mundo vai fazer “carta ao
povo brasileiro” em algum momento de 2022. O preço dos combustíveis é apenas um
aperitivo do cardápio de problemas de uma economia
empobrecida, ineficiente, estruturada para a desigualdade, no
mercado e no Estado, e em que ricos rejeitam mais imposto.
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