Folha de S. Paulo
Enquanto afunda a economia, governo avança
no autoritarismo
Da mesma maneira que a realidade tem
superado a imaginação dos ficcionistas, os cartunistas recebem presentes todos
os dias. O governo se transformou num cartum da Laerte ou do Jaguar: um sujeito
bizarro plantado à beira da estrada, tal e qual uma laranja bichada, acenando
para os motoristas que passam. Uma cena suficientemente ridícula, mas que logo
avança até um segundo quadro não menos constrangedor.
Uma mulher, no banco de passageiro de um carro, xinga o sujeito parado na rodovia. Este é ninguém menos que o presidente da República, que determina a abordagem e a prisão da mulher. Na ocorrência consta que ela "gritou palavras de calão direcionadas a ele, mais especificamente berrou 'Bolsonaro filho da p...'". Fim do cartum e do país.
O episódio só ocorreu porque o presidente,
para variar, não estava trabalhando. Tinha ido a Resende participar da
formatura de cadetes da Aman. Ao despir a fantasia de super-herói antissistema,
com a qual foi eleito, para cair nos braços do centrão, Bolsonaro ganhou mais
tempo para não fazer nada. E ainda arranjou um jeito de não ser incomodado:
entregou a chave do cofre.
Para justificar o orçamento secreto —que
repassa recursos públicos sem transparência a um grupo privilegiado de
parlamentares—, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que as emendas
de relator vão "salvar o Brasil". Faltou explicar a que Brasil ou a
que brasileiros ele se refere.
O governo caricatural continua afundando a
economia —o país registrou um crescimento próximo de zero em dois trimestres
consecutivos— e avançando em seu plano autoritário. Usando até as forças da
terceira via, Bolsonaro cumpriu a promessa de pôr no STF um ministro
"terrivelmente evangélico". E recebeu um mimo de Arthur Lira, o
presidente da Câmara: desencavar um projeto de 2016 contra ações terroristas
que cria uma polícia política.
Se for xingar, tenha cuidado.
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