O Estado de S. Paulo
Em democracias deterioradas, governantes negam os problemas e propõem soluções mirabolantes
Um novo super-herói viralizou nesta semana
no Youtube, em seu embate contra um vilão loiro instalado na Casa Branca. O
americano platinado e seus asseclas não têm como resistir à força do
“Superbigode”, que usa sunga de Super-homem, destrói os inimigos com sua “mão
de ferro” literal – e tem o rosto e os trejeitos do presidente venezuelano
Nicolás Maduro.
Nas democracias saudáveis, a luta pelo poder se dá com o objetivo de resolver problemas concretos dos eleitores. Em democracias deterioradas, como a venezuelana, os governantes negam os problemas, atribuindo-os a um vilão externo – no caso, o ex-presidente Donald Trump, que nem está mais na Casa Branca – e propõem soluções mirabolantes. A anedota do super-herói bigodudo zomba da tragédia humanitária vivida pelo país vizinho.
Já no Brasil, dois fatos importantes
marcaram esta semana. O primeiro foi a divulgação dos números do Produto
Interno Bruto, que revelaram que estamos entre a estagnação e a recessão. Como
mostrou o Estadão em editorial, nosso desempenho está entre os piores do mundo,
deixando claro que a culpa não é da pandemia, mas da má gestão do governo
federal.
O segundo fato foi que, com a definição das
prévias do PSDB, formou-se o grid de largada das eleições de 2022 – o cientista
político Carlos Melo, do Insper, entrevistado no minipodcast da semana, analisa
o cenário. Há muitas desvantagens em antecipar a campanha eleitoral, mas existe
algo de bom: teremos tempo para discutir os problemas concretos do País.
Eles se expressam em números como o da
inflação, que passou dos dois dígitos, e do desemprego, acima de 12%. Na vida
real, são tão dramáticos como as cenas de cidadãos brasileiros procurando
comida em lixões ou usando fogareiros a lenha, por não ter como pagar o preço
do botijão de gás.
Em plena crise econômica, há quem perca
tempo – caso da Câmara dos Vereadores de Ribeirão Preto – escrevendo moções
contra um comercial do Papai Noel veiculado na Noruega, em que o bom velhinho
saúda os 50 anos da união civil homossexual no país nórdico.
Os candidatos estão posicionados para as
eleições do ano que vem. Que o debate se dê em torno de questões reais. Desviar
o foco ou buscar soluções mirabolantes é zombar das agruras vividas pelos
cidadãos, que votam em busca de soluções concretas para seus dramas. Elas
passam longe de mitos natalinos ou candidatos que, como o “Superbigode”
venezuelano, acham que sua própria presença, travestidos de super-heróis,
resolverá os problemas da vida real.
*ESCRITOR, PROFESSOR DA FAAP E DOUTORANDO
EM CIÊNCIA POLÍTICA NA UNIVERSIDADE DE LISBOA
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