Folha de S. Paulo
Portfólio limitado do governo leva
presidente a recalibrar plataforma da reeleição
Jair Bolsonaro aproveitou as cerimônias dos
mil dias de governo para testar
uma plataforma eleitoral para 2022. Com a gestão desastrosa da pandemia e a
condução torta da economia, o presidente tenta turbinar um pacote modesto de
obras, transferir responsabilidades para adversários políticos e ampliar o
apelo a uma retórica conservadora.
Pela manhã, Bolsonaro voou até o sul da Bahia para lançar um centro esportivo e entregar cinco títulos de propriedade rural. O evento também marcou a inauguração simbólica de meros 9,5 km de estradas federais duplicadas –uma extensão que não cobre nem metade da distância entre o Palácio da Alvorada e a base aérea de Brasília, de onde ele havia decolado horas antes.
O portfólio limitado do governo levou o
presidente a recalibrar o discurso
tradicional de candidatos à reeleição. Em vez de apresentar realizações de
seus anos no poder, Bolsonaro se concentra numa retórica ideológica, com a
carga religiosa que o impulsionou em 2018.
Em 15 minutos de discurso no palanque
baiano, Bolsonaro quase não falou dos projetos entregues naquela manhã. Citou
Deus sete vezes, usou três passagens bíblicas e disse que se sentia satisfeito
ao viajar pelo país e "ver não mais a cor vermelha, mas as cores verde e
amarela da nossa bandeira". De quebra, ele ainda voltou a defender as
manifestações golpistas de 7 de setembro.
O presidente reforçou também uma espécie de
antipropaganda que tem espalhado pelo país para conter os efeitos políticos da
crise econômica, a principal ameaça a sua candidatura. Bolsonaro afirmou que a
inflação alta é culpa de governadores, que a conta de luz ficou mais cara por
causa da seca e que a geada elevou os preços dos alimentos.
O roteiro se repetiu mais tarde no interior
de Alagoas, onde Bolsonaro se cercou do
ex-presidente Fernando Collor e do presidente da Câmara, Arthur Lira.
Voltaram Deus, a inflação, o 7 de setembro e o verde-amarelo. Sobre o conjunto
habitacional inaugurado ali, quase nada.
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