O Estado de S. Paulo.
Seria saudável que os candidatos fizessem um acordo mínimo para rever o regime fiscal
O contraponto criado entre os que defendem
a manutenção ou o fim do teto de gastos expressa uma falsa e inadequada
dicotomia que ameaça pautar o debate da sucessão presidencial de 2022. A
discussão não pode ficar sobre escolhas entre preto ou branco.
A regra que cria um limite atrelado à inflação para o crescimento da despesa do governo teve um efeito positivo sobre as expectativas do mercado há cinco anos, quando foi adotado como fórmula de sinalizar um compromisso com o equilíbrio fiscal, mas desde então tem se demonstrado inexequível e ineficiente do ponto de vista de seus objetivos. Estimulando uma nova onda de contabilidade criativa como sucessivas reportagens deste jornal vêm mostrando.
Curiosamente, fenômeno semelhante ocorreu
com o regime de metas de superávit primário. Quando introduzido, em 1999, o
modelo era visto como fórmula adequada para garantir a sustentabilidade fiscal,
mas o seu caráter pró-cíclico aos poucos foi revelando sua inadequação para a
estabilização macroeconômica e contribuiu para a proliferação de mecanismos
criativos de driblar a regra fiscal.
Há uma década, os defeitos desse regime
fizeram o Fundo Monetário Internacional recomendar aos países regras fiscais
mais flexíveis, como as metas de resultado estrutural ajustadas ao ciclo
econômico, a exemplo do modelo europeu.
No Brasil, esse modelo passou a ser
defendido por uma equipe de pesquisadores do Ipea e por alguns dirigentes de
bancos privados, como o então economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn.
No artigo Novas metas fiscais para o
Brasil, publicado no Estadão em abril de 2012, Ilan escreveu: “Em time que está
ganhando não se mexe. Mas o que não se mexe não muda. Logo, não evolui”. Já são
quase 10 anos! Essa alternativa de reforma do nosso regime fiscal não vingou,
sofrendo oposição dos mesmos polos que hoje polemizam sobre o teto de gastos.
Na prática, esse antagonismo é – no
passado, como agora – um empecilho para avanços na direção de um arcabouço mais
moderno.
Nesse contexto, seria saudável que os
candidatos a presidente em 2022 abandonassem as falsas dicotomias que têm
pautado o debate público das últimas décadas e estabelecessem um acordo mínimo
em torno da necessária reforma do nosso regime fiscal, conciliando
flexibilidade com sustentabilidade fiscal.
Com a campanha eleitoral esquentando, a coluna vai passar a trazer neste espaço também temas de reflexão da agenda econômica nas eleições deste ano.
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