EDITORIAIS
Desmembramento da Petrobras tem de entrar
na agenda
O Globo
Há um elefante atrapalhando a discussão a
respeito do preço dos combustíveis, que a classe política teima em não querer
enxergar: o domínio da Petrobras sobre o mercado de refino no Brasil. Mesmo
que, desde 1997, a estatal legalmente não detenha mais o monopólio, na prática
a concorrência não chegou ao setor. Das 17 refinarias que produzem combustível
no país, quatro são privadas, mas elas respondem por apenas 1,3% do petróleo
processado, segundo o último anuário da Agência Nacional do Petróleo. O resto é
controlado pela Petrobras, cuja política de preços determina o valor cobrado na
bomba.
Em artigo no GLOBO, o engenheiro Edvaldo Santana, que foi diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e um dos coordenadores do Fórum do Gás, chamou a atenção para essa distorção e sugeriu a pulverização da Petrobras em várias empresas privadas, como forma de ampliar a concorrência e de reduzir os preços ao consumidor. Santana compara a situação ao ocorrido há 111 anos no mercado americano, quando a Suprema Corte quebrou a monopolista Standard Oil em 34 empresas, diante do clamor popular contra os preços abusivos. “Por que, no Brasil, o governo e o Congresso, em lugar de ficarem a discutir medidas ineficazes e eleitoreiras, não propõem a separação da Petrobras em pelo menos dez empresas, todas privadas?”, questionou.
Trata-se de uma sugestão que deveria ser
examinada com toda a seriedade. Não teria, obviamente, o condão de eliminar o
impacto da flutuação do preço internacional no mercado brasileiro. Mas
implantar a concorrência para valer traria um dinamismo a que o setor não está
habituado por aqui. O efeito mais óbvio seria tornar mais justos os preços ao
consumidor, que reagiriam de forma mais fiel aos movimentos da oferta e
demanda, em vez de flutuarem de acordo com fórmulas mirabolantes sempre
sujeitas a ingerência política.
Basta analisar a reação à guerra na Ucrânia
para entender por quê. O preço da gasolina disparou em todo o mundo. Mesmo
assim, o impacto no bolso do consumidor foi menor nos mercados mais competitivos,
como Estados Unidos ou Europa. O consultor Adriano Pires, especialista no
mercado de petróleo, comparou a alta dos preços na bomba no Brasil e em
Portugal no último dia 10. Ainda que, pela cotação cambial, o litro de gasolina
custasse R$ 15,67 por lá, isso representava 0,31% do salário médio português (€
930), enquanto o litro brasileiro a R$ 7,40 representava 0,44% do salário médio
daqui (R$ 1.667). Na prática, a gasolina portuguesa ainda estava 31% mais
barata.
Se o impacto para o consumidor seria
positivo, nos negócios o desmembramento da Petrobras atrairia investimentos em
escala jamais vista, segundo Santana. As empresas resultantes da quebra da
estatal teriam a oportunidade de se tornar atores relevantes não só no Brasil,
mas também no mercado global, a exemplo da Vale na mineração. Os novos recursos
permitiriam também que a exploração do pré-sal estivesse sujeita à necessidade
real do país, e não às idiossincrasias da Petrobras.
Para que isso se torne realidade, é preciso
mais que o presidente Jair Bolsonaro se dizer disposto a privatizar a Petrobras
amanhã. A classe política tem de entender que a melhor forma de impor limites
aos poderes da estatal sobre os preços é criar um mercado competitivo para
valer.
Multas ambientais se tornam prática em
extinção no governo Bolsonaro
O Globo
O desmonte da fiscalização ambiental pelo
governo Bolsonaro desconhece limites. Não bastasse a redução no número de
multas, resultado de uma política torta que afaga infratores e dificulta a
punição de crimes contra a flora, é deplorável saber que metade dos autos de
infração (cerca de 5 mil) emitidos em 2020 corre o risco de prescrever por
falta de análise. Quem faz o alerta é o próprio Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
No fim do ano passado, o órgão enviou às superintendências
regionais um pedido para acelerar a análise das multas. O comunicado
reivindicava definição de metas e informava que, mantido o ritmo atual, o Ibama
só concluirá 40% dos autos de 2020, além de mais 10% que são objeto de
conciliação. Os outros 50% ficarão aguardando os trâmites normais, que poderão
não ocorrer dentro dos prazos legais. As multas correm risco de ser anuladas.
Esse acúmulo de multas para análise
acontece em consequência de um decreto de 2019 do presidente Jair Bolsonaro que
tirou autonomia dos fiscais e dificultou a punição de autores de crimes
ambientais. Ele determina que as multas passem por uma audiência de conciliação
coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente, que pode conceder descontos ou
mesmo extingui-las. Se o objetivo era emperrar o andamento, foi alcançado com
êxito. Até agosto de 2020, as audiências realizadas se contam nos dedos da mão:
cinco, para um total de 7 mil previstas. Nos quatro primeiros meses de 2021,
foram 247, segundo dados do Observatório do Clima. O decreto tóxico é alvo de
ações no Supremo Tribunal Federal (STF) que ainda aguardam julgamento. Elas
argumentam que a norma facilita a prescrição das multas.
A má vontade de Bolsonaro com as multas
ambientais é conhecida. Antes de assumir, ele já deixava claro que a
fiscalização não teria vida fácil em seu governo. Em dezembro de 2018, ao
participar de uma solenidade na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman),
prometeu acabar com a “festa” das multas. “Não vou mais admitir o Ibama sair
multando a torto e a direito por aí, bem como o ICMBio (Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade)”, afirmou. Em janeiro deste ano, durante um
evento de concessão de crédito agrícola, Bolsonaro festejou a redução de 80%
nas multas do campo. Não é surpresa, portanto, o esvaziamento dos órgãos
ambientais.
Enquanto as multas definham, o desmatamento
cresce na Amazônia. Levantamento do Observatório do Clima mostra que, entre
2020 e 2021, o número de multas por crimes contra a flora (2.534) foi o menor
dos últimos 18 anos — ao passo que a destruição da mata bate recordes
sucessivos. Em 2021, houve perda de 13.235 quilômetros quadrados, maior área
desde 2016. A impunidade serve de combustível aos crimes. Se a meta é reduzir o
desmatamento, como anunciado na Conferência do Clima, em Glasgow, a estratégia
está errada. Não há política pública que contenha o desmatamento se o próprio
governo prefere se colocar ao lado dos exterminadores da floresta.
Ordem nas redes
Folha de S. Paulo
Falta de consenso ameaça projeto, mas
Justiça mostra firmeza ante desinformação
O Congresso tem avançado na busca de
instrumentos para combater a desinformação na internet, mas ainda parece
longe de alcançar o consenso necessário para atacar a mazela com meios
eficazes.
Um passo inicial foi dado no primeiro ano
da pandemia, quando o Senado aprovou projeto de lei sobre o assunto. Um grupo
de trabalho criado pela Câmara dos Deputados apresentou outra proposta no ano
passado, após amplos debates.
O texto está pronto para ser colocado em
votação no plenário, mas encontra resistências em toda parte. Uma nova versão
está sendo costurada para contorná-las. Se a Câmara aprová-la, o assunto terá
de voltar a ser analisado pelo Senado.
As dificuldades são semelhantes às que
outros países têm enfrentado ao lidar com o problema. Trata-se de solucionar
uma equação difícil, em que é preciso coibir a propagação de mentiras sem
colocar em risco a livre circulação de ideias e a privacidade das pessoas.
Em sua versão mais recente, o projeto da
Câmara impõe necessária disciplina a empresas como o Facebook e o Twitter,
estabelecendo normas para suas políticas de remoção de conteúdos e a proteção
de direitos dos usuários.
Ainda que o detalhismo do texto soe
excessivo, a proposta vai na direção correta ao propor regras claras para que
comportamentos intoleráveis sejam cerceados pelas empresas, a censura a
manifestações legítimas seja evitada e eventuais erros sejam reparados.
Há dispositivos para conter a proliferação
de robôs e outros mecanismos usados para disseminar falsidades, mas ainda não
se desenharam controles eficientes para obstruir os fluxos de recursos que
fazem a engrenagem girar.
Mudanças introduzidas para proteger a
privacidade de usuários de aplicativos de mensagens, como o WhatsApp e o
Telegram, acabaram enfraquecendo restrições que visam impedir campanhas de
desinformação, como as que tumultuaram as eleições de 2018.
Merecem revisão também os artigos que
oferecem aos parlamentares uma espécie de salvo-conduto na internet, como se as
imunidades que protegem suas opiniões no exercício do mandato fossem
extensíveis a qualquer sandice publicada nas redes sociais.
Parece difícil que questões tão complexas
sejam resolvidas a tempo da campanha eleitoral deste ano. Isso significa que o
controle da desinformação continuará a exigir atitude firme da Justiça.
A medida tomada nesta sexta (18) pelo
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que mandou bloquear
o acesso ao Telegram no país após o descumprimento de sucessivas
decisões judiciais, mostra que as empresas do ramo não terão vida fácil.
A missão de Boric
Folha de S. Paulo
Chileno terá de atender anseios populares
sem pôr a perder conquistas econômicas
Eleito com quase 56% dos votos, Gabriel
Boric chegou à Presidência do Chile cercado de enormes expectativas
dentro e fora de seu país. Sua ascensão, de um lado, responde às demandas por
um Estado mais atuante expressas nas jornadas de 2019; de outro, dá início a um
processo de renovação política da esquerda latino-americana.
Paradigma de reformas liberais na América
Latina, o Chile apresentou nas últimas três décadas o melhor desempenho
econômico dentre os principais países da região. Nem por isso deixa de
apresentar uma série de mazelas terceiro-mundistas, a começar por uma profunda
desigualdade social.
Tensões acumuladas desaguaram há três anos
em colossais protestos de rua. O movimento levou à formação de uma Assembleia
Constituinte, atualmente responsável pela elaboração da nova Carta para
substituir o texto engendrado em 1980, durante o regime do ditador Augusto
Pinochet (1973-1990).
Derivam daí os primeiros desafios de Boric,
que aos 36 anos tornou-se o mais jovem presidente da história chilena. Após ser
concluído, o novo pacto social precisará ainda ser aprovado em plebiscito.
Embora não esteja diretamente envolvido no
processo de redação, o mandatário precisará atuar para que o texto final seja
palatável a amplas fatias do eleitorado.
Uma rejeição ou confirmação por margem
mínima dificilmente deixarão de ser interpretadas como uma derrota de Boric, que
ganhou projeção como um dos primeiros defensores da nova Constituição.
Paralelamente a isso, o presidente chileno
precisará administrar os anseios de uma população impaciente por mudanças
rápidas no acesso aos serviços públicos de saúde e educação, bem como no
sistema de aposentadoria, baseado em poupanças individuais.
No plano ideológico, trata-se de um governo
que, ao menos simbolicamente, busca romper com alguns dogmas do passado. Sinal
disso é o fato de que os ditadores de Venezuela, Cuba e Nicarágua não foram
convidados para a posse.
Chama a atenção ainda o esforço pela
igualdade de gênero na política empreendido por Boric. Não é pouco que, dos 24
nomes de seu gabinete, 14 sejam mulheres.
A esquerda que reconquista espaços na América Latina tem o desafio de evitar erros do passado recente, como a tentação autoritária e o populismo econômico. Esse necessário processo de renovação começa a ser posto à prova no Chile.
Telegram não está acima da lei
O Estado de S. Paulo.
A suspensão não é inédita, tampouco
representa ativismo judicial. É estrito cumprimento da lei.
Se deseja funcionar no País, o aplicativo
de mensagens Telegram deve cumprir as leis brasileiras e as decisões judiciais.
Simples assim. Nenhuma pessoa física ou jurídica está acima da lei. E foi com
esse fundamento – inquestionável do ponto de vista do Estado Democrático de
Direito – que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
(STF), determinou ontem a suspensão “completa e integral” do Telegram no País
até o efetivo cumprimento de várias decisões judiciais que a empresa vem
ignorando, além do pagamento de multa diária e da obrigação de indicar
representação oficial no Brasil.
A suspensão do funcionamento de um
aplicativo não é criação jurisprudencial, tampouco ativismo judicial.
Referência internacional na proteção da neutralidade da rede e no respeito à
liberdade de expressão, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14) prevê
expressamente, em seu art. 12, hipóteses de suspensão temporária ou mesmo
proibição de exercício de determinadas atividades por parte de provedores de
conexão e de aplicações de internet.
“O ordenamento jurídico brasileiro prevê
(...) a necessidade de que as empresas que administram serviços de internet no
Brasil atendam às decisões judiciais que determinam o fornecimento de dados
pessoais ou outras informações que possam contribuir para a identificação do
usuário ou do terminal, circunstância que não tem sido atendida pela empresa
Telegram”, diz Alexandre de Moraes, na decisão de 18 páginas.
Além de estar prevista em lei, a suspensão
temporária do funcionamento de um aplicativo não é inédita. Por exemplo, o
Judiciário aplicou algumas vezes a medida em relação ao Whatsapp, também em
razão de descumprimento de decisões judiciais.
Numa das vezes, Mark Zuckerberg, cofundador
e presidente do Facebook, empresa proprietária do Whatsapp, reclamou da Justiça
brasileira, dizendo que era “um dia triste para o País”, pois “até hoje, o
Brasil tem sido um importante aliado na criação de uma internet aberta”. Era
uma evidente tentativa de inversão de responsabilidades.
Na ocasião, dissemos, neste espaço, que o
Facebook se colocava “como vítima da situação quando, na verdade, é a empresa a
responsável pela interrupção do serviço”. Ademais, “ao oferecer serviços no
País, o Facebook deve cumprir as leis brasileiras”, razão pela qual não podia
“se colocar acima da ordem jurídica do País” nem “usar o fato de ter milhões de
usuários para atribuirse uma espécie de imunidade perante a Justiça”.
No caso agora tratado, o abuso do Telegram
é ainda mais evidente. O aplicativo de mensagens não apenas descumpriu uma
série de decisões judiciais, como nem sequer apresentou resposta às diversas
solicitações do Judiciário. Na decisão, Alexandre de Moraes fala em “desprezo à
Justiça” e em “falta total de cooperação da plataforma Telegram com os órgãos
judiciais”.
O ministro do STF lembrou também que essa
atitude “desrespeita a soberania de diversos países, não sendo circunstância
que se verifica exclusivamente no Brasil e vem permitindo que essa plataforma
venha sendo reiteradamente utilizada para a prática de inúmeras infrações
penais”. A corroborar o escárnio, o Telegram não tem representação oficial no
Brasil.
O fato de ser uma decisão monocrática não
deslegitima em nada a suspensão do aplicativo. O valor de uma ordem judicial
não está condicionado à qualidade pessoal de quem a emitiu, tampouco à
quantidade de autores da decisão. Monocrática ou colegiada, uma decisão
judicial reflete por princípio a ordem jurídica, isto é, a vontade soberana da
população expressa na lei. Eventuais equívocos judiciais podem e devem ser
revistos pelas instâncias de controle. De toda forma, a correção desses
equívocos se faz pelas vias institucionais, e não simplesmente ignorando as ordens
da Justiça.
Num Estado Democrático de Direito, não cabe
ignorar a lei ou descumprir decisão judicial. É precisamente o respeito ao
chamado regime de leis que assegura a liberdade de todos. De outra forma, não
haveria liberdade, e sim barbárie e prevalência do mais forte.
Mais um gabinete paralelo
O Estado de S. Paulo.
A existência de um gabinete paralelo
composto por pastores, operando dentro do Ministério da Educação, é grave
violação da Constituição. O Estado brasileiro é laico
Em maio do ano passado, a CPI da Pandemia
revelou o funcionamento de um gabinete paralelo no Ministério da Saúde. Pessoas
sem nenhum cargo ou atribuição oficial transmitiam a Jair Bolsonaro diretrizes
conflitantes com as orientações da pasta da Saúde – então chefiada por Luiz
Henrique Mandetta –, participavam de reuniões do governo e interferiam em
negociações sobre insumos médicos. Era algo escandaloso, que contraria as
regras mais básicas do funcionamento do Estado. O funcionamento de uma
estrutura paralela – sem atribuição formal de função, sem controle, sem
transparência e sem responsabilidade legal – afronta a Constituição de 1988. No
Estado Democrático de Direito, o poder estatal só pode ser exercido por vias
institucionais.
Agora, o Estadão revelou a existência de
mais uma estrutura paralela no governo Bolsonaro, dessa vez dentro do
Ministério da Educação (MEC). Sem vínculo formal com a administração pública e
sem ligação com o setor de ensino, pastores participam de agendas fechadas em
que se discutem as prioridades da pasta e se define o uso de recursos
destinados à educação no Brasil. Com trânsito no MEC, os religiosos viajam em
voos da FAB e regulam o acesso de prefeitos e empresários ao ministro da
Educação, o também pastor Milton Ribeiro.
O gabinete paralelo da pasta da Educação é
capitaneado por dois pastores, Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura, que
são, respectivamente, presidente e assessor da Convenção Nacional de Igrejas e
Ministros das Assembleias de Deus no Brasil. Nos últimos 15 meses, os dois
participaram de 22 agendas oficiais do MEC. Em maio do ano passado, por
exemplo, numa viagem do ministro Milton Ribeiro ao município de Centro Novo do
Maranhão (MA), o pastor Gilmar dos Santos afirmou expressamente que ele era o
responsável por garantir verbas para as prefeituras.
De acordo com a reportagem do jornal, o
gabinete paralelo atua especialmente na intermediação entre a pasta da Educação
e prefeitos do Progressistas, do PL e do Republicanos. As três legendas
integram o Centrão, que comanda o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE), com orçamento de R$ 945 milhões.
São muitos os problemas institucionais e
até penais decorrentes dessa estrutura paralela. Por exemplo, o Código Penal
estabelece o crime de usurpação da função pública, com pena de detenção de três
meses a dois anos, para o particular que exerce indevidamente uma atividade
pública. Se o agente auferir vantagem com tal atividade, a pena é de reclusão
de dois a cinco anos.
No caso revelado pelo Estadão, há uma
agravante. Trata-se de um grupo religioso que se apropriou da máquina estatal,
o que é rigorosamente inconstitucional. O Estado brasileiro é laico. A
separação entre Igreja e Estado, com a necessária neutralidade do aparato
estatal a respeito de questões religiosas, é princípio inegociável.
A revelação do gabinete paralelo de
pastores no MEC veio dias após o presidente Jair Bolsonaro ter dito a pastores
e religiosos evangélicos, em evento no Palácio do Planalto: “Eu dirijo a nação
para o lado que os senhores assim desejarem”. Agora, sabe-se que a sujeição da
administração federal a ideias e valores de um grupo religioso não era apenas
uma promessa eleitoral – o que, por si só, é um grave retrocesso –, mas uma
realidade já em funcionamento.
É preciso interromper essa apropriação da
máquina estatal para fins religiosos, que por definição são privados, e punir
os responsáveis. Entre os crimes de responsabilidade contra a administração
pública, a Lei 1.079/1950 inclui “não tornar efetiva a responsabilidade dos
seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos
contrários à Constituição”. A laicidade estatal é princípio constitucional.
A subordinação do Estado a interesses particulares é grave ofensa à ordem jurídica. O Ministério Público, assim como o Legislativo e o Judiciário – no que lhes couber –, têm o dever de atuar. Não cabe fingir que nada está acontecendo. O bolsonarismo vem destruindo, um a um, todos os fundamentos da República.
Nenhum comentário:
Postar um comentário