sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Hélio Schwartsman - Conspirador serial

Folha de S. Paulo

Ouvir Marcos do Val num inquérito para apurar tudo se torna obrigatório

As revelações do senador Marcos do Val (Podemos-ES) sobre mais um plano golpista de Jair Bolsonaro podem surpreender pelo enredo, mas não pela disposição. A essa altura, está mais do que claro que Bolsonaro passou, se não os últimos quatro anos, ao menos os últimos três meses conspirando contra a democracia.

Os detalhes da nova trama podem afetar a situação jurídico-policial do ex-presidente. Se, no caso da minuta de decreto golpista encontrada na casa de Anderson Torres, ainda era logicamente plausível afirmar que Bolsonaro jamais tomou conhecimento do plano, agora o capitão reformado seria, pelo menos numa das versões apresentadas pelo senador, articulador do conciliábulo. Ouvi-lo num inquérito para apurar tudo se torna obrigatório. A PF já pode marcá-lo como "person of interest".

Com isso Bolsonaro vai para a cadeia? Não é tão simples. Mesmo que a história mais picante contada por Do Val se mostre 100% acurada, ainda restaria uma discussão jurídica sobre os meandros do "iter criminis", a trajetória criminosa. Em princípio, planejar um crime e mesmo fazer os preparativos para cometê-lo (algo como comprar o revólver) não são, de um modo geral, considerados atos puníveis. Para a maior parte dos doutrinadores, é só quando a execução do delito tem início que a conduta se torna ilegal. Chamar um senador para o Alvorada e convidá-lo para participar do conluio democraticida é preparativo ou execução? Aqui já entra a metafísica. De todo modo, vale lembrar que este é só um dos crimes pelos quais Bolsonaro pode ser responsabilizado.

Triste mesmo é constatar que só chegamos a essa situação surreal de ver o ex-presidente envolvido em múltiplas conspiratas porque as instituições não lhe cortaram as asinhas na hora certa. Dois dos principais responsáveis por essa omissão imperdoável, Augusto Aras Arthur Lira, estão aí posando de campeões da democracia e recebendo votações consagradoras.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

DESgoverno Bolsonaro: um "conluio democraticida" entre uma motociata e outra!