terça-feira, 31 de dezembro de 2024

A conversa para 2025 – Pedro Doria

O Globo

O personagem político mais importante de 2024 foi Pablo Marçal. O mais provável é que ele tenha explodido neste ano e não mais apareça. Depois de divulgar um documento médico evidentemente falso, tudo indica que terminará com os direitos políticos cassados pelo TSE antes da próxima eleição. Se formos para além das fronteiras brasileiras, há outros dois personagens muito importantes: Donald Trump e Elon Musk. E os três, juntos, contam uma mesma história. Mudou, de novo, a maneira de fazer comunicação política. Sentimos o cheiro disso em 2024. Este ano de 2025 será o da consolidação dos profissionais para os pleitos do ano seguinte. Quem aprender as lições direito sai na frente.

Porque o problema é o seguinte: quem acha que ainda estamos naquela fase da desinformação anônima, feita por robôs, que disparou a onda populista autoritária em 2016 se engana. O tempo, agora, é outro. Depois de uma fase de desorientação, aos poucos o público foi construindo relações com alguns nomes chaves nas plataformas sociais. Por falta de palavra melhor, nós os batizamos de influenciadores. Ela pode parecer até pretensiosa, mas é descritiva. Alguns têm capacidade real de influenciar.

Trump, durante sua campanha eleitoral, deu entrevistas a 12 grandes podcasts. Com Joe Rogan, o maior podcaster americano, passou três horas sentado no estúdio que fica na garagem . E relaxado, numa conversa que parecia bate-papo. Kamala Harris foi a seis podcasts, na conta dos democratas. É uma conta enganosa — inclui programas de rádio como o de Howard Stern, que existe há mais de três décadas. Não é a mesma coisa. A maioria das figuras do mundo da influência digital jamais estaria num programa de TV. Parecem, alguns, medíocres. Mas se engana quem considera isso. Todos criam relações reais, de confiança, com seus públicos. Há sensação de proximidade, até afeto. É uma relação mais próxima da amizade que a distância das celebridades do passado. Por isso mesmo, a sensação é de que é mais real.

Não é só isso. O mundo dos influenciadores de hoje e das celebridades de ontem se divide, também, por outra percepção. Ou, talvez, outra ilusão. Todo mundo, se trabalhar direito, pode virar influenciador. Para virar celebridade, as barreiras eram realmente muito mais altas.

Mas o mundo da influência precisa ser regulado. Não é, aqui, uma questão de controlar discurso. É que não dá para ignorar que as plataformas são corporações bilionárias, com tendências monopolistas, que vivem de vender a ilusão de que todos podem realmente ficar famosos. As barreiras são mais baixas do que no passado, ainda assim só alguns ganham fama, e destes um subconjunto menor ganha dinheiro. O conjunto da produção de cada um, no entanto, produz bilhões de dólares e dá um poder absurdo para grandes corporações.

Há um problema ético evidente, e francamente intolerável, na ideia de montar algumas das principais corporações do mundo nas costas do trabalho não remunerado de milhões. Não é só questão de dinheiro. É também questão de poder.

Entre julho e novembro, tuítes de Elon Musk foram vistos 128 bilhões de vezes por usuários de sua rede social, o X. Some todas as postagens feitas por todos os deputados e senadores americanos na mesma plataforma, e elas foram vistas pouco mais de 7 bilhões de vezes. Em média, uma mensagem de Musk é lida mais que o dobro de vezes de uma postada pelo presidente eleito . O Washington Post colocou um trio de jornalistas para, todos os dias durante cinco meses, anotar quantas impressões tinha cada publicação de algumas personalidades.

Está claro que Musk turbinou o algoritmo do X para ampliar sua influência política. Sua voz fala mais alto. Ele gastou pouco mais de US$ 40 bilhões para comprar um assento preeminente no novo debate público. E funcionou. Nas outras redes, esse tipo de manipulação não é tão escancarada. Mas, a partir do momento em que um algoritmo escolhe quem sobe e quem desce, manipulação há. A Meta, dona de Facebook, Instagram e Threads, escolheu mostrar menos política. Escolheu, literalmente, informar menos.

Este mundo da influência domina nossa conversa. Pois, então, é hora de conversarmos mais sobre ele.

 

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