Folha de S. Paulo
Compilação da legislação vem acompanhada de
mudanças polêmicas
Peço desculpas ao leitor por me repetir
e voltar ao
novo Código Eleitoral (PLP 112/2021).
O projeto,
que tramita no Senado em
regime de urgência, se propõe a unificar toda a legislação eleitoral em um
único documento. Isso inclui a revogação das leis dos Partidos Políticos e
das Eleições,
e do antigo código eleitoral (de 1965) entre outras normas. Embora a iniciativa
seja bem-vinda, o texto não apenas compila a legislação vigente: traz
alterações significativas nas regras eleitorais, muitas das quais estão
passando despercebidas.
O projeto versa sobre temas que vão do registro de partidos e eleitores ao teto de gastos em campanhas, sistema de prestação de contas, divulgação de pesquisas de intenção de voto e reserva de vagas para mulheres nas listas de candidatos e nas casas legislativas.
Mencionei na última coluna a reserva de 20%
das vagas nas casas legislativas para mulheres. Mas, nas disposições
transitórias, a aplicação dessa regra é prevista para "20 (vinte) anos, a
contar da primeira eleição subsequente à publicação desta Lei." Mais grave
ainda, tem efeito imediato a alteração no texto que exime os partidos de
preencherem o mínimo de 30% das vagas nas listas de candidatos com
"candidatos de cada sexo".
O artigo 859 determina que: "caso não haja
o preenchimento mínimo das vagas para cada gênero, as vagas remanescentes
deverão ficar vazias, sendo vedado o preenchimento com o outro gênero".
Somente se as vagas não preenchidas forem ocupadas por candidatos de outro
gênero os partidos podem ser punidos. Hoje, a regra dos 30% incide sobre o
total de candidatos efetivamente registrados, e não o tamanho máximo da lista.
Ainda, o Código anistia os partidos do
pagamento de multas por contas rejeitadas em eleições passadas e permite
parcelamentos de 60 a 180 meses nos casos que devoluções sejam necessárias ou
que multas sejam mantidas.
Outro ponto polêmico é a divulgações
das pesquisas de intenção de voto. A nova redação obriga os
institutos a informar "os percentuais de intenção de voto no candidato
eleito nas três últimas pesquisas estimuladas realizadas pelo mesmo instituto
na eleição anterior, em confronto com o percentual de votos apurados pela
Justiça Eleitoral, na respectiva circunscrição, nas eleições para os cargos de
Prefeito, Governador, Senador e Presidente da República."
O intuito seria oferecer ao eleitor uma
baliza de confiabilidade, mas isso ignora que o objetivo das pesquisas de
opinião não é prever o resultado da urna (exceto no caso da "boca de
urna"), mas sim ser um retrato do momento. Muitos, inclusive, utilizam as
pesquisas para tomar decisões estratégicas: abandonar seu candidato predileto,
mas que o eleitor julga inviável, e redirecionar o voto para sua segunda opção.
Esse movimento é comum na reta final da campanha
eleitoral, muitas vezes na véspera da eleição. Imputar erro às
pesquisas por conta de mudanças naturais no comportamento dos eleitores serve
apenas ao intuito de alguns líderes políticos que gostariam de restringir o
acesso à informação. Há quem preferiria limitar essas informações as elites
políticas, que além das pesquisas públicas também possuem acesso a pesquisas e
trackings de consumo privado dos partidos.
Ainda que o novo código tenha muitos méritos,
e não nego que os tenha, não é por acaso que deputados e senadores reservem
para a última hora a análise de projetos dessa magnitude. As votações
apressadas desviam o foco dos pontos que os líderes partidários preferem que
passem desapercebidos.
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