Tom da carta de apoio a Lula causa insatisfação no PMDB e em outros aliados
do governo
Fernanda Krakovics, Renato Onofre
UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA
BRASÍLIA e RIO - Dirigentes do PMDB afirmaram que o partido foi constrangido
a assinar a nota, articulada pelo PT, na qual cinco legendas da base aliada
defenderam o ex-presidente Lula e acusaram a oposição de tentativa de golpe,
como antecipou a coluna Panorama Político. O PP e o PR não foram procurados
para assinar a "Carta à sociedade", mas desaprovaram o teor.
Segundo peemedebistas, o presidente do PT, Rui Falcão, teria chegado com a
nota pronta, e já assinada por outros partidos aliados, deixando o presidente
do PMDB, Valdir Raupp, numa saia justa. Depois de chancelar o documento, Raupp
avisou o vice-presidente Michel Temer e disse que não teve como não assinar uma
nota de solidariedade a Lula. Lideranças do PMDB, além de desaprovarem o texto,
alegam que não foram consultados sobre o apoio.
O tom da nota foi considerado "péssimo" pelo PMDB e fora de
sintonia com o momento atual do país, principalmente a parte em que acusa a
oposição de práticas golpistas. Esse trecho causou estranheza em dirigentes
peemedebistas, já que, de acordo com eles, o Brasil tem uma democracia
consolidada e um governo sólido.
- É claro que seríamos solidários ao Lula, mas sem atacar, sem radicalismos.
Faríamos de uma forma mais peemedebista - disse um integrante do partido.
Membros do PMDB também criticaram Valdir Raupp por assinar o documento
proposto pelo PT sem submetê-lo antes ao partido:
- Foi um gesto solitário do Raupp. Ele deveria ter consultado o partido -
reclamou um peemedebista.
O PP, que não assinou a nota, também reprovou o tom do texto. Lideranças do
partido consideraram um erro de estratégia, já que o documento, segundo eles,
acabou jogando mais holofotes sobre a matéria da revista "Veja", na
qual o publicitário Marcos Valério, operador do mensalão, supostamente acusa o
ex-presidente Lula, em conversas com terceiros, de envolvimento com o esquema
de corrupção:
- E política não se faz por escrito - afirmou uma liderança do PP.
A ideia da nota teria sido levantada pela primeira vez no domingo passado,
em conversa entre Lula, Rui Falcão e o governador Eduardo Campos (PE),
presidente do PSB, em almoço no Centro de Tradições Nordestinas, em São Paulo.
Na ocasião, Lula reclamou da matéria da "Veja".
Na terça-feira, Falcão telefonou para o vice-presidente do PSB, Roberto
Amaral, e o consultou sobre a ideia da nota. O presidente do PT enviou então
uma primeira versão do texto para o socialista, que reescreveu e fez uma
segunda versão.
Falcão procurou então Raupp e o PRB do candidato a prefeito de São Paulo,
Celso Russomano, enquanto Amaral conversou com Eduardo Campos, com o presidente
do PCdoB, Renato Rabelo, e com o do PDT, Carlos Lupi.
Em Niterói, onde participou de evento do PT, Rui Falcão negou que tenha
pressionado ou coagido o presidente do PMDB, Valdir Raupp, a assinar a nota.
Sobre o mal-estar instalado no partido aliado, não quis comentar.
- Não posso dar opinião sobre o que acham setores do PMDB. O partido é um
aliado de primeira hora do PT, e temos total confiança nisso. Eu não
pressionei. Sou presidente do PT e falei diretamente com o presidente do PMDB.
Submeti a nota a ele e dei total liberdade para que ele, se não quisesse, não
assinasse. Ele não cogitou isso. E teve a liberdade de mexer no conteúdo, o que
não fez - afirmou Falcão.
O presidente do PT atribuiu à pressa o fato de o PR e o PP não terem aderido
ao manifesto. Ele disse que na última quarta-feira não houve tempo de procurar
os representantes dos dois partidos. E ironizou dizendo que ainda dá tempo de
quem quiser, inclusive a oposição, aderir à carta:
- A nota está em aberto para quem quiser assinar. Como nós tínhamos problema
de timing , quanto mais consultas a gente fizesse, mais tempo a nota demoraria
para sair. Não os procurei pela falta de tempo. A nota é em solidariedade ao
presidente Lula e pode incluir até os partidos de oposição, se acharem que os
ataques foram indevidos.
Falcão comparou o momento vivido por Lula aos do final dos governos dos
ex-presidentes Getúlio Vargas e João Goulart. Para ele, há "uma tentativa
da direita golpista" de assumir o poder:
- Temos que prevenir a nossa sociedade contra os aventureiros que atacam a
honra do presidente Lula tentando colocá-lo na vala comum de um processo pelo
qual ele não deve nada. Vamos lembrar que, em 54, eles atacaram um presidente
popular que se suicidou (em referência a Getúlio Vargas). Em 64, em nome do
combate à corrupção e à subversão, puseram 21 anos de ditadura sanguinária na
nossas costas.
Presidente do PTB e delator do mensalão, Roberto Jefferson criticou o PT
pela nota e afirmou que o documento deixa antever a disputa por espaço, em
2014, entre os aliados do governo.
- A briga por 2014 está tão feia que os ditos aliados estão disputando
espaço até mesmo em uma mequetrefe notinha - disse ele. - Na verdade, o PT
tinha que agradecer aos céus pela oposição que tem. Se fosse apenas um pouco
parecida com o PT do passado, que usava e abusava da calúnia, da difamação e da
denúncia, Lula não tinha deitado e rolado depois do escândalo do mensalão.
FONTE: O GLOBO
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