Dois fatores confluíram para despertar a
iracunda reação do governo contra os partidos e as forças que não lhe dizem
amém: a iminência de derrotas fragorosas nas urnas daqui a duas semanas e a
comprovação, feita pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, da existência
do mensalão e suas vis características. Quando viu seu poder contestado, sua
aura santa implodida e sua perspectiva de vitórias minada, o PT rasgou a
fantasia.
Mais uma vez, o partido de Lula, Dilma, José
Dirceu e sua quadrilha de mensaleiros mostrou que não consente com críticas,
trata adversários como inimigos e só convive com a democracia por conveniência.
Só quem tem horror ao estado democrático de direito e suas instituições vê
"práticas golpistas" onde só existe o sagrado direito à crítica, o
exercício do contraditório, a manifestação do livre pensar e do livre agir.
O PT esperneia diante da constatação de que
foi no governo de sua maior estrela, Luiz Inácio Lula da Silva, que ocorreu o
maior escândalo de corrupção da história do Brasil. Vocifera por ver alguns de
seus principais capas-pretas prestes a serem condenados a passar anos atrás das
grades por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Os petistas desesperam-se ainda mais ao
constatar que a força eleitoral do partido perde ímpeto em todo o país e
esfumaça-se nas principais cidades brasileiras - só numa das capitais a
candidatura petista sai-se bem, ao mesmo tempo em que o PT corre risco de
sequer ir ao segundo turno em locais fundamentais como São Paulo, Porto Alegre
e Recife.
O Estado de S.Paulo revela que foi Lula quem articulou a raivosa
"nota à sociedade brasileira" divulgada ontem pelo PT e assinada por
mais cinco partidos da base: PMDB, PSB, PRB, PDT e PCdoB- noticia-se que os
três primeiros teriam aderido sob coação. Além disso, segundo a Folha de S.Paulo, o texto teria envolvido
José Dirceu e sido levado previamente à presidente Dilma Rousseff, que o
avalizou, em mais uma atitude inadequada para o cargo que ocupa.
Seria absolutamente legítimo -mais que isso, é
desejável - que o ex-presidente se manifestasse a respeito das denúncias
veiculadas na revista Veja desta semana. A saber: de que ele foi o
chefe do mensalão; de que ele articulava a arrecadação de dinheiro sujo dentro
do Palácio do Planalto; e de que o esquema criminoso ora julgado e condenado
pelo Supremo movimentou uma dinheirama muito maior do que se sabia até agora.
Mas não. Sobre isso, Lula mantém silêncio
constrangido. Mais uma vez, como de hábito, em lugar de rebater fatos, ataca
quem lhe pede explicações, como fizeram os partidos de oposição na última
terça-feira, por meio de notaà imprensa. Ao invés de desmentir, se é
possível desmentir, as acusações publicadas pela revista, ele parte para o
ataque contra os que lhe reivindicam algo simples: prestar esclarecimentos
sobre fatos que teriam ocorrido, com sua suposta participação, quando o petista
era o presidente da República Federativa do Brasil.
Não há golpismo na atitude do PSDB, do
Democratas e do PPS. Pelo contrário, há cautela e respeito pelas instituições
democráticas. Tanto que os três partidos só cogitam pedir investigações ao
Ministério Público sobre as denúncias publicadas por Veja quando concluído o julgamento no STF, o que só ocorrerá quando
também as eleições municipais já terão transcorrido.
Mas o PT vê nas atitudes oposicionistas
fantasmas de um passado que nem de longe estão presentes agora. É o desespero.
Bastou a oposição colocar o dedo na ferida para os petistas destrambelharem de
vez, numa escalada que teve início a partir da análise do presidente Fernando
Henrique Cardoso sobre a "herança pesada" legada por Lula a Dilma, em
artigo veiculado no último dia 2.
Daí em diante, o que se viu foi a marcha da
insensatez do PT e do governo em ação. Já tivemos, por um lado, a presidente da
República divulgando nota oficial para rebater o artigo do
líder tucano, ocupando rede nacional de rádio e televisão para atacar a oposição, usando cerimônia oficial para os mesmos fins e trocando ministro para tentar interferir na
campanha eleitoral à prefeitura paulistana.
De outro, a Executiva petista aloprou de vez
com uma nota em que conclama seus seguidores a travaruma "batalha do tamanho do
Brasil" para "desfazer mentiras", enquanto alguns de seus
dirigentes passaram a criticar o STF e a ver no julgamento do mensalão um
"golpe" contra o PT, um "risco para a democracia" e uma "grande falácia".
Neste ínterim, Lula, mesmo depois das graves
revelações da Veja, não se dirigiu
diretamente à opinião pública nenhuma vez, para, simplesmente, elucidar os
fatos. Mas não se furtou a excursionar pelo Brasil subindo em palanques de
candidatos petistas para desferir críticas irascíveis a concorrentes, como
ocorreu com Arthur Virgílio em Manaus na quarta-feira e com ACM Neto em
Salvador na semana passada. Ou seja, sobra-lhe disposição para atacar, mas
nenhuma para esclarecer.
É lamentável que o partido que governa o país
há dez anos não tenha aprendido até hoje a conviver com quem não lhe diz
"sim, senhor". Não tenha desenvolvido, neste longo período, o apreço
e o carinho que a democracia merece. Não tenha reservado às instituições o
respeito que qualquer partícipe de uma república lhe deve devotar. É lastimável
que o PT trate tão mal a liberdade, os direitos e os valores que o povo
brasileiro tanto preza.
Fonte: Instituto Teotônio Vilela
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