Vê-se sob a sombra da
condenação dos réus do mensalão, uma onda de argumentos retrógrados, raivosos,
conservadores e revisionistas que algumas pessoas têm veiculado nas redes
sociais e na imprensa tentando vincular os crimes hoje julgados com a
existência dentre os condenados de alguns que tem em seu passado o envolvimento
direto com a luta revolucionária e armada contra a ditadura militar, tentando
fazer crer que uma coisa tem a ver necessariamente com a outra. Não têm.
Primeiro porque, dos vinte e tantos condenados, consta que apenas dois tem
alguma história nessa seara da luta armada: Genoíno e Zé Dirceu. Os demais
condenados filiados ou dirigentes do PT, Delúbio, Pizzolato, Cunha, dentre
outros, tem origem, formação e práticas políticas mais atuais, notadamente, e
com enorme peso, nas deformadas estruturas sindicais brasileiras e na
burocracia partidária. De comum à época dos fatos do mensalão é que estavam no
poder e com a chave de alguns cofres, no mínimo conforme já comprovado e
julgado, com a do cofre da verba de publicidade do Banco do Brasil alocada no
fundo VisaNet e da Câmara dos Deputados.
Os demais condenados, vinculados ao PP, PMDB, PTB, PR - no núcleo político e os
banqueiros, corretores, executivos e publicitários nos outros núcleos da
quadrilha, salvo raríssimas exceções, tem turvas e pouco expressivas histórias
pessoais fazendo parte dos pragmáticos, ousados e politicamente amorfos
"empresários capitalistas", "profissionais apartidários" ou
"políticos profissionais", resistentes e persistentes carrapichos do
poder - de quem nele estiver - e incansáveis sanguessugas do Estado.
Ora, o mensalão só fez juntar a fome com a vontade de comer e deu no que deu.
Não há nada mais nesse processo que a clara demonstração da falta de limites
para o que se pode fazer com poder e dinheiro para manter e ampliar o dinheiro
e o poder, ou vice-versa. Uns gostando mais do dinheiro, outros gostando mais
do poder.
Por outro lado, há que se ressaltar que essa lenga-lenga entoada pelo PT,
destacadamente por Zé Dirceu, Genoíno, Falcão e Lula, de que tudo não passa de
complô das elites conservadoras, de uma campanha orquestrada da mídia contra o
PT e de politização do Supremo Tribunal Federal, pode até convencer alguns mais
desavisados, que possuem um infantil esquerdismo, para quem a questão
democrática é secundária na luta política e para que se atinja os supostos fins
de dar sustentação a um suposto "governo dos pobres", quaisquer meios
seriam válidos.
De comum na construção desta argumentação ideológica auto-intitulada como de
esquerda, de hoje, resta a justificativa, de ontem, de que para derrotar a
ditadura militar e/ou fazer a revolução valeria qualquer meio, inclusive a luta
armada, divergindo de outros pensamentos e práticas da época que afirmavam que
o caminho seria a resistência e a luta institucional e de massas. Nas duas
situações, de ontem e de hoje, o que se sacrifica é a democracia como valor
básico e universal.
No presente caso do mensalão, alguns chegam a alegar que o que foi feito -
roubar dinheiro público e utilizá-lo para corromper parlamentares e partidos -
seria uma mera circunstância, chegando outros ao extremo de comparar isso a um
ato de heroísmo pessoal, tudo para manter "o povo" no poder. Chegaram
até a produzir um slogan absurdo: Zé Dirceu, herói do povo brasileiro. Puro
escárnio e a mais deslavada mistificação.
Ocorre que nem o argumento de que se trata de uma luta de resistência ou
libertação se sustenta nos dias de hoje, a não ser que fosse a de resistir ou
libertar-se de si próprios, já que estão no poder. Pura esquizofrenia.
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Urbano Patto é Arquiteto-Urbanista, Mestre em Gestão e Desenvolvimento
Regional, Secretário do Partido Popular Socialista - PPS - de Taubaté e membro
Conselho Fiscal do PPS do Estado de São Paulo. Comentários,
sugestões e críticas para urbanopatto@hotmail.com
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