• Condutor da Lava-Jato, o juiz Sergio Moro, mesmo pressionado por todos os lados, não teve praticamente nenhuma decisão derrubada nos tribunais superiores
Alexandre Hisayasu e Pieter Zalis – Veja
Se a roda da justiça vem girando sem engasgos desde o início da Operação Lava-Jato, há quase um ano, isso se deve em grande parte aos movimentos cuidadosos do juiz federal Sergio Moro, o responsável pela condução da manivela no processo que investiga o mega esquema de corrupção na Petrobras. Desde março do ano passado, ele autorizou 161 mandados de busca e apreensão, decretou a prisão de sessenta pessoas e determinou o bloqueio de 200 milhões de reais em contas bancárias de suspeitos — incluindo altos funcionários da estatal e empresários poderosos. Defendidos pelos maiores advogados criminalistas do país, os acusados reagiram de imediato. Só de pedidos de habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, foram pelo menos 37 — apenas um vingou até agora: o que permitiu a libertação do ex-diretor da Petrobras Renato Duque e que foi concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki.
As tentativas de tirar o processo das mãos de Moro resultaram em igual fracasso. Os interessados em afastá-lo do caso percorreram todas as instâncias do Judiciário alegando que ele não tinha competência legal para conduzir o processo, dado o envolvimento de políticos no escândalo, que as prisões dos suspeitos eram abusivas, que o caso deveria ser transferido de Curitiba para o Rio de Janeiro, onde fica a sede da Petrobras. Nenhum desembargador do Tribunal Regional Federal ou ministro do STJ ou do STF acatou as contestações.
No braço de ferro com os acusados, Moro não apenas continua invicto. Com passos estudados, vem ganhando terreno e vencendo obstáculos que antes pareciam irremovíveis, como a lentidão da máquina da Justiça. A decisão de "fatiar" a Operação Lava-Jato, por exemplo, é considerada crucial para o sucesso dos trabalhos até agora. Quando percebeu a dimensão do escândalo de que tratava, Moro resolveu dividir o caso em diversas ações penais (são dezoito, até o momento), que passaram a ser conduzidas de forma independente umas das outras. O resultado foi o ganho de celeridade. Se tivesse optado por tratar do caso em um único processo, ele precisaria, por exemplo, ouvir o depoimento de todas as testemunhas de todos os réus para só então dar o próximo passo — que poderia ser a requisição de novas testemunhas. Isso levaria anos. O formato escolhido permitiu ao juiz proferir as primeiras sentenças depois de exíguos sete meses do início da operação. Em outubro, três doleiros foram condenados a penas de quatro a catorze anos de prisão. Desconhecidos, eles pertenciam ao grupo de investigados que deu origem à operação — e também ao seu nome: antes de virar a avalanche que promete engolfar alguns dos nomes mais poderosos da República, a Lava-Jato era uma ação paroquial contra doleiros que costumavam fechar negócios em um posto de gasolina localizado no centro de Curitiba.
Moro é considerado por seus pares um dos maiores especialistas do país em lavagem de dinheiro, um tipo de crime em que a regra costuma ser a punição dos operadores e a impunidade dos poderosos que se beneficiam da engrenagem. Foi a ruptura desse modelo que, há mais de uma década, chamou a atenção do juiz para a Operação Mãos Limpas, que desbaratou um esquema de corrupção montado por décadas na Itália e alterou o cenário do poder no país. Em artigo publicado em 2004, Moro usou a operação para defender o uso de duas ferramentas que têm se mostrado decisivas para o sucesso da Lava-Jato: a prisão preventiva dos acusados e os acordos de delação premiada. Ele costuma refutar os que comparam as duas operações, dada a magnitude da primeira, que investigou 6059 pessoas, incluindo 872 empresários e 438 parlamentares, quatro dos quais eram ex-primeiros-ministros. A Mãos Limpas pode ser inimitável na sua dimensão, mas não é nos seus objetivos. E são eles que Moro persegue, com toda a cautela.
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