• Dilma entrega articulação a Temer, após recusa de Eliseu Padilha e demissão de Pepe Vargas
Simone Iglesias e Luiza Damé – O Globo
BRASÍLIA - Após uma sucessão de desencontros políticos, iniciada na manhã de segunda-feira e que se estendeu até o fim da tarde de ontem, a presidente Dilma Rousseff demitiu Pepe Vargas da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), extinguiu a pasta e entregou as atribuições da articulação política do governo ao vice-presidente Michel Temer, que é presidente nacional do PMDB. Ele será responsável por tentar pôr fim à crise política que se instalou na relação do Palácio do Planalto com o Congresso desde o primeiro mês do novo mandato.
Os desacertos começaram na manhã de segunda-feira, quando Dilma convidou o ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil) para assumir a secretaria. A conversa vazou, e Pepe acabou sabendo dos planos da presidente pelo noticiário. Ainda na segunda-feira, tentou falar com Dilma, mas não teve resposta. Procurou ainda o ministro Edinho Silva (Secretaria de Comunicação Social), também sem sucesso. Pepe ficou sem saber qual a sua situação no governo até o início da tarde de ontem, quando a presidente, enfim, o recebeu e disse que teria que dar o seu cargo ao PMDB.
Enquanto isso, ainda na noite de segunda-feira, Padilha se reuniu com a cúpula do PMDB no Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer, e disse que não teria condições de aceitar a transferência por questões familiares - ele é pai de um bebê de quatro meses. Mas Padilha confidenciou a interlocutores que se preocupava com a provável falta de autonomia na pasta. Ao contrário do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma gosta de participar diretamente da definição de nomeações de segundo escalão e de negociações sobre qualquer tema com o Congresso.
Convicção desfeita
A negativa veio a público, no entanto, quando o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), deu entrevista no início da manhã de ontem anunciando que Padilha já tinha avisado ao partido que não aceitaria, alimentando a crise que se estendeu até a noite de ontem.
- Ele nos comunicou que não vai aceitar a indicação por uma questão pessoal. Isso será comunicado à presidente. Existe uma resistência da esposa dele, que está com um filho recém-nascido. Por isso, ele não poderia aceitar a vaga - disse Picciani.
Horas depois, já no fim da manhã, Padilha se encontrou com a presidente e confirmou que não aceitaria o cargo. Dilma, no entanto, manteve-se convicta de que conseguiria demovê-lo. Às 14h, quando recebeu Pepe Vargas, informou ao petista que iria anunciar a indicação de Padilha como novo ministro de Relações Institucionais na reunião de líderes da base aliada na Câmara e no Senado, às 16h. A presidente se desculpou com Pepe pelo vazamento e por não tê-lo comunicado previamente.
A indicação do petista para as Relações Institucionais foi uma aposta pessoal de Dilma, contrariando a opinião da maioria dos aliados e do ex-presidente Lula. Desde a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) a presidente da Câmara, quando as relações do Planalto com o Congresso pioraram sensivelmente, Lula voltou à carga pedindo que Dilma colocasse na pasta de Pepe um peemedebista.
Após conversar com Pepe, Dilma recebeu novamente Padilha, que estava acompanhado do vice-presidente Michel Temer. O ministro, então, refirmou que recusaria o convite. Depois de insistir com Padilha, sem sucesso, Dilma disse que a única solução "para o tamanho do problema" que se instalara, seria anunciar o vice-presidente para o cargo. Temer aceitou com a condição de não se tornar ministro e de incorporar à Vice-Presidência a estrutura da pasta. Pediu também a extinção formal da SRI.
Durante a conversa de ontem à tarde, Temer cobrou mais uma vez de Dilma a nomeação do ex-presidente da Câmara Henrique Alves para o Ministério do Turismo. Não havia clima, no entanto, para avançar no assunto. Alves também foi um nome sugerido pelo PMDB para a SRI, não aceito pela presidente. Antes de procurar Padilha, Dilma havia cogitado, na semana passada, indicar para a secretaria o ministro Eduardo Braga (Minas e Energia), mas ele deixou claro a emissários do Planalto que não aceitaria a mudança.
Ideli tem destino incerto
Resolvido o impasse com o PMDB, a presidente precisou solucionar o problema criado com Pepe - de quem Dilma é amigo. Como forma de compensá-lo pela exposição, ela o chamou para nova conversa na qual ofereceu o comando da Secretaria dos Direitos Humanos, cargo ocupado no momento por Ideli Salvatti (PT). Pepe aceitou prontamente. O futuro de Ideli está indefinido.
Após a confusão, Dilma comunicou aos deputados, senadores e presidentes dos partidos da base, com os quais se reuniu no fim da tarde, que Temer passaria a fazer a articulação política com o Congresso e com as siglas aliadas. Na saída desse encontro, o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) defendeu a escolhe de Temer, a quem considera a pessoa mais indicada para tentar reagregar a base aliada:
- Essa solução política ajuda a harmonizar as relações com o Congresso, com os poderes e a base aliada. O que estamos discutindo é a melhor solução para que o governo aprimore a relação com outros poderes, principalmente com o Legislativo, e que consiga agregar, fortalecer a base aliada.
Mercadante negou que tenha havido constrangimento na conversa entre a presidente Dilma e Pepe Vargas, que tomou conhecimento de sua demissão pela imprensa.
- A conversa foi bastante tranquila - afirmou o ministro.
Líder do PT na Câmara comemora
Apesar do caos instalado no Planalto durante o dia de ontem, o resultado acabou sendo melhor do que o esperado, na avaliação do PMDB e do PT. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que a escolha de Temer para a articulação política do governo é um motivo de "comemoração" que deve ajudar na reconstrução da relação do Executivo com a base no Congresso.
- É uma medida fundamental, uma sinalização política da maior relevância na relação com o Congresso, que vai para além do PMDB, porque todos sabemos o papel e a respeitabilidade que Temer tem. Entendo como uma grande medida que trará com certeza grandes frutos para a consolidação da base do governo. Tem que comemorar muito - disse.
A missão mais imediata de Temer, segundo Guimarães, será organizar a base para que sejam aprovados os projetos do pacote de ajuste fiscal enviados pelo governo. A primeira reunião como articulador político será comandada por Temer hoje, às 16h, na vice-presidência. A tarefa encomendada por Dilma é que o vice convença a base a "dar uma pausa" para que o Congresso não vote projetos que signifiquem aumento de despesa e diminuição de receita. ( Colaboraram Isabel Braga, Fernanda Krakovics e Júnia Gama) .
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